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Chegámos a um episódio sem precedentes na democracia portuguesa

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José Sena Goulão / LUSA

Frederico Pinheiro a entrar para a comissão de inquérito à TAP

Com murros ou sem murros, o que ficou esmurrado foi a confiança na política. E, mais importante do que a novela, há alegados crimes graves mesmo dentro do âmbito político.

Se, um dia, alguém quiser ver uma série ou um filme longo e real sobre casos políticos dentro de um país, pode espreitar Portugal na época política 2022/23.

Se, um dia, alguém quiser escrever uma novela mexicana baseada na política, pode espreitar Portugal na época 2022/23.

Se, um dia, alguém perguntar “o que raio se passou em Portugal naquela época?”, provavelmente não haverá uma resposta racional, lógica.

Tem-se assistido a uma novela mexicana. “Das más”, como se ouviu ontem na rádio Observador.

Os casos já se começaram a acumular no final de 2022. A certa altura, já se perguntava “qual é o ministro ou secretário de Estado que vai cair nesta semana?”.

Há um ministério que se tem destacado, por motivos menos positivos: o ministério das Infraestruturas. Primeiro, Pedro Nuno Santos, agora João Galamba.

Quase tudo relacionado com a TAP. Uma empresa que, a julgar pelo que tem sido dito noutras audições, sempre teve dirigentes “excepcionais” que originaram resultados financeiros também excepcionais.

Ontem, quarta-feira, passou na televisão provavelmente o episódio mais marcante desta novela mexicana, com a presença de Frederico Pinheiro na comissão parlamentar de inquérito.

Ameaças de ministro, confusão, relatos de violência física, roubo ou não roubo, perseguição familiar, murros.

Tudo desmentido pouco depois por Eugénia Correia. E entretanto outras cinco funcionárias do gabinete de Galamba acusaram Frederico de mentir no Parlamento.

Com ou sem murros presenciais, com ou sem dois socos ao telefone, o que ficou esmurrada foi a confiança na política portuguesa. Está “apodrecida”, como avisa Fernando Alves na rádio TSF.

Galamba pode nunca ter dado dois socos em Frederico – ameaçou ao telefone, aparentemente – mas esmurrou o primeiro-ministro António Costa, avisa Ana Sá Lopes no jornal Público. “Não há precedentes de um episódio destes nos anais da política nacional em democracia“, escreveu a comentadora, que inspirou o título deste artigo.

Revela a má gestão de um Governo num ministério que “nem tem milhares de pessoas, só é uma dúzia de funcionários”, destacava Ricardo Costa na SIC Notícias, no intervalo entre as duas audições parlamentares do dia.

É que, mais do que a novela, há detalhes políticos relevantes – que nem são propriamente só detalhes.

“Aqui tivemos contradições, depois omissões, mentiras e crimes – alguns deles graves. O Estado de Direito ficou ferido. Isto é demasiado grave para se ficar por aqui”. Palavras de Paulo Rios de Oliveira, deputado do PSD, durante a conversa com Frederico Pinheiro.

Porque, caso se confirme o que o ex-adjunto contou aos deputados, estamos perante uma propositada ocultação de informações por parte de um ministro, num assunto sensível e importante para a economia de um país.

Já sem falar em ameaças físicas e um aparente sequestro – que já nos tempos de outro Pinheiro, o Pinheiro Azevedo, era uma “chatice”.

E já sem falar no que Eugénia Correia contou: documentos importantes sobre a TAP estavam só no computador que Frederico Pinheiro utilizava. O arquivo do ministério das Infraestruturas nada tem. Até o autor deste artigo guarda documentos (muito menos) importantes em diversos sítios.

É uma “pidesca história de horror para o regime“, escreve Alexandre Homem Cristo no Observador. No mesmo portal Sara Antunes de Oliveira recorda Marcelo Rebelo de Sousa: “foi pena” António Costa não ter aceitado a demissão de João Galamba.

“Fica-se com uma ideia de que podemos, de facto, estar entregues a um grupo de pessoas que tomou o poder e usa-o sem freio“. Ana Sá Lopes, de novo.

Agora mudemos de canal para a ARTV; mais logo começa novo episódio, com um actor principal chamado João Galamba.

Nuno Teixeira da Silva, ZAP //

2 Comments

  1. É engraçado ver o que diz este puhítico Galamba, mas os deputados não o souberam encostar às cordas.
    Primeira questão : a agressão do ex-adjunto. Se as ladys se esconderam com medo na casa de banho, quem é que correu para o segurança para fechar as portas e sequestrar ? É tão fácil de desmontar a versão do Tolamba.
    Depois: naquela casa, o segurança deve andar a mil pois pelos vistos qualquer um pode mandar fechar as portas. É assim que funciona ?
    No que concerne aos documentos classificados e ao respectivo tratamento é tão grande a ignorância demonstrada que qualquer comentário é desnecessário. Então o computador portátil com matéria sensível pode ser levado para casa e não tem nenhum perigo ou risco de ser roubado ou de ser acedido ? É assim que ester artolas entendem a segurança ?
    Depois o SIS : então qualquer chefe de gabinete pode ligar para o SIS para mandar fazer o que for necessário ? É assim que funciona ?
    Relativamente à reunião preparatória: uma reunião preparatória é pra trocar impressões e preparar uma reunião ou exposição; quando alguém numa reunião preparatória diz as perguntas que vai fazer e depois são alinhadas as respostas que deverão ser dadas, isso não é uma reunião preparatória, é uma simulação, uma mistificação

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