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Presidenciais. Grandes vencedores e (poucos) derrotados

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v.a. / Lusa

Num ato eleitoral marcado pela pandemia de covid-19, que chegou a trazer incerteza aos prognósticos precoces que há meses se alinhavavam, Marcelo Rebelo de Sousa, reeleito à primeira volta, é o grande vencedor da noite. Mas há, inesperadamente, muito mais vencedores do que derrotados.

Se há atos eleitorais em que todos reclamam vitória sem que alguns a ela pareçam ter direito, não foi este o caso das Eleições Presidenciais 2021. E, entre vencedores e derrotados, há ainda quem esteja nos dois campos.

VENCEDORES

Democracia

Esta é, em primeiro lugar, uma vitória da Democracia — uma vitória sobre a pandemia, sobre o medo de sair para ir às urnas, uma vitória sobre uma abstenção que, apesar de enorme, o foi muito menos do que se chegou a temer, e cuja percentagem perde fulgor quando cruzada com o aumento do número de eleitores inscritos.

É uma vitória dos 4.233.874 eleitores, 39,49% dos inscritos, que não quiseram prescindir do seu direito nem fugir ao seu dever de escolher o próximo Presidente da República.

Marcelo Rebelo de Sousa

É o grande vencedor das Presidenciais 2021 — algo que parecia certo há alguns meses, mas que a pandemia viria a tornar incerto. Depois de se ter chegado a pôr a hipótese de a abstenção colocar até em causa uma vitória à primeira volta, Marcelo vence com 60% dos votos — na realidade, com mais votos do que os conquistados em 2016.

Marcelo Rebelo de Sousa é ainda o primeiro candidato presidencial a ganhar em todos os concelhos. De acordo com os dados oficiais do portal EyeData, apurados os votos em todo o país, Marcelo ganhou a votação em todos os concelhos, sendo esta a primeira vez em que um candidato presidencial consegue este resultado.

Não foi a percentagem histórica com que o presidente chegou a sonhar, mas é ainda assim a vitória da noite – uma vitória de quem tinha o apoio de três partidos, mas que conquistou sozinho.

António Costa, PS

O primeiro-ministro, António Costa, é inegavelmente um dos grandes vencedores das presidenciais — sem surpresa, um vencedor antecipado desde que convenceu meio PS a apoiar o inevitável vencedor e outro meio a não apoiar Ana Gomes. Louros que o presidente do PS, Carlos César, se apressou a reclamar no discurso oficial do partido, “ao qual Marcelo deve a vitória”.

Ana Gomes

É uma das vencedoras da noite, com 13% dos votos. Apesar de ter tido pouco mais de metade da votação de Sampaio da Nóvoa, que ficou em segundo lugar nas presidenciais de 2016, a candidata do PS (que não era candidata do PS) assegurou o seu primeiro objetivo, nunca assumido mas indisfarçável: ficar à frente de André Ventura.

O resultado foi arrancado a ferros, sem o apoio do seu partido, partilhando votos com Marisa Matias, candidata que trilha terrenos comuns com a ex-eurodeputada socialista —  resultado esse com o qual não consegue descolar do candidato do Chega, mas que é ainda assim uma vitória.

Rui Rio, PSD

É, por inerência, um dos vencedores da noite. Apostou desde cedo, sem dúvidas nem hesitações, no presidente em funções, ex-presidente do seu partido, e ganhou. É a primeira vitória de Rui Rio em eleições nacionais desde que é líder do PSD. E “se há alguém derrotado é o PS”, por “falta de comparência”.

A vitória é de Rio, é do PSD, é dos “outros 75% que são não de esquerda” — algo que não parecia claro no tom crispado do seu discurso de noite eleitoral, no qual falou mais vezes do resultado de André Ventura do que da (sua) vitória de Marcelo. Talvez porque esta é uma vitória com uma pedra no sapato.

André Ventura

Meia vitória, mas ainda assim André Ventura é um dos vencedores da noite. Apesar do terceiro lugar, o candidato do Chega recolhe 12% dos votos — “aquém dos 15% que deveriam ter” — mas é uma votação expressiva, que extravasa largamente os 1,29%  que teve nas legislativas de 2019. E ganha inesperadamente todo o Alentejo ao PCP.

Como salientou Paulo Portas na noite eleitoral, em comentário na TVI24, “pela primeira vez em 40 anos há um populista com dois dígitos”, um resultado que lhe permite marcar terreno e legitimar-se como figura incontornável da política nacional.

Tiago Mayan Gonçalves

Com 3.22% dos votos, o resultado de Tiago Mayan Gonçalves é quase o triplo da votação global do seu partido nas últimas legislativas, nas quais a Iniciativa Liberal obteve 1,3% dos votos. Um resultado interessante que mantém os liberais na agenda política.

 

DERROTADOS

André Ventura

O candidato apoiado pelo Chega é, ao mesmo tempo, um dos vencedores e um dos derrotados destas Presidenciais 2021. Falhou o primeiro objetivo anunciado, perdendo o segundo lugar para Ana Gomes. E falhou o segundo objetivo que chegou a assumir: ter mais votos do que toda a esquerda junta. Ter apenas “mais votos do que Marisa Matias, João Ferreira e Tiago Mayan, todos juntos”, parece poucochinho.

Tal como se esperava, André Ventura cumpriu a promessa de se demitir da liderança do Chega se por acaso Ana Gomes ficasse à sua frente. Acabou de acontecer.

João Ferreira, PCP

Com 4% dos votos, João Ferreira fica no quarto lugar, pouco à frente de Marisa Matias. Mantém o lugar obtido por Edgar Silva em 2016, e uma percentagem de votação semelhante, mas vê André Ventura arrebatar o segundo lugar em todo o Alentejo — em quatro distritos em que Marcelo Rebelo de Sousa vence com votações expressivas, todas acima dos 52%.

Para João Ferreira, apenas uma pequena vitória: no campeonato das esquerdas, o candidato oficial do PCP ficou à frente da candidata oficial do Bloco de Esquerda.

Marisa Matias, Bloco

A eurodeputada do Bloco de Esquerda é uma das derrotadas da noite. Marisa Matias perde o terceiro lugar que tinha obtido nas presidenciais de 2016, nas quais recolheu 10,12% dos votos, à frente de Maria de Belém Roseira, apenas atrás de Marcelo e do candidato então apoiado pelo PS, Sampaio da Nóvoa.

É também uma derrota do Bloco de Esquerda e de Catarina Martins, cuja aposta numa estratégia de “dividir para multiplicar” não teve resultado prático — e com a qual poderá ter tirado a Ana Gomes uma vantagem mais confortável sobre André Ventura.

Tino de Rans

A mera participação no ato eleitoral é, em si, uma vitória a celebrar, mas Vitorino Silva é um dos derrotados da noite. Não tanto pela percentagem de votos arrecadados, 2,94%, que ficaram um pouco abaixo dos 3,28% obtidos em 2016, mas porque desta feita o popular Tino de Rans não conseguiu ganhar em Rans — onde teve “muita honra em ficar em segundo lugar, atrás do atual presidente da República”.

“Esta é a vitória da liberdade, é a vitória da tolerância, é a vitória da democracia”. A frase é de Mário Soares, no discurso com que celebrou a difícil vitória nas Eleições Presidenciais de 1986 frente a Freitas do Amaral, no que terá sido o mais polarizado ato eleitoral de sempre em Portugal. É possivelmente uma frase que se aplica, 24 anos mais tarde, às Eleições Presidenciais de 2021. O futuro o dirá.

Armando Batista, ZAP //

27 Comments

    • Estão a valer o que merecem, são os protetores dos incumpridores e dos excêntricos, portanto o povo sente na pele a exclusão a que está dotado a favor de minorias indisciplinadas, portanto uma pedrada no charco fará talvez bem para que alguns entendam que não é de racismo que se trata, mas tão-somente de uma questão de comportamento e de privilégio.

  1. Ui, ui, agora que vai ser um trinta e um!
    Com meio milhão de racistas e xenófobos não vai haver lugar nas cadeias para tanta gente! O presidente do PS, Carlos César, já disse que vai fazer dos Açores um novo Tarrafal!!

    • Quem são esses “racistas e xenófobos”? Espero que não esteja a fazer referência aos apoiantes do partidário André Ventura.

      • Claro que estou a referir-me aos que votaram no Chega!! Então a esquerdalha, não anda sempre a dizer que este é um país cheio de racistas e xenófobos?? Então eles aí estão. Tomai lá com meio milhão, mais outros tantos que não foram votar, e outros tantos que tiveram medo que os membros das mesas de votos lhes fossem ver boletim de voto, e outros tantos que acreditam que os Açores vai ser um novo Tarrafal!!

  2. Equilíbrio maior de forças, é a leitura a fazer na minha modesta opinião, o importante são os interesses do povo e o progresso do país, esquerda ou direita ou centro, é pouco relevante , os portugueses são e devem ser a preocupação da ação política.

    • Quase 500.000 portugueses manifestaram a sua oposição a este governo, à frouxa oposição e à franja esquerdoide que têm condicionado o nosso destino coletivo e estão a levar o país para um algures preocupante. Através do Chega, o povo teve voz. Essa foi uma das grandes vitórias deste ato eleitoral.

  3. Estes nossos politicos são fenomenais…
    só um ganhou as eleições mas resalva-se que 60% dos eleitores nem sequer votaram.
    Depois quando se houve ou vê as noticias todos ganharam…
    quantos presidentes vamos ter?
    enfim…

    • Tendo em conta os vários factores, 4,2 milhões terem ido votar não me parece muito mau… mau é haver 10,8 milhões de eleitores – mais do que a população de Portugal!!

  4. Pois será que os mortos também estão nas listas? 4,2 milhões de votantes é super bom, e na verdade os Portugueses mostraram que não votaram inconscientemente, só falharam os que votaram no ódio.

  5. Estamos ou não numa democracia? Que raio, o homem não pode dizer o que quer sem ofender… Eu não concordo com a forma de fazer politica do Ventura, no entanto tem o direito de dizer algumas verdades e abanar estes políticos amorfos que desde do 25 de Abril, tem desgovernado este país.

  6. Nunca em Portugal um partido teve tamanho crescimento entre duas eleições sucessivas. O partido Chega teve o crescimento de 822%. Como disse a socialista Ana Catarina Mendes: “O resultado de André Ventura é assustador e merece uma reflexão profunda”.

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