Em plena pandemia de Covid-19, EUA e China insistem numa guerra de palavras, com troca de farpas, numa altura em que os dois países são alvos de críticas pela gestão do surto, os primeiros pela forma atabalhoada como lidaram com ele e os segundos pelas culpas e omissões no processo.
Na última das suas acusações à China, Donald Trump diz que Pequim enganou deliberadamente os EUA sobre a pandemia, para fazer com que ele perca as eleições presidenciais de Novembro deste ano.
“A China vai fazer tudo o que puder para fazer com que eu perca esta corrida”, destaca o presidente norte-americano em entrevista à agência Reuters.
Trump frisa que a China quer que Joe Biden vença porque não tomará medidas tão duras como ele relativamente ao acordo comercial. Para reforçar a sua posição, Trump deixa a ameaça à China de que pode enfrentar “muitas” consequências dos EUA devido ao coronavírus.
“Há muitas coisas que posso fazer. Estamos a olhar para o que aconteceu”, salienta.
A narrativa de Trump é vista por alguns especialistas como uma manobra de propaganda, com o intuito de desviar atenções da sua má gestão da pandemia. As suas palavras deixam antever que se poderá juntar à Austrália na intenção de promover uma investigação internacional à China, para tentar perceber as origens da pandemia.
A China já reagiu com a ameaça de um boicote a produtos australianos. E agora a agência de notícias oficial chinesa Xinhua disseminou um filme de animação intitulado “Once Upon a Virus” (Era uma vez um vírus) que faz troça da resposta dos EUA à crise de Covid-19.
Com recurso a figuras de Lego, a China faz a comparação entre a forma como os dois países fizeram a gestão da pandemia, elevando a guerra de palavras entre as diplomacias a um outro nível.
Do lado dos EUA, insiste-se na ideia de que o coronavírus teve origem num laboratório de Wuhan. O chefe da diplomacia norte-americana, Mike Pompeo, afirmou mesmo que “existem imensas provas” disso, sublinhando que “a China é conhecida pela sua propensão para infectar o mundo e por utilizar laboratórios que não respeitam as normas“.
Estas palavras surgiram numa altura em que foram divulgadas sondagens que mostram Biden muito perto de Trump. E o antigo vice-presidente dos EUA, o candidato democrata às presidenciais, também se juntou à “guerra”, divulgando, nesta semana, um vídeo onde retrata Trump como sendo fraco relativamente à China.
Tanto Trump como Biden navegam, desta forma, a onda da pandemia, procurando tirar frutos da imagem negativa da China nesta altura.
Reeleição pode estar na economia
Numa altura em que o número de mortes por Covid-19 nos EUA, já ultrapassa as 69 mil, a equipa de Trump procura “uma estratégia de saída” para a pandemia, com vista à reeleição, como aponta o site especializado Politico.
Mas será difícil enformar uma “vitória” no meio desta crise, até depois de uma estratégia muito errática da administração Trump que tem recebido duras críticas.
Trump começou por comparar o coronavírus à gripe sazonal e sublinhou que “talvez não se deva fazer nada” e simplesmente “montar [o vírus] como um cowboy”. Também já falou da cloroquina como uma “cura milagrosa” e avançou a sua perspectiva de uma recuperação económica rápida.
Aliás, Trump parece apostar tudo na economia para tentar que o povo esqueça a fraca resposta do sistema de saúde à pandemia. “Se houver uma sensação de que recuperamos disto e de que a economia está a melhorar, ele ficará ok”, analisa um conselheiro da campanha de Trump citado pelo Politico.
“Penso que vamos ter um terceiro trimestre fenomenal“, já disse Trump. “Estamos prontos para seguir em frente”, reforçou, embora assumindo a “tragédia” que o país está a enfrentar e o elevado número de mortes.
Um optimismo que não encontra eco noutros sectores da sociedade norte-americana, nomeadamente no seio da Saúde.
Há receios de que o coronavírus volte no Outono, a par da gripe sazonal, aumentando ainda mais os problemas da resposta do sistemas de Saúde e as taxas de mortalidade. A economia pode, novamente, vir a ser “encerrada”, o que seria um golpe fatal para a reeleição de Trump.
“A diplomacia do lobo combatente”
Do outro lado da barricada, o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Geng Shuang, já veio negar qualquer intenção de interferir nas eleições norte-americanas, deixando também a farpa de que os EUA deviam manter “o foco em conterem o vírus”.
“Desde há algum tempo, certos políticos norte-americanos, em desconsideração dos factos, tentaram desviar a sua própria responsabilidade pela gestão inadequada da epidemia para outros”, atirou ainda Geng Shuang.
Logo depois de ter anunciado o controle interno da pandemia, a China lançou a sua gigante máquina de propaganda, no sentido de melhorar a imagem do país depois da mossa criada pelo coronavírus. Começou por disponibilizar materiais de protecção, equipamentos e profissionais médicos a países como Itália e França.
“A China utiliza a crise para implantar uma estratégia de comunicação muito agressiva que dá a impressão de uma grande generosidade, mas que serve para preparar o futuro”, analisa no jornal francês Le Monde um diplomata europeu em Pequim.
Entretanto, vários diplomatas chineses em diferentes países foram assumindo o que o Le Monde define como “a diplomacia do lobo combatente”.
Este tipo de “diplomatas ferozes” inspirou-se num sucesso de bilheteira na China – um filme sobre um comando, cheio de músculos e de coragem, que salva o seu povo matando bandidos americanos com as suas próprias mãos.
No ano passado, o presidente chinês Xi Jinping, pediu aos diplomatas chineses maior “espírito de luta”, no sentido de aumentar a influência global da China.
Nesse sentido, vários diplomatas chineses têm estado envolvidos em pequenas polémicas em diferentes países, com fake news à mistura. Em França, responsáveis chineses terão estado envolvidos na divulgação de rumores falsos que teriam a intenção de denegrir a resposta francesa à pandemia.
Num artigo no site da Embaixada da China em França, publicado em Abril passado, intitulado “porque é que o surto de Covid-19 é tão politizado”, critica-se a “resposta europeia ineficiente à crise”. O artigo caracteriza a epidemia como “o inimigo comum de toda a humanidade” e nota que urge “uma resposta eficaz”, de “cooperação” e “coordenação de esforços de luta”, criticando “certos países” que “em vez de pensarem em se protegerem e em fortalecerem a cooperação internacional, preferiram estigmatizar a China e politizar em altas doses uma crise de saúde pública“. Razão pela qual, segundo o artigo, “a epidemia se tornou incontrolável”.
Por outro lado, a China conseguiu “vencer a epidemia em apenas 2 meses, retomando rapidamente o trabalho e uma vida normal”, graças ao “socialismo com características chinesas” que “demonstrou a sua capacidade”, “o poder de todo um povo unido e solidário” e “a forte mobilização, de organização e de execução do Partido Comunista Chinês”, aponta-se ainda no texto.
Além das ameaças de boicote à Austrália e das críticas aos EUA, também responsáveis da Alemanha assumiram que tinham sido pressionados por diplomatas chineses para fazerem declarações públicas favoráveis à forma como Pequim lidou com a crise.
Encurralada por todos os lados e fazendo jus à teoria de que o ataque é a melhor defesa, a China parece decidida a controlar a “narrativa internacional”. Até porque precisa, urgentemente, de mudar uma imagem que ficou muito lesada, não apenas pela pandemia.
Depois de ter enviado equipamentos médicos com defeitos a países como Espanha, nunca tanto se questionaram os padrões de qualidade dos produtos made in China. Já para não falar das questões de Segurança Alimentar muito levantadas pela divulgação de imagens dos mercados de animais vivos que proliferam pela China.
Essa negatividade não ressalta à vista apenas do olhar comum. As próprias instâncias de poder começam a encarar a situação de um ponto de vista mais sério – no seio da própria Comissão Europeia já se estará a avaliar a possibilidade de impedir que investidores chineses controlem sectores essenciais da economia da União Europeia (UE).
O Japão já anunciou um pacote de apoios de mais de 2 mil milhões de dólares para ajudar as empresas do país a mudarem as suas produções da China – um duro golpe para o país, já que o Japão é um dos seus grandes aliados comerciais.
Com Trump a pressionar a China, o país pode vir a enfrentar novos desafios económicos nos próximos tempos – mas também terá as suas cartadas para jogar, nomeadamente até por via do monopólio que detém em termos da indústria farmacêutica.
O The Wire China já chegou a especular sobre a possibilidade de o fornecimento de antibióticos aos EUA ficar em risco no âmbito de uma “guerra comercial preocupante”.
No fim de contas, a pandemia que está a mudar o nosso mundo pode vir a determinar novos equilíbrios de forças na balança do poder económico mundial. Ou não… Falta saber como vai a China sobreviver aos ataques por causa do vírus. E se o próprio Trump sobreviverá à pandemia como um lendário cowboy solitário.
Coronavírus / Covid-19
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O Poder absorve as mentes desta gente que acabam por ser um perigo para toda a humanidade, temos actualmente a prova mais evidente do que nunca do perigo e dos meios que certas potências utilizam para dominar o mundo, é tempo agora dos políticos europeus porem travão a determinados acordos, caso contrário vão alimentando o monstro.