O Governo argumenta que aumentar os salários agravaria e prolongaria a crise de inflação. As metas do défice foram também pouco alteradas desde a proposta original do OE, devido à almofada criada pelo aumento da receita fiscal e pelo aumento abaixo do normal da despesa pública.
Em entrevista ao Público, Fernando Medina respondeu às críticas de que a proposta de Orçamento de Estado do Governo não tem em conta a inflação que tem abalado a Europa e levado à perda do poder de compra dos portugueses.
O Ministro das Finanças também nega as acusações de que o OE é austero devido ao pequeno aumento da despesa. Medina argumenta que o documento foi feito ainda com base em previsões de crescimento económico de 4,9% do PIB e que só seria austero “se estivéssemos num cenário recessivo”.
Medina refere ainda que seria “um erro muito grande” implementar uma política “muito mais expansionista” num “tempo de crescimento” porque “retiraria ao país a margem de manobra que podemos precisar se em 2023 ou 2024 se confirmarem os cenários mais adversos das instituições internacionais”.
O antigo autarca de Lisboa também nega que o fim de algumas medidas especiais criadas durante a pandemia tenha dado uma maior almofada ao Governo e lembra que o contexto mudou desde então devido à crise nos preços dos combustíveis.
“Procuramos mitigar os efeitos com eficácia primeiro junto dos consumidores – veja o impacto que tem a descida do imposto na compensação de mais de 70% do aumento da gasolina e de mais de 50% do aumento do preço no gasóleo, é muitíssimo importante -, como também os aumentos que são dados a níveis de rendimentos e de apoios ao cabaz básico de famílias em situação de maior vulnerabilidade”, argumenta.
O Ministro recorre também o mesmo argumento que António Costa usou na reunião da Comissão Nacional do PS, onde afirmou que não podemos “embarcar na ilusão de que se aumenta o poder de compra e se combate a inflação só por via da subida dos rendimentos” e que isto criaria uma “espiral inflacionista”.
O primeiro-ministro comparou a situação actual com a crise petrolífera nos anos 70 que se arrastou até aos anos 80 e afirmou que os preços estão a subir porque os custos de produção também estão a aumentar, pelo que as subidas salariais só iriam “aumentar mais os custos de produção” e seriam comidas “pela subida da inflação”.
Medina relembra a situação nos anos 80 e acredita que o aumento dos salários iria prolongar a perda do poder de compra e seria “um erro” ao “acrescentar um motor interno de produção de inflação por via de outros elementos”.
Nos últimos anos, o Governo tem feito as actualizações salariais para a administração pública tendo em conta a evolução da inflação do ano anterior. Se este modelo se mantiver, os funcionários públicos devem ter um aumento salarial significativo no próximo ano devido à escalada dos preços que 2022 tem trazido.
O responsável pelas Finanças recusa confirmar se esta regra se vai manter em 2023, considerando que a crise de inflação causou uma “mudança significativa de regime económico no qual vivemos”. “Temos vivido todos num regime de moeda única que foi até agora um regime de taxas de juro baixas e taxa de inflação baixa durante muito tempo. Agora, estamos perante este choque na área da energia”, reforça.
Questionado sobre a falta de medidas no Orçamento que façam frente à subida nas taxas de juro — que estão agora no positivo pela primeira vez desde 2016 e cujo aumento se reflecte nas prestações dos créditos à habitação — Medina recorda que o período de taxas baixas que se viveu nos últimos anos “também não corresponde a um período de absoluta normalidade na política monetária” e diz que o Governo está a acompanhar as decisões do Banco Central Europeu neste sentido.
Medina nega que haja uma quebra do padrão das propostas de OE anteriores que estavam focadas na recuperação de rendimentos. “Há várias medidas nesse sentido, mas sobretudo centradas nos estratos mais desfavorecidos. Claro que houve um período inicial de reversão de medidas da troika que sobressaiu mais, mas não houve nenhum orçamento em que não se deixou de prosseguir esse caminho”, sublinha.
Já sobre se a decisão de não se mexer nos salários se deve à inflação ou à maioria absoluta que deixou o PS livre para não ter de negociar com os parceiros da antiga geringonça, Medina repete que a única razão é a “convicção que não podemos acrescentar um motor inflacionista interno”.
Salário de 1000 euros vale menos 40 euros por mês
Apesar das estimativas de que a inflação chegue aos 4% este ano (o valor previsto em Outubro era apenas 0,9%), o Governo escolheu não aumentar os salários ao mesmo ritmo argumentando precisamente que estes agravariam ainda mais o problema. Desta forma, os portugueses podem antecipar já uma perda de poder de compra em 2022.
Em média, um salário de 1000 euros valerá, na práctica, menos 40 euros por mês em termos nominais. Por cada 100 milhões pagos nos salários dos funcionários públicos, os trabalhadores perderão 3 milhões de euros de poder de compra, nota o JN.
Fernando Medina também prevê uma redução da remuneração real média em 0,8%, de acordo com o relatório do Conselho das Finanças Públicas.
O OE continua ainda a apostar numa política de “contas certas” e o Governo não abdica do objectivo de reduzir o défice, mesmo com o anúncio de um pacote de medidas de resposta à crise — como o corte no Imposto sobre Produtos Petrolíferos, o subsídio para as empresas afectadas pelas subidas no gás ou a redução das tarifas de acesso às redes na electricidade — que custará 1,1 mil milhões de euros.
Para além destas medidas destinadas ao sector energético, o Governo prevê gastar mais 7,6 mil milhões no pacote anti-crise, do qual 30% será destinado às empresas. A transição climática e digital custará mais 1,15 mil milhões de euros, sendo muitos destes fundos oriundos da “bazuca”. A saúde receberá ainda mais 700 milhões e a educação terá um financiamento de 900 milhões de euros.
Mesmo com estes investimentos e com a crise de inflação que se instalou, a meta de corte do défice mudou pouco, passando de um corte de 1,1% para 0,9%. No documento proposto em Novembro, o objectivo era cortar o défice de 4,3% para 3,2% do PIB. Agora, o executivo quer baixar o défice de 2,8% para 1,9%.
Por detrás destas estimativas está em grande parte o aumento que se antecipa nas receitas fiscais — o OE original previa um crescimento de 4,2%, mas o aumento generalizado dos preços também faz com o Governo ganhe mais com impostos como o IVA, pelo que a previsão actual do aumento da receita fiscal é agora de 6,6%.
O aumento da despesa pública (4,1%) também fica abaixo da variação nominal do PIB (7,4%), o que dá uma folga ao Governo para continuar no esforço de corte do défice. A contenção é ainda mais óbvia nas despesas com pessoal, que devem crescer 3,6% este ano, pouco mais do que a previsão inicial de Outubro.
Este agora tem a mania que é perito em finanças… Enfim, viva a maioria!
Quem acredita não ser gado para os ricos comerem, ou está a enganar-se a si próprio, ou é um deles. Dividir para conquistar, é a arma que usam desde sempre.
Olha ele a tentar preparar o povo para a austeridade que aí vem… Prepara-te Medina para muitas greves quando anunciares o próximo orçamento, se é que não é antes.