Hayır Bey e Murad IV foram os primeiros líderes a ter medo do café. Receavam que fosse um estimulante para o debate político, dando lugar a potenciais focos de conspiração. Além disso, esta era vista como uma bebida impura.
O café estimula-nos, liberta-nos, deixa-nos mais “rebeldes”.
Foi precisamente para conter essa rebeldia que, no Império Otomano, durante o reinado do sultão Murad IV (1623-1640) que, em Istambul, capital do império, o consumo de café foi proibido.
O sultão é recordado pelo seu autoritarismo e pelos seus esforços para acabar com o que considerava serem comportamentos imorais e socialmente perturbadores. Entre essas atividades estava beber café.
Como conta a Specialty Kava, a decisão de Murad IV de proibir o café foi influenciada por vários fatores. Desde logo, os cafés de Constantinopla (atual Istambul) tinham-se tornado locais onde as pessoas se reuniam para discutir política e criticar o governo.
O sultão receava que estas reuniões pudessem levar à agitação e à conspiração contra o seu governo.
Em segundo lugar, alguns académicos islâmicos acreditavam que o café, tal como o álcool, tinha efeitos intoxicantes, pelo que devia ser proibido. Além disso, o café era, uma “substância suspeita”, capaz de alterar o estado de espírito.
Murad IV impôs uma proibição rigorosa do café, juntamente com o tabaco e o álcool. Aplicou a proibição com medidas extremas, ordenando inclusivamente a execução de quem fosse apanhado a consumir café.
Como conta a mesma revista, os soldados de Murad IV patrulhavam as ruas de Constantinopla, à procura dos infratores. Apesar das medidas severas, o comércio do café continuou clandestino e as cafetarias funcionavam em segredo.
Após a morte de Murad IV, em 1640, a proibição foi gradualmente levantada e os cafés reapareceram como instituições sociais populares.
O café (turco) é, hoje em dia, um símbolo da Turquia e curiosamente, ao contrário do que foi no passado, uma atividade “obrigatória” para quem visita o país.
Mas… Murad IV não foi o primeiro a ter medo do café.
Segundo a Specialty Kava, a primeira tentativa de proibir o café foi em Meca, em 1511. A cidade era um centro movimentado de comércio e peregrinação religiosa, e o café tinha-se tornado imensamente popular entre os seus habitantes.
No entanto, esta popularidade também atraiu a atenção das autoridades religiosas, que viam os cafés como locais de sedição e de comportamento imoral.
Na altura, o governador de Meca, Hayır Bey, estava particularmente preocupado com os encontros nos cafés. Acreditava que estes encorajavam discussões políticas que poderiam levar à dissidência contra as autoridades no poder. Além disso, já nessa altura se pensava que os efeitos estimulantes do café tornavam as pessoas mais propensas a comportamentos rebeldes.
Hayır Bey reuniu um conselho de juristas islâmicos para examinar a legalidade do café, num decreto que duraria 13 anos. O conselho declarou o café como haram (proibido) e emitiu um édito proibindo o seu consumo. As cafetarias de Meca foram encerradas e os consumidores de café foram perseguidos.
Apesar de pioneiros de que o café era um perigo para a sociedade, Hayır Bey e Murad IV não foram os únicos a querer impor esta teoria.
Por exemplo, no início do século XVII, com a disseminação do produto por toda Europa, a Igreja Católica começou a desconfiar do café. Alguns membros do clero viam-no como uma “bebida muçulmana” e desaprovavam a sua popularidade entre os cristãos.
Havia até teorias de que o café era uma criação do Diabo, com a intenção de afastar as pessoas da verdadeira fé.
No século seguinte, na Suécia, o rei Gustavo III, que governou de 1771 a 1792, estava preocupado com a popularidade do café no seu reino. Acreditava que o consumo de café era prejudicial para a saúde e procurou desencorajar os seus súbditos de o beberem.
Gustavo III subiu os impostos sobre o café, numa tentativa de reduzir o consumo.
Para (tentar) provar o seu ponto de vista, Gustavo III fez uma experiência com dois gémeos que tinham sido condenados à morte. Um dos gémeos tinha de beber café todos os dias; e o outro chá.
A experiência deveria demonstrar os efeitos nefastos do café no organismo humano, mas o gémeo que bebia chá foi o que morreu primeiro.