Ucrânia: novas tropas da linha da frente nem sequer sabem disparar uma arma

Preparam-se para proteger o “coração” da Ucrânia, mas estão tão tão mal treinadas que têm de aprender competências básicas de guerra. Muitos destes soldados já passaram pelo treino básico, mas lá só dispuseram de 20 balas.

As unidades ucranianas na linha da frente enfrentam, além dos russos, um enorme problema de formação, conta um comandante ucraniano ao The Washington Post este domingo, que confessa que as novas tropas são tão mal treinadas que têm de aprender competências básicas de guerra, como, por exemplo, montar espingardas ou mesmo disparar uma arma.

O relato fresco de comandantes e tropas recentemente levados para a vanguarda aponta que estas preocupações têm sido expressadas há meses aos membros superiores da Defesa: além de falta de tropas experientes, faltam também balas e granadas para distribuir pelos novos recrutas nos centros de treino ucranianos, numa altura em que a ofensiva russa escala em Donetsk.

“Estamos a perder muito tempo com o treino básico”, desabafa ao jornal norte-americano um oficial da 93.ª Brigada Mecanizada, uma das protagonistas de alguns dos combates mais intensos desde a invasão russa — entre os quais em Bakhmut, Kharkiv e Avdiivka.

E o problema nem sequer se prende com os novos recrutas. São os que já passaram pelo treino básico, na retaguarda, que apresentam uma evidente falta de treino. Seguirão, à partida, diretamente para as redondezas de Chasiv Yar, em Donetsk, zona de extrema importância na defesa do “coração” da Ucrânia.

“Aprendemos tudo no local”, confessa um soldado ao Post. Outro sublinha, em sua defesa, que foi destacado com um dia de antecedência para a linha da frente.

Fazendo as contas, um instrutor dos novos recrutas de um centro de treino ucraniano diz que cada recruta novo dispõe de apenas 20 tiros antes do fim do treino básico.

“Não há granadas para lançar nos centros de formação e não há balas para lança-granadas no centro de formação”, diz: “não temos um sistema de treinos adequado”.

Desespero obriga a leis polémicas

O Ministério de Defesa da Ucrânia ainda não se pronunciou sobre o relatório, que surge numa altura em que Kiev, atrapalhada pela mais recente ofensiva russa, começa a receber o novo pacote de equipamento militar dos Estados Unidos (EUA), bem como outras boas notícias, como a permissão, por parte da Assembleia Parlamentar da NATO, de atacar alvos na Rússia com armas dos aliados.

Países membros da organização — como foi o caso da França — também já deram a entender que planeiam enviar formadores militares para a Ucrânia com o objetivo de treinar os novos tropas. Notícias que não foram bem recebidas pelo Kremlin.

Desesperada por homens, a Ucrânia tem protagonizado algumas estratégias polémicas de recrutamento militar nos últimos meses.

Uma das mais recentes tem o objetivo de trazer de volta ao país invadido homens residentes no estrangeiro em idade de lutar, através da suspensão de qualquer serviço consular para homens de 18 a 60 anos. No fundo, estes homens deixam de ter apoio nos consulados dos países onde se encontram emigrados.

Em abril, foi aprovada a impopular lei de mobilização, que não prevê um prazo concreto para a desmobilização dos soldados.

A falta de recrutas, armas e munição tem sido uma queixa recorrente do presidente ucraniano Volodymyr Zelenskyy desde o início da guerra, a 24 de fevereiro de 2022.