A Justiça italiana bloqueou esta terça-feira o empréstimo a França de o “Homem de Vitrúvio”, de Leonardo Da Vinci, da Academia de Veneza, que o Louvre esperava incluir na exposição que assinala os 500 anos da morte do génio renascentista.
A obra, um dos mais conhecidos desenhos de Leonardo, estava anunciada para a exposição do museu parisiense, a inaugurar no próximo dia 24, e deveria ser enviada para a capital francesa antes da abertura da exposição, noticiaram esta terça-feira os jornais italianos.
Esta e algumas outras obras de instituições públicas italianas estavam para ser emprestadas a Paris, no âmbito de um acordo entre os dois países, que também previa o empréstimo a Itália de algumas pinturas de Rafael, nos 500 anos da morte do outro mestre da Renascença, a assinalar em 2020.
O Tribunal Administrativo Regional de Veneza aceitou esta terça-feira um recurso urgente apresentado por uma associação italiana sem fins lucrativos, Italia Nostra, dedicada à preservação do património histórico e artístico do país, que argumentou que a obra não podia sair de Itália, devido ao grau de degradação que poderá sofrer.
O tribunal italiano aceitou a argumentação e suspendeu o memorando de entendimento firmado entre França e Itália, pois considerou que “viola o princípio do sistema jurídico pelo qual os gabinetes públicos se dividem em órgãos de direção e controlo, por um lado, e de execução e gestão”, por outro.
A decisão foi criticada pelo ministério italiano da Cultura.
“A referência a uma suposta violação do ‘princípio do sistema legal pelo qual os funcionários públicos se distinguem em órgãos de administração e controlo, por um lado, e execução e administração, por outro’ é completamente incompreensível”, escreveu o ministério, em comunicado.
“O empréstimo para cada obra italiana já estava autorizado no momento da assinatura do acordo, que também prevê a troca de obras segundo as disposições específicas de proteção ditadas pelos museus [a que pertencem] individualmente”, acrescentou.
A troca destas obras já tinha sido objeto de controvérsia no ano passado, quando a Liga Norte, de extrema-direita, fazia parte do governo, juntamente com o Movimento 5 Estrelas (M5S). Na altura, o governo italiano anunciou que não iria autorizar o empréstimo de obras para a exposição do Louvre, tendo a então subsecretária de Estado da Cultura, Lucia Borgonzoni, argumentado que “Leonardo era italiano, só morreu em França, pelo que dar ao Louvre todas essas pinturas seria colocar a Itália nas margens de um grande evento cultural”.
Presente na exposição do Louvre, em Paris, estará, porém, o desenho de Leonardo Da Vinci “Rapariga lavando os pés a uma criança”, da coleção da Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto (FBAUP). A diretora da FBAUP, Lúcia Almeida Matos, disse à Lusa, em janeiro, enquanto exemplo dos empréstimos nacionais e internacionais solicitados à coleção de arte da faculdade, que o desenho de Leonardo Da Vinci vai ser exibido no Museu do Louvre, depois de ter estado na Holanda, na mostra do Museu Teyler, em Haarlem, dedicada aos principais desenhos sobreviventes do mestre da Renascença.
“Rapariga lavando os pés a uma criança”, que esteve exposto no Museu Nacional de Arte Antiga, em Lisboa, de maio a setembro de 2017, na mostra “Madonna – Tesouros dos Museus do Vaticano”, vai assim fazer parte da exposição, a inaugurar no próximo dia 24, no museu mais visitado do mundo.
Segundo a página do Louvre na Internet, esta exposição reunirá “um grupo exclusivo” de obras de Da Vinci, entre pinturas, desenhos e esculturas, com origem em diferentes instituições, que se juntarão às “grandes pinturas” da coleção do Louvre, como “Mona Lisa”, “A Virgem e Santa Ana”, “Baco” e “São João Baptista”.
O Louvre recorda que Leonardo Da Vinci abandonou Itália após a morte do seu patrono, Giuliano de Medici, tendo chegado ao Castelo de Clos Lucé, em Ambroise, em novembro de 1516, onde permaneceu até à sua morte, três anos depois.
“É por isto que o Louvre detém quase um terço das suas pinturas: aquelas que ele trouxe para França foram adquiridas por François I e entraram para as coleções reais, que provavelmente já incluíam ‘A Virgem dos Rochedos’ e ‘La Belle Ferronnière’, adquiridas por Louis XII. Este excecional conjunto de pinturas, que constituiu o começo das coleções do Louvre foi suplementado por 22 dos desenhos do artista”, explica o museu.
Segundo o Louvre, a exposição vai incluir uma “grande seleção de desenhos e um pequeno, mas significativo, grupo de pinturas e esculturas que vão fornecer algum contexto tangível”.
Reino Unido garantiu igualmente o empréstimo de obras de Leonardo da Royal Collection, do British Museum e da National Gallery, que possui a célebre versão de “A Virgem dos Rochedos”, que emparceira com a detida pelo Louvre.
Quanto à obra “Salvator Mundi”, comprada em leilão de forma anónima pela quantia recorde de 403 milhões de euros, mas cuja autenticidade tem sido questionada, a presença permanece incerta. No final de março, o New York Times indicava que o Louvre Abu Dhabi, onde o quadro deveria ficar exposto, desconhece o paradeiro da pintura, e o Art Newspaper noticiava, no passado dia 30 de setembro, que o empréstimo da obra não tinha sido garantido pelo museu francês.
Para acesso ao “Hall Napoléon” do Louvre, que vai acolher a “exposição excecional de Leonardo Da Vinci”, como o Museu a define, vai ser necessário reservar antecipadamente os bilhetes – uma medida destinada a controlar o número de visitantes.
A mais de duas semanas de abertura da exposição, as entradas já se encontram esgotadas para os dias 24 e 28 de outubro, e quase esgotadas para os restantes dias de outubro, estando disponíveis bilhetes apenas para as 9h30, do dia 25, as 19h30, do dia 26, e a partir das 16h, nos dias 30 e 31 deste mês.
// Lusa