O antigo presidente executivo do BES Ricardo Salgado disse hoje que “nunca” deu instruções a ninguém para “ocultar” passivos da Espírito Santo International (ESI), sublinhando que se dedicava “a 100%” à área financeira do Grupo Espírito Santo (GES).
“Nunca dei instruções a ninguém para ocultar passivos do grupo”, disse, reforçando que não deu essas instruções a Francisco Machado da Cruz, contabilista responsável pelos números da ESI.
“Machado da Cruz assumiu totalmente a responsabilidade dos seus actos”, prosseguiu Salgado, que fala desde as 9h10 na comissão parlamentar de inquérito à gestão do BES e do GES.
Ricardo Salgado encontra-se no Parlamento para falar sobre as causas que levaram à queda do império Espírito Santo. Salgado compareceu no Parlamento acompanhado pelo seu advogado pessoal, Francisco Proença de Carvalho.
O buraco na ESI foi somente conhecido em novembro de 2013, declarou o antigo banqueiro, frisando que em análises ao passado se verificou então as incongruências nas contas vinham desde 2008.
“As contas foram assinadas e assumimos todos a responsabilidade. Não dei instruções para ocultação do passivo e só passámos a conhecer a situação em novembro de 2013 e, numa análise para trás, vimos que essa situação vinha desde 2008”, sublinhou.
Frisando que Machado da Cruz prestou “bons serviços” ao longo de mais de vinte anos, e assumindo que não vê o contabilista “há largos meses”, Salgado lembrou que o responsável “assumiu totalmente a responsabilidade dos seus atos” e reiterou que não deu instruções para a ocultação de passivos.
Salgado culpa Banco de Portugal pela queda do BES
Ricardo Salgado considerou Parlamento que o colapso do banco se deveu às exigências excessivas do Banco de Portugal (BdP) em termos de constituição de provisões, num curto espaço de tempo.
“Salvo erro no dia 23 de julho [de 2014], o BdP enviou uma carta ao Dr. Joaquim Goes dizendo que quer que o banco constitua uma provisão no mínimo de dois mil milhões de euros. Foi um exagero. Foi imposta e isso está registado em ata”, afirmou Salgado.
O antigo banqueiro tinha sido questionado acerca das razões que estavam na base das elevadas imparidades do BES, tendo realçado que, durante o seu mandato, sempre foram constituídas as imparidades à medida que iam surgindo.
Salientando que saiu da liderança do BES no dia 13 de julho, e realçando a oposição do Crédit Agricole, um dos acionistas de referência do banco, às exigências do BdP, Salgado disse aguarda as conclusões da auditoria forense.
“Nunca violámos esse aspeto. Sempre que era preciso reforçar os capitais fizemo-lo”, sublinhou, apontando para os dez aumentos de capital para assegurar o rácio “core tier 1” feitos durante a sua gestão.
“Não consideramos ter violado as disposições do BdP. Tivemos sempre, pelo menos, até à minha permanência no banco, os rácios adequados”, afirmou o responsável
E realçou: “Fizemos um aumento de capital de mil milhões de euros, quando o BdP em março tinha pedido 700 milhões de euros e a venda da BES Vida”.
A operação foi “amplamente acima do que o BdP exigia” e, nessa altura, a gestão colocou “o nível de capitalização do banco dentro dos patamares exigidos por Basileia III”, frisou, considerando que “o banco ia resistir aos testes de ‘stress'”.
Daí, Salgado concluiu que “o grupo entrou em colapso por não haver tempo”.
E assegurou: “Não houve fugas de dinheiro do banco para quem quer que fosse. Posso assegurar-lhe isso e espero que as auditorias intensas feitas possam provar isso”.
Salgado apontou para o plano de recapitalização a médio prazo que estava a preparar para o BES e o Grupo Espírito Santo (GES) e considerou que o mesmo só não foi aplicado devido à pressão exercida pelo supervisor bancário.
“A única coisa que pedimos ao BdP foi tempo e tempo foi algo que não nos foi dado”, disse.
Não recorrer à linha da troika foi “decisão racional”
O antigo presidente executivo do BES afirma que o banco optou por não recorrer à linha de 12 mil milhões de euros da troika numa “decisão racional” para melhor garantir a estabilidade da entidade.
“A escolha de não recorrer à recapitalização não era um plano secreto”, declarou Salgado, sublinhando que tal foi uma “decisão racional que se afigurava a melhor para a estabilidade e o futuro do BES”.
O BES, disse Salgado aos deputados, “sempre conseguiu emitir capital e dívida e trazia investimento para Portugal”.
“Sempre quisemos manter o controlo do banco em mãos portuguesas”, sublinhou ainda.
Salgado traçou ainda no Parlamento uma cronologia da crise que, nos últimos anos, “afetou a economia mundial, europeia, e a frágil economia portuguesa”.
Aquando do programa de ajustamento para a economia portuguesa, a troika (Fundo Monetário Internacional, Comissão Europeia e Banco Central Europeu) implementou uma linha de capitalização da banca no valor de 12 mil milhões de euros, sendo que o BES foi uma entidade que não utilizou montantes dessa linha.
“Eu e a minha família fomos julgados na praça pública”
O líder histórico do BES lamentou o julgamento público que diz ter sido alvo, a par da sua família, ao longo dos últimos meses, negando a retirada de milhares de milhões de euros do banco para benefício próprio.
“Durante semanas e meses a fio eu e a minha família fomos julgados na praça pública”, afirmou o homem que liderou o Banco Espírito Santo (BES) durante 22 anos, durante a sua intervenção inicial na comissão de inquérito ao caso BES.
Salgado apontou para as notícias que o acusaram de ter sido o responsável por “fugas em escassas semanas de milhares de milhões de euros” que foram utilizados para comprar “vivendas em Miami e castelos na Escócia”. Negando que tal seja verdade, Salgado assegurou aos deputados que essas são “histórias totalmente falsas”.
Ainda assim, o responsável admitiu que poderá ter cometido erros durante o longo período em que liderou o BES. “Em 22 anos de presidente executivo do BES poderei ter tomado decisões que podem nem sempre ser acertadas”, sublinhou.
Salgado iniciou a sua intervenção no Parlamento a mostrar “total disponibilidade para regressar se entenderem necessário”.
Salgado puxou de um ditado chinês para dar a entender que quer limpar o seu nome, e o da sua família, das acusações que lhes são feitas acerca das responsabilidades na queda do Grupo Espírito Santo (GES).
“O leopardo quando morre deixa a sua pele e um homem quando morre deixa a sua reputação“, ilustrou.
ZAP / Lusa
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