A indigestão é comum. O que a causa, e quando deve preocupar-se

A maior parte das pessoas já sentiu alguma vez desconforto ou dor no estômago, frequentemente acompanhado de inchaço, eructações (o nome mais polido dos vulgares “arrotos”), náusea e sensação de plenitude. É normal, mas a indigestão contínua pode ser sinal de algo mais grave.

Na medicina, o trato digestivo divide-se em duas regiões: superior e inferior. O trato superior inclui a boca, a faringe, o esófago, o estômago e a primeira secção do intestino delgado: o duodeno.

Sintomas nestas áreas do nosso organismo podem indicar várias condições, e ter causas difentes, explica o neurocientista e anatomista Dan Baumgardt, professor da Universidade de Bristol, num artigo no The Conversation.

Um conjunto comum é a dispepsia: desconforto ou dor frequentemente acompanhado de inchaço, eructações (o nome mais polido dos “arrotos), náusea e sensação de plenitude. A maioria de nós já sentiu isto em algum momento.

Também pode envolver refluxo, a sensação de que o conteúdo do estômago volta para cima, ou “waterbrash”, um sabor amargo causado pelo ácido do estômago a atingir a parte de trás da garganta. Os pacientes descrevem estes sintomas de várias formas: azia, refluxo ácido ou “comida que volta”.

As farmácias oferecem uma ampla gama de remédios para tratar a indigestão. Os alginatos, como o Gaviscon, contêm compostos derivados de algas que formam uma “balsa” protetora sobre o conteúdo do estômago, reduzindo o refluxo e prevenindo a irritação da parede estomacal pelo ácido.

Pastilhas mastigáveis, como as Rennies, neutralizam o ácido estomacal. Mesmo medicamentos que reduzem a acidez, como o omeprazol, podem ser comprados sem receita. Embora aliviem os sintomas, podem também atrasar o diagnóstico e tratamento de condições potencialmente graves se usados por longos períodos.

O que causa a indigestão?

Depois de uma refeição rica ou picante ou de uma infeção estomacal, alguma indigestão é esperada – e pode durar alguns dias.

A indigestão também pode resultar de condições benignas, como a hérnia hiatal, em que parte do estômago passa pelo diafragma até ao tórax, tornando o refluxo mais provável. Isto é comum: estima-se que cerca de um terço das pessoas com mais de 50 anos possa ter uma.

Outros fatores de risco incluem café, álcool, alimentos picantes ou gordurosos, grandes porções, gravidez, obesidade e tabagismo. Alguns medicamentos, como antidepressivos, ibuprofeno, anti-inflamatórios e comprimidos de ferro, também podem provocar sintomas.

No entanto, a dispepsia persistente pode, por vezes, estar associada a condições mais graves.

A inflamação do esófago, estômago ou duodeno tem muitas causas, incluindo a infeção por Helicobacter pylori, uma bactéria comum que pode viver no revestimento do estômago e é uma das principais causas de úlceras.

Pode ser necessário recorrer a antibióticos e omeprazol para tratar a infeção. Em alguns casos, esta infeção pode evoluir para uma úlcera péptica, que apresenta sérios riscos de hemorragia ou perfuração do trato digestivo.

Mais preocupante, a indigestão pode ocasionalmente ser sintoma de cancro do trato gastrointestinal superior. Nestes casos, pode ser necessária uma endoscopia, havendo testes alternativos para quem não tolera o procedimento.

Outros cancros internos também podem causar indigestão, entre outros sintomas, incluindo cancro do pâncreas e ovário. Até dores torácicas de origem cardíaca podem imitar a indigestão.

Os sintomas variam consideravelmente entre diferentes condições e pacientes. Por isso, é fundamental não se auto-diagnosticar e procurar aconselhamento médico para que um profissional consiga analisar o quadro completo e definir um plano de ação adequado.

Quando deve preocupar-se

As diretrizes do National Institute for Health and Care Excellence (NICE), organismo público independente que fornece orientação nacional para melhorar a saúde e cuidados sociais em Inglaterra, recomendam investigação urgente com endoscopia para pacientes com massa abdominal ou dificuldade em engolir (disfagia).

Perda de peso inexplicável ou dor no abdómen superior acompanhada de indigestão também são sinais de alerta, especialmente em pacientes na casa dos 50 anos, quando o risco de cancro é maior.

A análise pode também ser considerada para indigestão persistente, resistente ao tratamento, em pacientes com anemia por défice de ferro ou historial de úlceras pépticas.

O historial familiar é igualmente relevante. Ter dois familiares de primeiro grau (pais, irmãos ou filhos) com cancro do trato gastrointestinal superior é outro fator de risco.

Hemorragia gastrointestinal aguda associada a cancro ou úlcera é uma emergência. Pode manifestar-se através de vómitos com sangue – vermelho fresco ou com aspeto de borra de café.

Alguns pacientes podem expelir sangue nas fezes ou apresentar fezes negras, pegajosas e de odor fétido. Esta “melena” indica sangue digerido. Nestes casos, é essencial recorrer imediatamente a cuidados hospitalares.

Outros sinais de alerta incluem icterícia (coloração amarelada da pele), náusea e vómitos, alterações nos hábitos intestinais e cansaço.

E como condições como a doença cardíaca isquémica (estreitamento dos vasos sanguíneos do coração que pode restringir o fluxo sanguíneo e causar dor torácica) podem simular indigestão, é importante estar atento a sintomas cardíacos, sobretudo em pessoas com fatores de risco.

Portanto, se o problema for recorrente, persistente ou grave, ou se notar outras alterações preocupantes, ignore a prateleira da auto-medicação. Marque uma consulta com o seu médico de família. Detetar problemas precocemente pode fazer toda a diferença.

ZAP //

Deixe o seu comentário

Your email address will not be published.