Descreve-se como “um tipo normal”, que só acabou o liceu porque a mãe insistiu muito. Começou a vender latas de ice-tea a 99 cêntimos. Montou o primeiro negócio a distribuir latas de cerveja, e um dia fundou uma das principais marcas de ice-tea nos EUA. Confiava nos seus instintos.
Numa era em que quase todos os bilionários norte-americanos nascem no Silicon Valley e as fortunas se constroem com algoritmos e inteligência artificial, Don Vultaggio destaca-se entre os seus pares.
Atualmente com um património líquido de quase 6 mil milhões de dólares, o empresário de 73 anos e fundador da Arizona Beverage construiu a sua fortuna a vender grande latas coloridas de ice-tea a 0,99 dólares, que se tornaram tão icónicas quanto acessíveis.
Ao contrário de outros bilionários, formados em universidades prestigiadas, como Elon Musk, Jeff Bezos ou Warren Buffett, Vultaggio nunca frequentou a faculdade. Na verdade, afirmou que provavelmente não teria terminado o liceu, se a mãe não tivesse insistido.
“Não era um bom aluno, mas não era culpa da escola. Era culpa minha, e correu-me bem, mas por vezes não corre assim”, conta Vultaggio ao Business Insider, numa entrevista recente.
Os mentores de Vultaggio foram o seu primeiro chefe e o pai.
Ainda adolescente e a estudar, Vultaggio começou a trabalhar para o seu primeiro chefe num supermercado no Brooklyn, a ganhar 1 dólar à hora. “Esse homem deu-me a experiência de ser um empresário,” conta o bilionário. O trabalho ensinou-lhe o valor de um dólar e a perceção de quanto pode durar uma hora.
Quando esse chefe faleceu, há alguns anos, a família enviou as suas cinzas a Vultaggio. “Ele está enterrado no meu quintal, com uma placa que diz o melhor patrão do mundo”.
Depois de terminar o liceu, Vultaggio continuou a trabalhar em supermercados, tal como o pai, que tinha passado a vida nesse setor. “Ele disse-me: não quero que o meu filho esteja no negócio dos supermercados”, recordou. “Então arranjou-me um emprego numa cervejaria local”.
Alguns anos depois, a cervejaria fechou, ensinando-lhe uma lição importante sobre negócios: “Digo sempre que, quando as empresas falham, é porque se esqueceram do que o cliente queria. Era uma marca de cerveja popular num determinado momento, mas depois perdeu popularidade”.
Durante cerca de 20 anos, Vultaggio geriu o seu próprio negócio de distribuição de cervejas de várias marcas, construído desde o zero. “Ia a bairros difíceis em Nova Iorque e entregava cerveja aos bares da cidade”.
O negócio resultou porque, embora as suas cervejas não fossem as mais baratas, oferecia aos clientes serviço e valor quando precisavam, uma característica que lhe viria a ser útil quando co-fundou a Arizona Beverage USA, também conhecida como AriZona, com John Ferolito, em 1992.
AriZona

Inicialmente, o que diferenciava as bebidas AriZona eram as suas grandes latas de 0,7 litros, decoradas com designs coloridos criados pela esposa de Vultaggio
Confiar nos instintos
“Quando comecei a marca, não sabia nada sobre ice-tea, para além de que o bebia quando era miúdo. Não sabia como desenvolvê-lo, obtê-lo, produzi-lo, tudo isso, mas aprendi no trabalho,” disse Vultaggio.
O que ele sabia era como os clientes compravam bebidas, porque tinha visto isso em primeira mão inúmeras vezes nas lojas e estabelecimentos a que entregava produtos durante anos.
“Os consumidores tomavam a decisão junto do frigorífico. Não importava o que tivessem visto ontem na televisão numa publicidade. Tomavam a decisão ali mesmo, e uma etiqueta com o preço motivava essa decisão”, explicou.
Esses instintos levaram Don Vultaggio, em 1997, a fazer algo que um dos seus vendedores descreveu na altura como a ideia mais estúpida que alguma vez teve: imprimir “99¢” nas latas de chá gelado.
“Como não tinha recursos para competir com a Coca-Cola e a Pepsi em publicidade, disse: tenho de ter uma lata que se destaque no frigorífico”, contou.
Em 2000, as vendas subiram 30%, contou ao The New York Times. Hoje, a AriZona é uma das principais marcas de chá pronto a beber nos EUA, vendendo anualmente cerca de 2 mil milhões de latas e gerando 4 mil milhões de dólares em vendas.
Embora as suas latas altas (“tallboys”) sejam a imagem da empresa, a marca também vende garrafões e garrafas pequenas de plástico dos seus chás, sumos mistos e bebidas energéticas.
Vultaggio atribui o seu sucesso a alguns fatores. “Quando alguém coloca o seu dinheiro arduamente ganho numa mesa e recebe uma lata de chá ou sumo, e diz uau, é um bom negócio, nesse momento, conquistei esse cliente”,
Inicialmente, o que diferenciava as bebidas AriZona eram as suas grandes latas de 0,7 litros, decoradas com designs coloridos criados pela esposa de Vultaggio, vendidas pelo mesmo preço que as garrafas mais pequenas dos concorrentes.
Hoje, o destaque vai para o facto de a empresa, em 33 anos, nunca ter aumentado o preço de 0,99 dólares nas suas grandes latas, apesar da inflação e do aumento de preços de outras marcas líderes, incluindo Nestlé, Lipton e Snapple.
A empresa reduziu, no entanto, o tamanho das latas para 0,65 litros, um pequeno truque de marketing de que já falámos algumas vezes no ZAP, que dá pelo nome de reduflação.
Ser dono da empresa é uma grande razão para ter conseguido manter os custos baixos, mesmo durante a pandemia, quando os custos de transporte aumentaram. “Nós somso donos de tudo; não tínhamos um banco, um conselho de administração ou acionistas a perguntar: o que estão a fazer?,” explicou.
Entretanto, o património líquido de Vultaggio quase duplicou, passando de 3 mil milhões de dólares em 2018 para quase 6 mil milhões em 2025, segundo a Forbes.
Apesar da enorme fortuna, Vultaggiodescreve-se como um “tipo normal”. Desde condutores de empilhadora a executivos, acredita que um negócio deve ser gerido como uma comunidade, onde as pessoas se tratam com respeito.
“É por isso que temos sucesso,” explica. “Não sou apenas eu. Muitas pessoas, milhares de pessoas, todas a contribuir regularmente. Digo sempre: tens de gerir um negócio como se fosse uma família”.