O governo divulgou na sexta-feira alguns pontos do capítulo 6 do relatório sobre os incêndios de Pedrógão Grande, que fazem uma análise detalhada a casos de sobrevivência, a vítimas mortais encontradas e a problemas nas comunicações.
Os pontos em causa no relatório elaborado pelo Centro de Estudos sobre Incêndios Florestais da Universidade de Coimbra, analisam várias situações, entre elas casos de sobrevivência por as pessoas terem permanecido em casa ou em tanques de água, alguns feridos que foram socorridos, as pessoas que foram encontradas já sem vida, mas salvaguardam a identidade dos envolvidos, bem como alguns dos locais onde ocorreram as situações.
A Comissão Nacional de Proteção Dados (CNPD) vetou a publicação integral do capítulo 6 do relatório elaborado por Domingos Xavier Viegas sobre os incêndios de Pedrógão Grande, permitindo apenas que os familiares das vítimas tenham acesso à informação.
Apesar do veto, a Comissão Nacional de Proteção Dados autorizou a publicação de alguns pontos do capítulo 6, desde que previamente sejam colocados no anonimato “alguns elementos que podem permitir indiretamente a identificação dos intervenientes” e que “cada um dos intervenientes der o consentimento”.
No caso do Nodeirinho, o relatório descreve o seguinte:
“Nesta pequena aldeia houve um grupo de onze pessoas que se salvaram permanecendo no tanque público situado no centro do lugar de Nodeirinho. Os primeiros a fazê-lo terão sido T105, o seu marido T095 e a sua mãe T096, para dar proteção à sua mãe, que por ter dificuldades em se deslocar recusou sair da aldeia. Conseguiram transportá-la para a água quando o incêndio chegou junto da aldeia. Apesar de as chamas não se terem aproximado do tanque, sentiram um grande desconforto pelo calor e pela radiação. Outras pessoas que viviam ou estavam em Nodeirinho, meteram-se igualmente dentro do tanque que tem 2 por 5m2 e 0,8m de profundidade.”
São relatados também situações semelhantes nas localidades de Pobrais, Sarzedas de S. Pedro e Moita.
O relatório apresenta relatos de “casos de sobrevivência” como o exemplo seguinte:
“Em Pobrais, S032 e a sua esposa, viram sair da aldeia um grande número de pessoas nos seus carros, mas decidiram manter-se para defender a sua casa. Esta oferecia boas condições de segurança, mas em sua volta havia alguns quintais de vizinhos que tinham muito material incandescente. Utilizando mangueiras e, mais tarde baldes de água, conseguiu apagar focos de incêndio nos terrenos em volta e nos quintais vizinhos, tendo conseguido salvar não apenas a sua casa, mas a do seu vizinho S008. Em contrapartida, a casa do casal viria a arder completamente. Na mesma rua, vivia S033, que apesar de viver só e de ver sair vários dos seus vizinhos, decidiu permanecer em casa. Com água andou a apagar focos de incêndio próximo da casa. Um pouco mais abaixo era a casa de V064, que acabaria por arder e ruir, causando a sua morte.”
Há ainda relatos detalhados do momento em que os bombeiros começaram a encontrar cadáveres:
“…Este disse-lhe para continuar na 236-1 que haveria lá problemas. Depois de terem tirado os idosos regressaram à EN 236-1, deixaram o carro parado, porque estava um pinheiro caído. Junto do tronco encontraram um cadáver. Aqui começa todo o procedimento de levantamento dos corpos que iam vendo. Foram à procura nos veículos todos, nalguns foi possível identificar cadáveres, muitos dentro dos veículos (a maior parte). Nesse troço contaram 19 ou 20 corpos e fizeram essa comunicação, uma vez que não conseguiram falar diretamente para o PCO (não tinham rede telemóvel e o SIRESP também não permitia fazer isso) fizeram essa comunicação para Lisboa, via rádio. Trocaram de canal, ligaram o canal nacional e passaram essa informação para o Comando Nacional; quem estivesse via rádio naquele canal ouviria a conversa. Passaram a informação de onde estavam (passaram as coordenadas), o cenário que tinham encontrado até ali e o número de vítimas mortais que já tinha conseguido contabilizar. T103 indica que identificaram 19 vítimas nesse troço, mas que o número seria superior. Isto pelas 22:30, já não havia nada a arder, nem carros. Havia muito fumo. Nessa altura não havia ninguém, passado 15 minutos passou uma patrulha da GNR…”
O documento salienta ainda o testemunho de um dos primeiros bombeiros a sair para o incêndio, com uma análise detalhada do seu percurso e do que foi encontrando, tendo recolhido alguns feridos pelo caminho.
Esta pessoa fez um dos primeiros pedidos de socorro registados pela fita do tempo, cerca das 19:25.
É também revelado o percurso de um elemento que saiu para o local a pedido do Comandante Nacional para fazer o reconhecimento do perímetro do incêndio de Pedrógão Grande, acompanhado por elementos da Força Especial de Bombeiros, a 17 de junho, que descreve que encontrou “uma criança caída no chão” perto do Outão.
“A criança estava inconsciente e tinha queimaduras na parte posterior do braço e nas pernas também. Estava de calções, ‘t-shirt’ e sandálias”, refere o documento, acrescentando que havia fogo de ambos os lados da estrada.
Ao longo do percurso que os bombeiros continuaram a efetuar, que decorreu até à manhã do dia 18, foram encontrando outras vítimas mortais, explicando que deixaram “os corpos tapados” e identificaram “as coordenadas geográficas”.
Os pontos divulgados do relatório terminam com o caso de um homem que socorreu pessoas e acabou por voltar ao lugar de Adega, informando a GNR que sabia que ainda lá estavam mais pessoas feridas.
“Os agentes deixaram-no prosseguir, por sua conta e risco“, frisa o documento, referindo que o homem conseguiu recolher mais pessoas para serem socorridas.
ZAP // Lusa
Incêndio em Pedrógão Grande
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Então afinal onde é que estão os trechos altamente incriminadores deste documento? Só consigo ler histórias de heroismo e de tragédias humanas. Não leio nada de “incriminador”.
A história é velha. “Alguém tem de pagar” pelo sofrimento da alguém. ninguém sofre sem que haja um culpado. Era assim que já pensavam os Astecas, que de cada vez que não chovia nas culturas, tratavam de sacrificar uns quantos desgraçados para apazifuar a ira dos Deuses.
Já era é tempo de termos evoluido um pouco.
“…O governo divulgou na sexta-feira alguns pontos do capítulo 6 …”
o que é que não percebeu mesmo nesta frase, seu iluminado de trazer por casa?