Foi quando estava à procura de “segredos do futebol” no âmbito dos Football Leaks que o hacker Rui Pinto “tropeçou” nos documentos que incriminam Isabel dos Santos nos Luanda Leaks. É o seu advogado, o francês William Bourdon, quem o revela, realçando que recebeu dele um disco rígido em 2018, e que depois o entregou ao Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação (CIJI) e às autoridades francesas.
As revelações de Bourdon são feitas em entrevista ao jornal The New York Times (NYT) depois de um comunicado onde Rui Pinto assume ter sido o “denunciante” dos Luanda Leaks.
“Ele tropeçou nisto”, aponta William Bourdon que também representa Edward Snowden, o ex-analista de sistemas da CIA que divulgou informações confidenciais sobre a NSA, a Agência de Segurança Nacional dos EUA.
O advogado francês realça que recebeu do hacker português um disco rígido com os dados em 2018, durante um jantar na Hungria, onde ele vivia quando foi detido pelas autoridades portuguesas. Depois diz que partilhou a informação com o consórcio de jornalistas e com o Ministério Público francês.
“Eu construí uma relação muito confidente com ele e ele estava feliz por partilhar a informação connosco sobre este grande escândalo africano”, reforça Bourdon no NYT.
Entretanto, o seu outro advogado, o português Teixeira da Mota, reforça na Rádio Renascença que “Rui Pinto tinha decidido que revelaria [que era ele o denunciante] na data em que fosse divulgado” o caso de Isabel dos Santos nos media. “Isto é, o Rui Pinto entregou, em finais de 2018, esse disco rígido para este consórcio de jornalistas trabalhar e o consórcio demorou cerca de um ano”, aponta.
Teixeira da Mota diz ainda que estando preso, Rui Pinto “não tem qualquer contacto nem possibilidade de influenciar” quando foram divulgadas as notícias, mas salienta que espera que a informação ajude o seu cliente no processo em que é acusado pela justiça portuguesa de mais de 90 crimes.
Bourdon defende que ele deve ter o estatuto de “denunciante”, recebendo atenuantes, apesar dos métodos ilegais que utilizou. “Ele assumiu todos os riscos. Sofreu porque foi inspirado por um sentimento de que os seus dados precisavam de ser publicados de modo a entender todas as práticas sombrias e corruptas da comunidade do futebol”, constata.
Entretanto, Teixeira da Mota refere ao Jornal Económico que Rui Pinto lhe transmitiu a “preocupação de poderem colocá-lo numa prisão de alta segurança com o pretexto da segurança”.
Frisando que “ele está bem” e que “não tem tido ameaças”, o advogado destaca que tem “mais receio de que em nome da segurança, a administração prisional o queira colocar num estabelecimento prisional de alta segurança, dificultando-lhe o contacto com a família e com a defesa”. Essa medida ia “punir Rui Pinto” e levá-lo ao “isolamento”, considera.
A Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais (DGRSP) não confirmou, nem negou a possibilidade da transferência de Rui Pinto para uma prisão de alta segurança, salientando ao Económico que “a legislação obriga a manter o dever de reserva a pessoas que estão à [sua] guarda”.
No epicentro de Football Leaks e Luanda Leaks estarão documentos da empresa de advogados PLMJ, a mesma a quem o hacker “apanhou” emails do caso de violação que envolveu Cristiano Ronaldo. Mas o sócio gestor da PLMJ, Luís Pais Antunes, frisa ao NYT que “é impossível que a documentação que está a ser usada para a maior parte das histórias esteja, de alguma forma, relacionada com a PLMJ ou alguma vez tenha estado à [sua] disposição”.