/

Insalubridade e sobrelotação. 22 situações de alojamento com deficiências em Odemira

Luís Forra / Lusa

As autoridades já identificaram no concelho de Odemira, no distrito de Beja, um total de 22 situações de alojamento de trabalhadores agrícolas com deficiências, por falta de salubridade ou por sobrelotação, revelou nesta segunda-feira o autarca local.

Em declarações aos jornalistas, no final de uma reunião de coordenação da task force do concelho que acompanha a situação da covid-19, o presidente da câmara municipal indicou que foram “efetuadas, até ao momento, 22 vistorias, no total, a situações identificadas de menor salubridade”, incluindo “obviamente algumas habitações em sobrelotação”.

“Neste momento, as informações estão recolhidas, foi definido o procedimento de evacuação de algumas [dessas habitações] e de redução do número de habitantes noutros casos”, acrescentou.

Agora, cabe à autoridade de saúde pública “decidir qual é o momento de atuação, uma vez que foi também decidido efetuar testagem prévia a todos os ocupantes” das respetivas residências ou espaços, assinalou.

No final da reunião desta segunda-feira, na qual participou o Alto Comissariado para as Migrações (ACM), o autarca de Odemira insistiu que cabe às autoridades de saúde decidir quando devem ser transferidas pessoas com covid-19 para a Pousada da Juventude de Almograve ou para isolamento profilático no complexo turístico Zmar, mas afiançou que “será seguramente até amanhã”, terça-feira, que essa transferência arranca.

“Amanhã, certamente que haverá já situações operacionalizadas”, frisou, adiantando também que o ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, vai participar numa reunião, em Odemira, na terça-feira.

O Governo decidiu decretar uma cerca sanitária às freguesias de São Teotónio e de Almograve, no concelho de Odemira, devido à elevada incidência de casos de covid-19, sobretudo entre trabalhadores do sector agrícola, anunciou o primeiro-ministro, António Costa, na quinta-feira à noite.

O chefe do Governo sublinhou também que “alguma população vive em situações de insalubridade habitacional inadmissível, com hipersobrelotação das habitações”, relatando situações de “risco enorme para a saúde pública, para além de uma violação gritante dos direitos humanos”.

Segundo o presidente do município de Odemira, o procedimento de transferência dos trabalhadores agrícolas “prevê uma testagem prévia”, no local vistoriado, por parte de uma equipa da Cruz Vermelha, e, quanto ao transporte, o que está acordado é que “será concedido um prazo de 24 horas ao proprietário, arrendatário ou responsável por esse alojamento” para resolver a situação, de “duas formas”.

“Ou ele dispõe de um local alternativo” em que possa garantir, “em condições de salubridade, o alojamento de todos ou, em alternativa, terá de ser ele a promover o respetivo transporte” para os locais identificados pelas autoridades para os isolamentos profiláticos ou para a quarentena dos infetados, explicou.

José Alberto Guerreiro disse que “os números” da covid-19 “estão a baixar” no concelho, mas admitiu não ter qualquer indicação sobre um prazo para o fim da cerca sanitária.

“Ninguém entra no domicílio de outra pessoa sem uma ordem judicial”

A Ordem dos Advogados defendeu esta segunda-feira que a requisição temporária do complexo turístico Zmar, em Odemira (Beja), para alojar trabalhadores agrícolas devido à covid-19, não pode abranger casas privadas, sob pena de violar a Constituição.

Após visitar o empreendimento turístico, no concelho de Odemira (Beja), o bastonário da Ordem dos Advogados (OA), Luís Menezes Leitão, invocou o artigo 34, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa (CRP) para argumentar que a requisição civil do complexo não pode abranger as casas privadas aí existentes.

“O artigo 34, n.º 2 da Constituição diz expressamente que ninguém entra no domicílio de outra pessoa sem uma ordem judicial e, precisamente por isso, espero que a Constituição seja respeitada”, alertou.

Segundo Menezes Leitão, a requisição civil decretada pelo Governo ao Zmar Eco Experience, na freguesia de Longueira-Almograve, com 260 habitações, das quais cerca de 100 são do complexo e as outras 160 são particulares, “chegaria se não estivesse em causa o domicílio privado de pessoas”.

“A Constituição protege o domicílio, seja ele qual for”, argumentou, reafirmando: “O que nós temos é um despacho do Governo. Não temos nenhuma ordem judicial”.

Depois de conversas com diversos proprietários de casas no empreendimento, o bastonário da OA disse compreender “a situação dramática” dos trabalhadores agrícolas, sobretudo migrantes, de Odemira, concelho onde duas freguesias estão sob cerca sanitária, devido à elevada incidência de casos de covid-19.

Contudo, para Luís Menezes Leitão, a falta de condições de habitação para estes trabalhadores “tem origem numa resolução do Conselho de Ministros de outubro de 2019, que permitiu 16 pessoas por unidade de alojamento, quatro por quarto e umas área de 3,4 metros quadrados” para os migrantes.

“A resolução do problema deles é imperiosa”, mas “não deve passar pela ocupação de domicílios privados, porque a inviolabilidade do domicílio é uma garantia constitucional”, insistiu.

Para justificar a sua posição, o bastonário disse ainda que também “a nível de direitos humanos” é preciso não haver violações, aludindo ao “artigo 12 da Declaração Universal dos Direitos do Homem” e ao “artigo 8.º da Convenção Europeia”.

Lembrando que o estado de emergência já não está em vigor, Menezes Leitão considerou que o Governo, ao decretar a requisição do Zmar, provocou “uma mistura de situações bastante diferentes”, porque “uma coisa é a requisição de empreendimentos turísticos” ou “comerciais” e outra “é a de habitações privadas”, sejam elas de primeira ou de segunda habitação.

“O caso de primeira habitação ainda mais grave, porque a pessoa é colocada na rua precisamente neste quadro de pandemia. Mas, mesmo sendo de segunda, é um caso de violação da intimidade da vida privada” e, a partir do momento em que acabou o estado de emergência, “não podem mais ser suspensos os direitos fundamentais das pessoas”, assinalou.

Já no que toca ao núcleo de casas pertencente ao complexo turístico, Luís Menezes Leitão disse não colocar “o mesmo problema” relativo às habitações privadas.

// Lusa

Deixe o seu comentário

Your email address will not be published.