Ana Kotowicz analisa o conflito na Ucrânia e centra-se na morte de civis: “Os russos simplesmente não sabem fazer guerra de outra maneira”.
“Passados 40 dias de guerra, depois de Maiurpol, Irpin e Bucha, acho que ninguém acredita que a morte de tantos civis foi um erro. Os russos simplesmente não sabem fazer guerra de outra maneira”.
A jornalista Ana Kotowicz analisou na rádio Observador a guerra na Ucrânia e o assunto foi o número elevado de civis que já morreram durante o conflito. Pelo menos 1.563 mortos, de acordo com os números mais recentes do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos.
A ideia que fica, e que vai sendo repetida, é que os responsáveis e militares russos não querem saber se há ou não civis nos locais que ataca. Sobretudo depois do massacre em Bucha: “Neste momento é difícil dizer que os russos se importam com os civis, depois de vermos as imagens de Bucha”.
“Até aqui víamos imagens de bombardeamentos a alvos civis; agora vemos o resultado dessas movimentações, o que é completamente diferente”, analisou, recordando declarações da delegação ucraniana: “A Rússia é pior do que o Estado Islâmico”.
Ocidente não reagiu na Síria
Têm sido feitas comparações com o que as forças russas fizeram em ataques noutros territórios – Chechénia e Síria. “E a cartilha é a mesma de sempre: cercar cidades, atacar alvos sem qualquer interesse militar e não respeitar corredores humanitários quando estes estão a tentar evacuar civis em segurança”.
Há algo que terá motivado Vladimir Putin para esta invasão a Ucrânia: “O Ocidente não travou a Rússia na Síria e noutros locais. Deu luz verde a Putin para que agisse da mesma forma noutros conflitos”.
“Ao longo do tempo, Putin foi testando as águas. Foi tentando ver até onde podia ir, como as crianças pequeninas fazem com os pais. E o que ele percebeu é que fazia o que queria e saía praticamente impune”, avisou a jornalista do Observador.
Neste caso, o presidente da Rússia esperava que o cenário da invasão à Crimeia iria repetir-se: “Nunca esperou que o Ocidente se unisse, como aconteceu agora pela primeira vez”.
A Rússia “sabe o que são crimes de guerra. Ao bombardear alvos civis, sabe o que está a fazer”. E o que Putin queria fazer ao atacar estes alvos civis? “O grande objectivo de Putin era aterrorizar a população, para tentar capitular o Governo ucraniano após pressão dos locais”.
“Mas não contava que houvesse uma resistência em peso por parte dos ucranianos, muito impulsionada pela resistência do seu presidente Volodymyr Zelenskyy”, acrescentou Ana.
A Ucrânia já estava preparada para um eventual conflito desde 2014, na anexação da Crimeia, ao contrário da comunidade internacional, que praticamente ignorou a região ao longo destes últimos oito anos.
Provar crimes de guerra
Nos próximos tempos, entidades independentes e internacionais vão averiguar se os ataques a alvos civis foram intencionais: “Nada disso (provar) é fácil. Em Mariupol tem havido ataques indiscriminados, quando se atingem alvos civis sem qualquer alvo militar nas redondezas e, principalmente, sem dar tempo para as pessoas locais se abrigarem. Podes atacar alvo civil mas o direito humanitário obriga dar tempo às pessoas para se abrigarem”.
Já foram identificados pelo menos 11 locais de ataques indiscriminados, que são potenciais crimes de guerra. “Mas falta mais um pouco para saber se fez parte da estratégia russa”, acrescentou.
No entanto, a jornalista acredita que as imagens que têm chegado de Bucha “vão dar uma grande volta ao processo e as provas que faltavam vão passar a estar à vista de todos”.
A jornalista reforçou ainda a utilização ilegal de armas por parte das forças russas: bombas termobáricas e bombas de fragmentação são armas proibidas pelo direito humanitário.