Marcelo Rebelo de Sousa “devolve a palavra ao povo” e dissolve o Parlamento, convocando eleições antecipadas para 10 de Março de 2024.
O Presidente da República anunciou, nesta quinta-feira, que optou pela dissolução da Assembleia da República depois da demissão do primeiro-ministro António Costa, “devolvendo a palavra ao povo”.
“Fi-lo por decisão própria no exercício de um poder conferido pela Constituição da República Portuguesa”, sublinhou.
Marcelo convoca eleições antecipadas para 10 de Março de 2024.
As razões para esta decisão prendem-se com o facto de considerar que a maioria absoluta do Governo foi “personalizada” em António Costa “com base na sua própria liderança, candidatura, campanha e esmagadora vitória”. Assim, não se justificava substituir a figura do primeiro-ministro por outra personalidade do PS, como pretendiam os socialistas.
Além disso, Marcelo referiu a “fraqueza da formação de novo Governo com mesma maioria, mas qualquer outro primeiro-ministro”.
E como terceiro motivo para a dissolução, o Presidente da República avançou “o risco já verificado no passado de essa fraqueza redundar num mero adiamento da dissolução para pior momento”, com um Governo “presidencial” a prazo.
Aprovação do OE2024 assegurada
Marcelo também sublinhou o facto de o Orçamento de Estado para 2024 (OE2024) já ter sido aprovado na generalidade, o que dá a “garantia da indispensável estabilidade económica e social“.
“A aprovação do OE permitirá ir ao encontro das expectativas de muitos portugueses e acompanhar a execução do PRR [Plano de Recuperação e Resiliência], que não para nem pode parar”, sublinhou.
O chefe de Estado também destacou que se exige “maior clareza e mais vigoroso rumo para superar um vazio inesperado” que “perturbou” os portugueses.
E, assim, “devolve a palavra ao povo”, “sem dramatizações nem temores”, porque “é essa a força da democracia: não ter medo do povo“, concluiu.
Marcelo também realçou que tentou “encurtar o mais possível o tempo desta decisão, tal como o da dissolução e convocação de eleições”.
Agora, é tempo de “olhar em frente, escolher os representantes do povo e o Governo que resultará das eleições” e que terá como dever “segurar a estabilidade e progresso económico, social e cultural“, sublinhou o chefe de Estado, recomendando que haja uma “visão de futuro, tomando o já feito, acabando o que importa fazer e inovando no que ficou por alcançar”.
PS quer “respeito” para escolher novo líder
No PS, mantêm-se contidos na reacção à posição do Presidente da República – até porque é uma altura complicada. Por isso mesmo, se pede “respeito pelas instituições democráticas” – neste caso, a Comissão Política Nacional do PS – para decidir a questão da sucessão de António Costa.
Quem fala nestes termos é o actual ministro da Administração Interna, José Luís Carneiro, um dos nomes avançados como possível sucessor de Costa.
Carneiro não revelou se vai, ou não, candidatar-se à liderança do PS. Mas sublinhou que “temos de ser ponderados” neste momento difícil.
Líder do PSD fala em eleições “inevitáveis”
“Era inevitável que a palavra fosse devolvida ao povo português“, considerou o presidente do PSD, Luís Montenegro, em reacção à decisão de Marcelo Rebelo de Sousa.
Sublinhando o “respeito” e “concordância” com a decisão, Montenegro sublinhou também que, agora, “é urgente restabelecer o prestígio, a credibilidade e a confiança das pessoas nas instituições democráticas”.
“É preciso cortar o mal pela raiz” e “virar a página do empobrecimento“, apontou ainda, já em campanha eleitoral.
“Quero dizer aos portugueses que vamos disputar estas eleições com humildade e proximidade com as pessoas, as famílias, as empresas e as instituições portuguesas, mas também vamos enfrentar este acto eleitoral com ambição“, garantiu.
Sobre o OE2024, Montenegro entende a posição de Marcelo, salientando que pretendeu salvaguardar “a vida das pessoas”, mas prometeu que, caso o PSD vença as eleições, “serão corrigidas” as principais divergências.
Chega, IL, PCP e Bloco queriam eleições “mais cedo”
O presidente do Chega, André Ventura, já mostrou o desapontamento com a data das eleições antecipadas, sublinhando que deveriam ocorrer em Fevereiro.
“Assim, o que vai acontecer é que o primeiro semestre do próximo ano, do ponto de vista económico, está absolutamente ocupado por este OE que vai ser aprovado”, destacou Ventura, concluindo que o novo Governo só vai, efectivamente, “começar a governar no Verão ou um bocadinho depois”.
O líder da Iniciativa Liberal (IL), Rui Rocha, diz também que “havia condições e devia haver uma data mais próxima” para realizar as eleições.
O deputado da IL também notou que espera que esta seja “a última vez que o PS atrasa o país”. Já a olhar para o futuro, sublinha quer a IL quer por “Portugal a crescer e a funcionar” e garantir que “os portugueses possam ter acesso à saúde, ao transporte e à educação”.
Assim, Rui Rocha vê esta crise política como “uma enorme oportunidade para que o futuro seja de transformação e ambição”.
O PCP alinha também pela ideia de que as eleições “deveriam ser realizadas mais cedo e não há justificação para o seu protelamento“, como sublinhou a deputada Paula Santos.
Quanto ao OE2024, o PCP “não vai deixar de intervir” na discussão para “garantir os direitos consagrados na nossa Constituição”, prometeu ainda Paula Santos.
A deputada comunista também defendeu que “a resolução dos problemas que afectam a vida diária dos trabalhadores e do país exigem a ruptura com opções políticas de favorecimento dos grupos económicos, que são prosseguidas pelo Governo do PS e têm sido no essencial acompanhadas por PSD, CDS, Iniciativa Liberal e Chega”.
Também o Bloco de Esquerda queria que as eleições fossem “mais cedo”, como assumiu o deputado Pedro Filipe Soares. Contudo, não há dúvidas quanto à necessidade de dar a palavra ao povo.
“Em democracia, os problemas resolvem-se com eleições, com a voz dos eleitores, do nosso povo”, realçou o deputado bloquista.
Quanto ao OE2024, o Bloco vai voltar a votar contra, assegurou ainda Pedro Filipe Soares.
Livre alerta para disfarces em “pele de cordeiro”
O PAN está de acordo com a data das eleições e com a aprovação do OE2024, até porque tem várias políticas que o partido defende, como sublinhou a deputada única do partido, Inês Sousa Real.
“Pode ser um orçamento da Assembleia da República, pode ser que o PS saia pela primeira vez da sua bolha”, sublinhou ainda a líder do PAN.
O outro deputado único, Rui Tavares, representante do Livre, preferiu alertar que não estamos apenas perante uma crise política, mas a meio de “uma crise de regime que todos nós temos de contribuir para debelar”.
Tavares também criticou “os métodos da democracia antiga, opaca, personalizada e muitas vezes capturada por interesses privadas” e pediu mudanças na “cultura de poder, tanto político quanto judicial”, para “salvar a democracia deste tipo de enquistamentos”.
Além disso, apontou que é preciso uma “vigilância serena”, para impedir que agentes “populistas e autoritários” que tentam “fazer-se passar por pele de cordeiro”, usem “as regras da democracia para a subverter”.