Ex-autarcas de Pedrógão Grande elaboraram plano para fazer chegar mais dinheiro ao concelho

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Paulo Nobre / Lusa

O Tribunal Judicial de Leiria considerou que os ex-autarcas de Pedrógão Grande Valdemar Alves e Bruno Gomes, esta segunda-feira condenados a prisão no processo da reconstrução de casas após os incêndios, elaboraram um plano para fazer chegar mais dinheiro ao concelho.

“Toda a conduta dos arguidos (…) aponta num único sentido – do plano elaborado pelos arguidos Valdemar Alves e Bruno Gomes de fazer chegar ao concelho de Pedrógão Grande mais dinheiro do que aos demais concelhos, através da aparência da necessidade de reconstrução de habitações não permanentes ardidas”, lê-se no acórdão, de 338 páginas, disponibilizado à comunicação social.

O ex-presidente da Câmara de Pedrógão Grande Valdemar Alves foi esta segunda-feira condenado na pena única de sete anos de prisão, por 13 crimes de prevaricação de titular de cargo político e 13 crimes de burla qualificada, alguns destes na forma tentada.

Já o antigo vereador Bruno Gomes foi condenado a seis anos de prisão, por 11 crimes de prevaricação de titular de cargo político e 13 crimes de burla qualificada, sendo que três o foram na forma tentada.

Os restantes 26 arguidos eram requerentes da reconstrução de imóveis como se de primeira habitação se tratasse, familiares destes ou funcionários das Finanças e de Junta de Freguesia, tendo sido absolvidos 14.

Para o coletivo de juízes, os antigos autarcas sabiam que, “com a aparência que criavam, através da narração de factos falsos, obtinham um benefício para os requerentes das habitações em causa e para o concelho de Pedrógão Grande, a que de outro modo não teriam direito (como, de resto, segundas habitações dos demais concelhos atingidos pelos incêndios não tiveram)”.

“Resulta por demais evidente que o apoio do Fundo Revita (e entidades com o mesmo protocoladas) à reconstrução, na sequência dos incêndios ocorridos, se destinava à recuperação das primeiras necessidades dos munícipes atingidos (e independentemente de, em momento posterior, se poder vir a decidir afetar o remanescente dos apoios a outras necessidades, conforme previsto no regulamento — o que não incumbia aos arguidos decidir, menos ainda naquele momento)”, lê-se no documento.

O Revita, criado pelo Governo, é um fundo de apoio às populações e à revitalização das áreas afetadas pelos incêndios ocorridos em junho de 2017. Agrega a recolha de donativos em dinheiro, em espécie de bens móveis ou em serviços.

Ainda segundo o documento, os dois arguidos entenderam levar a cabo, no âmbito deste fundo “e do apoio das entidades protocoladas (e não só), obras de reconstrução de habitações não permanentes“.

“Fizeram-no por discordarem do estabelecido no regulamento e da decisão (política) que o acompanhou de não apoio das habitações não permanentes, que conheciam perfeitamente e sobre o que não tinham qualquer dúvida — tanto assim que tiveram necessidade de fazer passar por habitações permanentes (com falsas declarações, falsas mudanças de domicílio fiscal e documentação variada) habitações que sabiam não terem qualquer direito ao referido apoio”, adianta.

Para o Tribunal, “é de tal forma evidente e patente, da mera análise dos documentos que instruíam os processos, que os imóveis em causa nos mesmos não respeitavam a habitações permanentes (não obstante os arguidos afirmassem e declarassem o contrário), que resulta claro e cristalino” que Bruno Gomes e Valdemar Alves “tinham perfeito conhecimento das informações falsas que prestavam nos mencionados processos e que as quiseram prestar de modo a conseguir um benefício para cada um dos requerentes”.

Segundo o coletivo de juízes, no que respeita ao Fundo Revita e às entidades protocoladas (União das Misericórdias Portuguesas, Fundação Calouste Gulbenkian e Cruz Vermelha Portuguesa), “dúvidas inexistem de que os apoios em causa apenas foram concedidos por se haver acreditado nas informações prestadas pelo município, a quem competia a instrução dos processos de candidatura e a elaboração de proposta de decisão, de que as habitações a reconstruir eram permanentes”.

O acórdão assinala ainda que, em consequência dos danos causados pelos incêndios de junho de 2017, “o estado da generalidade das habitações ardidas não permitia apurar da habitabilidade das mesmas ou do seu caráter devoluto” antes dos fogos.

Por isso, “não tinha o Revita nem as entidades protocoladas maneira de saber tais informações relativas às habitações ardidas” a não ser que se substituíssem ao município “no trabalho de levantamento e sindicância das habitações permanentes e não permanentes”, pelo que confiaram nas “informações prestadas pelas entidades competentes”.

O incêndio que deflagrou em 17 de junho de 2017 em Pedrógão Grande, distrito de Leiria, e que alastrou a concelhos vizinhos, provocou 66 mortos e mais de 250 feridos, sete dos quais graves, e destruiu meio milhar de casas, 261 das quais habitações permanentes, e 50 empresas.

// Lusa

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1 Comment

  1. Talvez sirva de exemplo a outros que se sentissem tentados a fazer o mesmo! Brincar, desta forma, com uma situação tão grave como a que aconteceu neste concelho, revela uma total irresponsabilidade e falta de ética. Como é que figuras como estas são eleitas, pelo povo, para lhes confiarem o seu destino? É o que pode designar-se mesmo por “meter-se na boca do lobo”!

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