Os bispos que defenderam a criação de uma comissão independente para investigar os abusos sexuais a menores na Igreja são agora, eles próprios, alvo de denúncias.
O cardeal-patriarca de Lisboa, D. Manuel Clemente, e o bispo de Leiria-Fátima, D. José Ornelas, são até agora os únicos bispos acusados publicamente de encobrirem casos de abusos sexuais de menores na Igreja.
É “fogo amigo”, resume um membro da Conferência Episcopal Portuguesa citado pelo Expresso. Suspeita-se que as denúncias tenham vindo do interior da própria Igreja e visem precisamente os bispos que propuseram e defenderam uma investigação aos abusos.
Quando em fevereiro de 2019 o Papa Francisco indicou que fossem criadas, em cada diocese, comissões de apoio e investigação de abusos cometidos, nem todos receberam a notícia de bom grado. Os bispos do Porto, Lamego, Santarém, Guarda e Funchal resistiram à ideia.
O bispo do Porto, Manuel Linda, chegou a comparar isso à criação de uma comissão “para estudar os efeitos do impacto da queda de um meteorito na cidade”. D. Manuel Linda está no centro de duas polémicas recentes.
Primeiro, soube-se que terá responsabilizado uma criança vítima de abusos sexuais por parte de um padre — embora garanta não se recordar do caso. Poucos dias depois, através das redes sociais, afirmou que o amor aos animais é “típico das sociedades decadentes”.
Todos os contactos e relacionamento criam especiais laços de amizade. Mas os laços de sangue entre pais e filhos possuem uma tal força que nada os desfaz. Nunca os substituamos pelo apego a um qualquer animal de estimação, típico das sociedades decadentes. https://t.co/GIocZpoAGj pic.twitter.com/mPCYSTD49U
— Manuel Linda (@BispodoPorto) October 13, 2022
“Não houve propriamente resistência, mas senti que alguns bispos não demonstravam grande vontade de avançar”, disse ao Expresso um dos membros da Conferência Episcopal.
Ornelas, presidente da Conferência Episcopal Portuguesa, está a ser investigado pelo Ministério Público depois de uma denúncia que diz que “protegeu abusadores de menores” em Moçambique e em Portugal.
Dias depois, assumiu que foram abafados casos de abusos sexuais de menores e confessou uma “tristeza muito grande” por ver envolvido o nome de Ximenes Belo.
O bispo está ainda a ser investigado pelo Ministério Público num segundo caso de possível encobrimento de suspeitas de abuso sexual de menores. O caso envolve um padre ligado à Congregação dos Sacerdotes do Sagrado Coração de Jesus.
Até agora, a Comissão Independente para o Estudo dos Abusos de Menores na Igreja (CIEAMI) recebeu 424 testemunhos de abusos sexuais cometidos sobre menores por membros da Igreja Católica portuguesa.
D. José Ornelas disse estar “tranquilo” e que foram tomadas “as medidas adequadas”, mas garante que a Igreja Católica não se conforma com “o que aconteceu”.