Chega e Bloco de Esquerda exigem demissão de Ana Paula Martins, que assumiu “total responsabilidade” pelas consequências dos atrasos no INEM que levaram a 11 mortes. “Já foi longe demais”.
A ministra da Saúde visita esta terça-feira o INEM, seis dias depois das medidas de contingência para minimizar atrasos na resposta à população, um assunto que levou Ana Paula Martins a dar explicações no parlamento.
A ser ouvida na Assembleia da República sobre a proposta de Orçamento do Estado para 2025, a ministra assumiu a responsabilidade pelas consequências dos atrasos no atendimento de chamadas do INEM, comprometendo-se a tomar as medidas necessárias para refundar o instituto.
“Não tenham dúvidas de que, enquanto ministra da Saúde, assumo total responsabilidade pelo que correu menos bem e comprometo-me, em nome do Governo, a executar as medidas necessários para a refundação do INEM”, disse Ana Paula Martins.
A ministra começou a sua intervenção a falar nos últimos acontecimentos no INEM, com os atrasos no atendimento de chamadas provocados pelas greves dos técnicos de emergência pré-hospitalar e da função pública.
A este respeito, assumiu que a reorganização dos serviços de urgência e emergência assume “a maior prioridade” para este Governo e disse estar no parlamento “cara a cara” para “ouvir as propostas, comentários e as motivações” dos deputados para “melhorar o caminho escolhido e determinado pelo programa do Governo”.
“Não fujo. Não minto e não me escondo”, disse Ana Paula Martins.
Depois de se terem verificado pelo menos 10 mortes alegadamente relacionadas com falhas na resposta do INEM, foram abertos vários inquéritos e diversos partidos da oposição pediram diretamente a demissão da ministra da Saúde, enquanto outros desafiaram o primeiro-ministro a avaliar se Ana Paula Martins tem condições para se manter no cargo.
Na resposta, Luís Montenegro considerou que as dificuldades no INEM não se resolvem com a demissão de Ana Paula Martins, alegando que a consequência política a tirar passa por resolver os problemas do instituto.
“Estamos a assistir a um descalabro”
A líder parlamentar do PS, Alexandra Leitão afirmou esta segunda-feira no Porto que “tem havido muita incompetência na gestão da Saúde” e que o Governo falhou no cumprimento das promessas anunciadas na campanha eleitoral.
“Ao nível da saúde temo que estejamos a assistir a um descalabro (…) não há nenhuma medida para parar a perda de profissionais de saúde para o setor privado, designadamente médicos, que era uma das propostas apresentadas pelo PS em sede de conversações com o Governo na fase anterior à entrega do orçamento”, começou por dizer a deputada socialista.
E prosseguiu: “Toram as urgências no verão, muito pior do que alguma vez tinha acontecido noutros verões com governos do PS e é hoje a situação do INEM, que é gravíssima“.
Aludindo ao facto de a ministra ser ouvida terça-feira na Assembleia da República, a líder parlamentar socialista aconselhou a governante que “não vale a pena acenar problemas estruturais que possa haver, porque o que está em causa é a gestão de uma situação de greve de que a ministra foi avisada e não atuou e, sem querer antecipar-me porque há inquéritos a decorrer, mas temos seguramente situações de perda de vida em função disto, sem prejuízo o nexo de causalidade ainda estar por determinar”.
“A responsabilidade sobre o que está a acontecer no INEM recai diretamente sobre a ministra da Saúde e sobre o primeiro-ministro que perante esta situação preferiu contratar uma agência de comunicação, como se o problema fosse de comunicação”, acrescentou.
Mantendo o tom crítico, Alexandra Leitão insistiu que a Saúde está “numa situação de emergência e as medidas que estão a ser tomadas são as erradas“.
A bancada do PS já pediu também para que o presidente do instituto que coordena o Sistema Integrado de Emergência Médica (SIEM), Sérgio Janeiro, seja ouvido na Comissão de Saúde urgentemente, alegando a necessidade de “apurar responsabilidades pelo colapso” do sistema, um requerimento que vai ser votado hoje à tarde.
Montenegro? “Depois não venha queixar-se”
O presidente do Chega, André Ventura, voltou a pedir esta segunda-feira a demissão das ministras da Saúde e da Administração Interna, considerando mais uma vez que são dois “ativos tóxicos” do Governo.
André Ventura advertiu o primeiro-ministro que, se mantiver aquelas governantes no cargo, estará a provocar uma “maior deterioração” da base parlamentar de apoio ao executivo.
“Depois não venha a queixar-se de que perdeu todo o apoio parlamentar e de que já não tem caminho para andar porque são estas atitudes de arrogância, de prepotência e de indiferença face ao sofrimento que estão a causar e que estão a levar a esta destruição do apoio político e parlamentar. Portanto, sim, nós achamos que esses dois governantes são tóxicos e devem sair”, reforçou.
Em relação à ministra da Saúde, Ventura aludiu às alegadas 11 mortes associadas a atrasos no atendimento do INEM.
“Se nem 11 mortos levam uma ministra a ter a noção da fragilização política em que está e a pedir a demissão, então eu já não sei o que é que pode [levá-la a pedir a demissão]”, criticou.
“Já foi longe demais”
O BE defendeu que a situação no INEM e no setor da saúde “já foi longe demais” e insistiu que a ministra se deve demitir por não ter condições políticas para resolver os problemas deste instituto.
“O Governo sabia que a situação no INEM era dramática e escolheu não atuar. Escolheu fazer um braço de ferro com os profissionais do INEM, com os técnicos, quando sabia que o INEM estava a depender do trabalho extraordinário. É uma atitude irresponsável e autoritária por parte da ministra e é por isso que o BE insiste que a ministra se demita, porque não tem condições políticas para resolver os problemas do INEM”, defendeu Fabian Figueiredo, em declarações na Assembleia da República.
O bloquista afirmou que o Governo “podia ter impedido a greve no INEM se tivesse atendido o telefone ao sindicato” e, além de ter “decidido não o fazer”, “mentiu ao país”, acusou.
“Toda a gente sabe, todo o país sabe, que a ministra, o primeiro-ministro, a direção do INEM, sabiam 10 dias antes de a greve começar que ela ia se realizar. O Governo sabia também que o INEM dependia do trabalho extraordinário dos seus profissionais”, criticou.
Acusando o executivo de ter sido “absolutamente irresponsável, negligente e autoritário na condução de todo o processo do INEM desde que tomou posse”, Fabian Figueiredo apelou aos partidos que aprovem a proposta de alteração ao Orçamento do Estado para 2025 do partido “para contratar os técnicos em falta” e “valorizar os salários dos técnicos” deste instituto.
“Segundo a informação disponibilizada pela comunicação social, já faleceram 11 pessoas. Isto foi longe demais. Por isso, que se contratem as pessoas que fazem falta no INEM, que se chegue a acordo de uma vez por todas com os técnicos do INEM, que se consiga valorizar estas profissões para que seja possível preencher todo o quadro do INEM de técnicos, psicólogos, enfermeiros, de todos os que fazem falta, porque estamos a falar do serviço de emergência médica”, alertou.
Na opinião dos bloquistas, Ana Paula Martins “já mostrou, uma vez atrás da outra, no caso do INEM ou na gestão catastrófica das urgências este verão, que se deve ir embora”.
Proposta de ‘task force’
A Associação Nacional dos Técnicos de Emergência Médica (ANTEM) adiantou esta segunda-feira que propôs à ministra da Saúde a criação de uma ‘task force’ para identificar fragilidades e propor medidas concretas para prevenir os constrangimentos nos serviços de emergência.
Num curto comunicado, a associação revelou que propôs a Ana Paula Martins a “criação de uma Task Force, com vista a identificar as fragilidades e propor medidas concretas para obviar aos constrangimentos sentidos nos Serviços Médicos de Emergência atualmente”.
A falta de recursos no INEM, incluindo de técnicos de emergência pré-hospitalar (TEPH), tem sido recorrente nos últimos anos, mas ficou mais evidente em 4 de novembro, quando 47 meios de socorro pararam durante o turno da manhã e 44 durante o turno da tarde, além da demora no atendimento de chamadas no Centro de Orientação de Doentes Urgentes (CODU).
Essa situação deveu-se à paralisação da função pública que se realizou nesse dia, mas também à greve dos TEPH às horas extraordinárias, que foi, entretanto, cancelada depois de uma reunião de emergência na quinta-feira entre o Ministério da Saúde e o sindicato da classe.
Na véspera da suspensão da greve, o conselho diretivo do INEM foi obrigado a implementar várias medidas de contingência para melhorar o funcionamento dos seus CODU, como a criação de um fluxo de triagem para chamadas com tempo de espera superior a três minutos, a integração de enfermeiros nos CODU e a revisão dos procedimentos de passagem de dados às equipas no terreno.
No fim de semana, o instituto garantiu que os tempos médios de atendimento registaram, em média, 20 segundos de espera, como resultado das medidas implementadas na semana anterior
A visita de Ana Paula Martins à sede do Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM), em Lisboa, está agendada para as 15:30 desta terça-feira.
ZAP // Lusa
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