A campanha do Ikea que promove uma estante com o lema “Boa para guardar livros. Ou 75.800 euros” foi um sucesso e levou outras marcas a entrarem na brincadeira, com as suas próprias versões desta ideia que reporta para o caso de corrupção que fez cair António Costa.
O humor político raramente – ou nunca – faz parte das campanhas publicitárias em Portugal, porque “o risco é enorme” devido às “opiniões extremadas”, como analisa o CEO e co-fundador da agência de marketing digital Triber Agency, Pedro Girão, num artigo de opinião na revista Marketeer.
De resto, “política, religião e futebol são temas tabu para quase todas as marcas no nosso país”, como analisa.
O Ikea fez “ouvidos moucos” dessa ideia e arrojou com a sua mais recente campanha, onde usa vários slogans com conotações políticas para promover os seus produtos.
Mas foi o outdoor a “vender” uma estante com a frase “Boa para guardar livros. Ou 75.800 euros” que deu mais que falar por fazer referência ao dinheiro que foi encontrado no gabinete do ex-chefe de gabinete de António Costa no âmbito da “Operação Influencer“, que levou à demissão de António Costa.
O burburinho acabou por ser aproveitado por várias marcas, nomeadamente por Fnac, Staples, Gato Preto, Moviflor e Talhos Casal, entre outras, que entraram no “jogo” com as suas próprias versões.
“No Gato Preto, há um esconderijo melhor”, assegura a marca de mobiliário e decoração, apontando para o interior de um sofá.
“Cabe bem mais [do] que 75.800 euros, mas pode levá-lo por muito menos”, refere a Moviflor na promoção do roupeiro Sirius Black.
“Estantes há muitas, mas nada se compara à riqueza (cultural) das nossas”, salienta por seu turno a Fnac.
“Mas alguém guarda isso na sala, Ikea?”, questiona, por outro lado, a Staples numa imagem com uma estante com material de escritório.
Pedro Girão reforça na Marketeer que foi a Staples que deu início a esta onda de “imitação” ao Ikea.
O especialista em Marketing da Triber Agency que trabalha com a Staples nota que a marca sueca “expôs-se a comentários menos agradáveis de pessoas com ligações partidárias mais fervorosas, mas a verdade é que, em muito pouco tempo, já estava a ser referida nos principais meios de comunicação nacionais”.
Assim, a reacção da Staples pretendeu reforçar o posicionamento da marca como “especialista em escritório” e conseguiu “visibilidade em horário nobre” nos telejornais, sublinha Pedro Girão.
O mesmo aconteceu às outras marcas envolvidas, algumas das quais não são assim tão conhecidas dos portugueses, como é o caso dos Talhos Casal que sugerem que “toda a gente sabe que o dinheiro se guarda no porquinho”.
E até um clube de futebol se juntou à brincadeira.
O Paços de Ferreira destaca o reforço de Inverno Afonso Rodrigues e nota que é “bom para a esquerda e direita” e que “vale mais do que 75.800 euros”. E ainda sugere a quem vir a publicação que “compre móveis em Paços de Ferreira” numa pequena provocação ao Ikea.
“Momento nunca antes visto”
Além das próprias publicações, as marcas foram comentando os posts umas das outras numa corrente que deu ainda mais eco aos seus produtos.
O humorista e apresentador de televisão Fernando Alvim considera que este é “um momento nunca antes visto” na publicidade em Portugal.
É impressão minha ou está a viver-se hoje um momento nunca antes visto? Eis as reacções ao post sobre a campanha do Ikea. pic.twitter.com/RKMwJCvkvK
— Fernando Alvim (@fernandoalvim) January 24, 2024
Mas o que é que fica disto, afinal? Pedro Girão nota que este caso deve servir de “aprendizagem” para os especialistas de marketing, reforçando que um outdoor que exigiu um forte investimento do Ikea acabou por dar palco, e completamente de graça, a outras marcas.
“Quando muitas marcas se juntam para cavalgar uma onda, entretêm, protegem-se (basta ver os ataques que a IKEA já estava a sofrer enquanto esteve sozinha), ganham protagonismo, ganham visibilidade” e “o público reage com atenção e, acima de tudo, com amor” – “e humor”, conclui o especialista de marketing.
Grande ideia da IKEA!!. Muito bom. Muito me ri!
Com as novidades da Madeira têm que arranjar esconderijos muito maiores. As marcas têm que se atualizar!
Liberdade de expressão! Fantástico… Eu já pensava que vivia num país totalmente ditatorial mas ainda há esperança!