Rodrigo Antunes / Lusa

Carlos Moedas
Produção e promoção do livro contou com envolvimento de assessores pagos pela autarquia, utilização de equipamentos públicos e inclusão de fotografias pertencentes ao arquivo da Câmara Municipal de Lisboa.
O presidente da Câmara de Lisboa Carlos Moedas está a ser acusado de usar os meios técnicos e humanos da autarquia na produção e promoção do seu livro de cariz pessoal, denuncia a revista Sábado esta terça-feira.
O livro, “Liderar com as Pessoas”, tem direitos de autor exclusivos ao presidente da Câmara de Lisboa, mas a promoção e produção de conteúdos a si relacionados contou com o envolvimento direto de assessores pagos pela autarquia, utilização de equipamentos públicos e inclusão de fotografias pertencentes ao arquivo da Câmara Municipal de Lisboa (CML).
A investigação da Sábado revela que dois assessores contratados para comunicação institucional — ambos com avenças superiores a 2.800 euros mensais — desempenharam funções relacionadas com a promoção do livro pessoal do autarca. A equipa, composta por vários profissionais de comunicação, produziu vídeos no gabinete do presidente e divulgados em redes pessoais e da editora.
O livro de Moedas foi lançado em Lisboa (Fundação Calouste Gulbenkian), no Porto (com Rui Moreira como anfitrião) e em Braga (com Ricardo Rio). Em todas as ocasiões, a cobertura fotográfica e videográfica contou com equipas municipais ou assessores ligados ao autarca lisboeta.
No caso do Porto, o gabinete de Rui Moreira confirmou que a cobertura foi assegurada pelo Departamento Municipal de Comunicação, como acontece com outros eventos de natureza pública. Situação idêntica ocorreu em Braga, onde a câmara disponibilizou espaço e meios técnicos. Em Lisboa, na Gulbenkian, a produção de imagens esteve a cargo do assessor João Aguiar, segundo testemunhos recolhidos pela Sábado.
Mas o envolvimento da estrutura autárquica não se limitou à equipa de comunicação. António Valle, então chefe de gabinete de Moedas, assumiu ter coordenado o projeto editorial, acompanhando fases de produção e compilando documentos que viriam a integrar a obra.
Além disso, 25 fotografias do espólio da Câmara de Lisboa estão no livro. As imagens foram captadas por fotógrafos contratados pela autarquia, fazem parte do arquivo municipal e, segundo as normas em vigor, apenas podem ser cedidas gratuitamente à comunicação social para fins informativos. Para usos comerciais, como a publicação de um livro com direitos de autor pessoais, seria necessária autorização formal e o pagamento de taxas. João Aguiar e Alberto Frias são dois fotógrafos que serviram o município e que terão visto as suas criações serem usadas para o benefício pessoal de Carlos Moedas, sem autorização formal.
A revista lembra ainda que o próprio Rui Moreira também lançou um livro pessoal enquanto presidente da Câmara Municipal do Porto, mas em bases muito diferentes. O vídeo promocional foi gravado em sua casa, com um telemóvel pessoal, sem apoio técnico da Câmara Municipal do Porto; e o lançamento decorreu na Biblioteca Almeida Garrett, espaço público cedido a pedido da editora e aprovado por unanimidade em reunião de executivo municipal.
O outro lado da moeda
Perante as críticas, o gabinete do presidente da Câmara de Lisboa justificou que o livro foi concebido para prestar contas aos munícipes, enquadrando-se por isso numa prática comum entre autarcas europeus. Argumenta-se ainda que a utilização de fotografias oficiais reflete a atividade do presidente no exercício de funções, sendo parte integrante do balanço do mandato.
No entanto, não responde se houve ou não autorização formal para o uso de imagens do arquivo municipal em benefício de um livro pessoal, se o envolvimento de assessores pagos pela autarquia para a promoção de um projeto comercial configura uso indevido de recursos públicos ou se a linha entre comunicação institucional e autopromoção pessoal foi ultrapassada.