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O verdadeiro risco em tempos de pandemia é manter as escolas fechadas

@SixthTone via Zhejiang Daily / Twitter

Chapéus de um metro garantem distanciamento social numa escola chinesa.

A pandemia de covid-19 levou ao encerramento de escolas por todo o mundo, com o intuito de conter a propagação do novo coronavírus. Mas, na verdade, com o arrastar desse encerramento por causa da infecção, os riscos superam em muito os benefícios. E é o futuro de toda uma geração que está em causa.

Há muitos pais portugueses com receio de terem que enviar os seus filhos para as escolas em Setembro, até dados os alertas dos directores de escolas sobre a quase impossibilidade de garantir o cumprimento das medidas impostas pela Direcção Geral de Saúde, nomeadamente o distanciamento social.

Esse receio pode generalizar-se a outros países. Mas, na verdade, “os benefícios de abrir as escolas ultrapassam os custos”, como analisa a The Economist, realçando os problemas relacionados com a falta de aulas. Isto até porque o vírus implica “um risco baixo para as crianças”, conforme evidencia a publicação.

Há estudos que indicam que os menores de 18 anos têm três vezes menos probabilidades de contrair a infecção, enquanto os menores de 10 anos são 10 vezes menos propensos a tê-la comparativamente com pessoas com idades entre 70 e 79 anos, como cita a The Economist.

Por outro lado, com as escolas fechadas, “as crianças aprendem menos e perdem o hábito de aprender”, sustenta a revista, lembrando que plataformas como o Zoom são espaços demasiado “barulhentos” para funcionarem como salas de aulas.

Além disso, as “crianças mais pobres” têm mais dificuldades de acesso à Internet e, habitualmente, pais menos formados e, portanto, “ficam ainda mais atrás dos seus pares” em melhor situação económica.

9,7 milhões de crianças vão deixar escola por causa da pandemia

É nos países mais pobres que o encerramento das escolas implica danos maiores, até porque, muitas vezes, estes estabelecimentos são os únicos locais que garantem o acesso a vacinação e a comida às crianças.

A organização não governamental (ONG) britânica Save The Children prevê que 9,7 milhões de crianças em todo o mundo deixem a escola por causa da pandemia. Um risco que é sobretudo elevado em países da África Ocidental e Central, mas também no Iémen e no Afeganistão, de acordo com um relatório da ONG.

Os dados da Save The Children indicam que, no pico das quarentenas por causa da covid-19, 1600 milhões de crianças e jovens não puderam ir à escola, o que constitui cerca de 90% de toda a população estudantil do planeta.

O encerramento das escolas representa “muito mais do que a perda da educação”, segundo a ONG que destaca que essa realidade deixa as crianças “sem espaços seguros” para “brincarem, comerem” e terem acesso a “serviços de saúde”. Além disso, torna-se impossível detectar “eventuais abusos [cometidos] em casa” e, logo, disponibilizar “proteção às vítimas”.

A UNESCO também alerta que as crianças ficam sujeitas a “maior exposição à violência e à exploração”.

“Quando as escolas são fechadas, aumenta a ocorrência de casamentos prematuros, mais crianças são recrutadas por milícias, aumenta a exploração sexual de meninas e mulheres jovens, a gravidez na adolescência torna-se mais comum e o trabalho infantil cresce”, destaca a agência especializada da ONU para a Educação, a Ciência e a Cultura.

UNESCO alerta para “altos custos sociais e económicos”

O encerramento de escolas “acarreta altos custos sociais e económicos“, avisa a UNESCO, citando nomeadamente o “aumento das taxas de abandono escolar” e o “isolamento social” dada a perda do “contacto social que é essencial para a aprendizagem e para o desenvolvimento”.

A UNESCO fala ainda da “má nutrição”, considerando que “muitas crianças e muitos jovens dependem das refeições gratuitas ou com desconto que são fornecidas nas escolas”.

“As crianças e os jovens ficam sem oportunidades de crescimento e desenvolvimento”, algo que é especialmente notório nos “estudantes menos privilegiados, que tendem a ter menos oportunidades educacionais além da escola”, aponta também a agência da ONU.

A UNESCO fala ainda das dificuldades dos pais que não têm onde deixar os filhos para voltarem ao trabalho e constata que as mães acabam por assumir o fardo deste problema, o que implica maiores custos a nível das suas carreiras profissionais.

Por outro lado, “os pais que trabalham são mais propensos a faltar ao trabalho para cuidar dos seus filhos quando as escolas são fechadas”. “Isso resulta em perdas salariais e tende a causar impactos negativos na sua produtividade“, destaca a UNESCO.

Além disso, há igualmente maiores riscos de existirem “lacunas no cuidado” dos menores. “Na falta de outras opções, com frequência, os pais que trabalham deixam as crianças sozinhas quando as escolas são fechadas, e isso pode levar a comportamentos de risco, incluindo uma maior influência da pressão dos colegas e o uso de substâncias” psicotrópicas, realça a UNESCO.

A entidade refere-se também aos “desafios para mensurar e validar a aprendizagem”, dado que as avaliações “são comprometidas”, com “sérias preocupações sobre a justiça” das mesmas, e aos “pais despreparados para a educação à distância em casa”.

Numa perspectiva mais economicista, o Banco Mundial estima que cinco meses de encerramento das escolas terão um custo de cerca de 10 triliões de dólares nos rendimentos futuros das crianças afectadas pela pandemia, como cita a The Economist.

As perdas potenciais são, assim, “catastróficas”, constata a revista.

Desta forma, os países precisam de abrir caminho para a reabertura das escolas, logo que os números de covid-19 estejam mais estabilizados.

Alguns dos países que já reabriram as escolas aplicaram regras como a redução do tamanho das turmas, com os alunos a passarem apenas parte da semana nas escolas, o controle dos tempos de recreio e da hora das refeições, o uso de máscaras e a separação e distanciamento entre as carteiras.

Disponibilizar gel sanitário para alunos e funcionários, bem como garantir a higienização suplementar dos espaços são outras medidas inevitáveis.

O investimento terá que ser elevado para garantir uma reabertura segura das escolas, mas, no final de contas, o preço a pagar pelo encerramento pode ser o futuro de toda uma geração.

ZAP //

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