A ministra da Justiça, Francisca Van Dunem, disse esta quinta-feira que o processo Operação Marquês representa “uma situação profundamente traumática” para o país e admitiu a extinção do Tribunal Central de Instrução Criminal.
Em entrevista à TVI24 na noite desta quinta-feira, a ministra da Justiça, Francisca Van Dunem, confessou que o rumo da Operação Marquês representa “uma situação profundamente traumática” para o país, mas recusou fazer leituras sobre o facto de o juiz Ivo Rosa ter rejeitado praticamente toda a acusação do Ministério Público (MP).
“É importante que tenhamos um Ministério Público forte, capaz de acusar quando entende que é para acusar, independentemente de quem tem na frente. E é importante que tenhamos juízes independentes, capazes de tomar as decisões mais díspares, por muito difíceis de sustentar socialmente que elas sejam”, disse a ministra.
Van Dunem salientou ainda que é fundamental que o MP tenha autonomia para assumir decisões e que o juiz tenha independência para as contrariar.
“O MP acusa por homicídio e o juiz considera que são ofensas corporais”, exemplificou a ministra, admitindo que “este caso é rodeado por uma comoção nacional e faz com que esse tipo de análise seja mais marcada”.
“Percebo que, para qualquer país, esta é uma situação profundamente traumática”.
Confrontada com a proposta do presidente do Supremo Tribunal de Justiça, que defende a extinção do Tribunal Central de Instrução Criminal, Van Dunem reconheceu que uma análise daquele organismo “é uma hipótese que o Governo pondera”.
“Não excluo uma intervenção nas eventuais condições em que esse tribunal opera”, rematou.
Estratégia Nacional Contra a Corrupção
Questionada sobre o fim dos megaprocessos, medida inscrita na Estratégia Nacional Contra a Corrupção, Van Dunem disse que os megaprocessos, muito mediatizados, correm o risco de criar expectativas impossíveis de cumprir na sociedade civil.
“A mediatização da justiça gera nas pessoas expectativas erróneas a respeito do fim do processo”, disse a governante. “Os processos têm métodos e critérios específicos de avaliação da prova que não são os critérios de avaliação comum. Corremos o risco de se criarem grandes expectativas que na prática acabam por ser goradas.”
A ministra sublinhou que estes processos “custam muito dinheiro ao erário público”.
Van Dunem reconheceu ainda a “lentidão” da justiça portuguesa, classificando-a como “esmagadoramente agressiva” e “insuportável” para a sociedade. “Há coisas que não são aceitáveis”, assinalou.
Sobre a Operação Marquês, a ministra admitiu que não ser “socialmente sustentável que um processo demore sete anos, venha a demorar mais dois anos em recurso e a seguir em julgamento. É por isso que estamos à procura de remédios”.
Em relação à proteção dada a denunciantes em casos de corrupção, Van Dunem destacou que a nova estratégia permite romper “os pactos de silêncio” da corrupção “sem pôr em causa outros valores“.
Questionada sobre se esta proteção abrangeria o hacker Rui Pinto, Van Dunem esclareceu que não. “Esta diretiva refere-se a pessoas que trabalhem em organizações. Alguém ligado a uma organização que, por virtude da sua atividade, tem conhecimento de factos que podem constituir crime”.
Por suas vez, Van Dunem lembrou que pessoas como Rui Pinto têm “canais de denúncia públicos”, incluindo a página da PGR, que permite a denúncia anónima de crimes de corrupção.
Em relação ao caso do procurador europeu José Guerra, nomeado após um currículo com erros ter sido enviado para as instituições europeias, a ministra considerou que “as explicações que foram dadas foram suficientes” e elogiou o trabalho de José Guerra, que é “muito apreciado no seio do conselho”.