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“Qual é o medo?” Partidos descontentes com parecer de lei-travão

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Mário Cruz / Lusa

O Bloco de Esquerda recusa abdicar de apresentar propostas de alteração ao Orçamento Suplementar e o PSD vai esperar pela discussão em sede de Comissão de Orçamento e em plenário para decidir se apresenta propostas de alteração ao documento do Governo. 

Mariana Mortágua, deputada do Bloco de Esquerda, considera que um Orçamento Suplementar não tem “a amplitude de um Orçamento do Estado regular” e compreende “perfeitamente que o âmbito de alteração e a amplitude do Orçamento é diferente de um processo orçamental que se inicia”.

“Mas também não podemos desistir ou abdicar da responsabilidade que o Parlamento tem de fazer propostas de alteração. É o Orçamento que irá encontrar o equilíbrio entre receitas e despesas e a forma como essas receitas e despesas podem ser encontradas e distribuídas”, assegurou.

Desta forma, deixou claro que os bloquistas não vão “abdicar destes poderes”, advertindo que “seria inédito se a Assembleia da República não pudesse fazer um processo de especialidade de um Orçamento Suplementar”. “O último Orçamento Retificativo que aconteceu foi em 2013 e nenhum partido se coibiu de fazer propostas de alteração a esse Orçamento Retificativo.”

Mortágua fez questão de se referir particularmente ao PS, que nesse Orçamento Retificativo de 2013 “apresentou a descida do IVA da restauração, apresentou alterações à lei dos compromissos e uma medida sobre rendas da energia”.

“O que se exige é que se aplique neste processo a mesmas regras que se aplicou no passado e que a Assembleia da República, dentro do bom senso e da compreensão que um Orçamento Retificativo tem uma natureza diferente de um orçamento regular, mas que possa desempenhar o seu papel de proposta”, defendeu.

Já o PSD considerou pouco democrática a intenção de alterar uma prática parlamentar, que sempre passou pela apresentação de propostas de alteração a textos orçamentais.

Em declarações à Lusa, o vice-presidente da bancada do PSD Afonso Oliveira afirmou que o partido “não pode concordar” com um parecer “exterior ao Parlamento” e que invoca um acórdão do Tribunal Constitucional de 1986 para dizer aos partidos que “não poderão apresentar propostas de alteração no âmbito da discussão do orçamento suplementar ou retificativo”.

Há aqui algo de muito estranho, ao longo dos anos sempre foi possível apresentar propostas de alteração, o próprio PS apresentou inúmeras propostas no período dos governos PSD/CDS”, disse. “O que está em causa é o princípio.”

Estas preocupações são pouco democráticas (…) Qual é o medo? Acho incompreensível que haja algum medo na forma como o debate possa ocorrer, sobretudo porque toda a discussão à volta da resposta à pandemia tem obtido grandes consensos”, salientou.

Questionado se o PSD mantém a intenção de apresentar propostas de alteração ao documento, o deputado social-democrata disse que o partido irá aguardar pela discussão na quarta-feira, em sede de Comissão de Orçamento e à tarde em plenário (na discussão na generalidade), do enquadramento deste parecer.

“É no processo parlamentar, na discussão, que se determina a forma como orçamento suplementar ou retificativo sai doParlamento”, acrescentou.

PCP avisa que AR “não pode ficar limitada”

Esta segunda-feira, o PCP avisou que a Assembleia da República “não pode ficar” limitada” na sua intervenção no Orçamento Suplementar e garantiu que vai fazer propostas de alteração, apesar do parecer do Governo quanto à “lei travão”.

“Nos termos da Constituição, a Assembleia da República não pode ficar limitada na sua capacidade de intervenção no processo orçamental”, afirmou, em comunicado através de vídeo, o deputado comunista Duarte Alves, num comentário ao parecer sobre a “lei travão” que conclui ser “questão assente na doutrina” os deputados não poderem apresentar iniciativas que desequilibrem receitas e despesa do Estado na discussão de orçamento suplementar.

O deputado prometeu que o PCP vai intervir “com as suas propostas para a valorização e salvaguarda dos rendimentos dos trabalhadores, para a melhoria de prestações sociais, para o apoio a micro, pequenas e médias empresas e a aposta na produção nacional, para o reforço do SNS e dos serviços públicos”.

“São esses eixos fundamentais para a resposta que é preciso dar aos problemas do país e que devem ter expressão no orçamento suplementar. E o PCP não deixará de intervir com as suas propostas nesse debate”, concluiu.

CDS recusa “regra”

O CDS-PP rejeitou “uma regra” que dite que “o Governo tem todos os poderes e o Parlamento não tem nenhum poder” e lembrou que o PS “já votou favoravelmente” iniciativas que “aumentavam a despesa do Estado”.

“Não é possível é nós estarmos a criar aqui um conflito institucional e, sobretudo, criar aqui uma regra de que o Governo tem todos os poderes e o Parlamento não tem nenhum poder. Isso é uma coisa que não faz nenhum sentido”, afirmou a deputada Cecília Meireles em declarações à Lusa.

Na ótica do CDS, “tudo o que o país não precisa agora é de conflitos institucionais entre o parlamento e o Governo”, pelo que o partido defende que “o Governo não se pode comportar como se tivesse uma maioria absoluta no Parlamento”.

“Talvez se o Governo estivesse mais concentrado em encontrar soluções ao invés de estar contrariado de cada vez que vê algum obstáculo, se calhar tinha mais muito apoio parlamentar e conseguia chegar a soluções concretas”, salientou a deputada.

Cecília Meireles recordou que “o PS já votou favoravelmente nesta legislatura projetos de lei que aumentavam a despesa do Estado e o Governo nunca viu nisso nenhum problema”.

“Nós não podemos é ter um Parlamento que, quando o PS é favorável, não vê nenhum problema com as decisões do Parlamento, quando o PS é contra, o Governo já vê muitos problemas com as decisões do Parlamento”, apontou.

PAN diz que parecer sobre lei travão é intromissão

O PAN considerou que o parecer do Governo quanto à “lei travão” é “uma intromissão nas competências do Parlamento” e uma “forma de condicionar” o debate e as propostas em torno do Orçamento Suplementar.

“Trata-se do nosso ponto de vista de uma intromissão nas competências do parlamento e uma forma de condicionar o debate das opções e das respostas orçamentais, o que denota, antes de mais, uma falta de respeito pelos deputados eleitos e partidos representados na Assembleia da República”, refere o porta-voz do PAN.

Numa nota enviada à comunicação social, André Silva considera que, “com esta tentativa de condicionamento das competências do parlamento, o Governo demonstra um desejo de conflitualidade política”, o que é “tudo aquilo” de que o país não precisa “neste momento difícil”.

Indicando que “as matérias de constitucionalidade ou falta dela não são avaliadas pelo Governo, mas sim pelo Tribunal Constitucional”, o PAN indica que “preferia que o Governo, ao invés de estar a apostar em monopolizar e capitalizar politicamente as medidas de resposta à crise económica e social originadas pela covid-19, pudesse estar concentrado e empenhado em dialogar para encontrar as melhores soluções para o país”.

ZAP // Lusa

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