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É mais “um conjunto de meias medidas”. Governo criticado por manter escolas e universidades abertas

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Rodrigo Antunes / Lusa

As novas medidas tomadas pelo Conselho de Ministros para controlar a pandemia de covid-19 entraram esta sexta-feira em vigor. No entanto, as exceções decididas pelo Governo relativamente ao novo confinamento têm sido alvo de duras críticas.

O novo confinamento teve hoje início e irá permanecer em vigor até às 23h59 do dia 30 de janeiro, altura em que as medidas serão reavaliadas. Mas António Costa assumiu que o mais provável é que estejam em vigor durante um mês.

Neste novo confinamento, o Governo decidiu, no entanto, manter as escolas a funcionar em todos os graus de ensino, o que tem sido alvo de duras críticas. O CDS-PP afirmou que a decisão do líder do Executivo pode “comprometer todos os esforços” e o PSD considera a “situação das escolas” mais um “conjunto de meias medidas”.

O epidemiologista Manuel do Carmo Gomes disse ainda que, com uma lista de exceções tão comprida, o país vai levar “muito mais tempo a achatar a curva”.

Já o ex-ministro da Educação, Marçal Grilo, pensa que manter as escolas abertas na atual fase da pandemia é uma “medida arriscada” e defendeu que os professores devem ser priorizados na vacinação.

CDS critica Governo por manter todas as escolas abertas

O presidente do CDS-PP, Francisco Rodrigues dos Santos, comentou as novas medidas de combate à pandemia num curto vídeo de 40 segundos, enviado à comunicação social, no qual criticou a decisão do Governo de manter todas as escolas abertas.

O líder do partido mostrou-se preocupado com “as meias tintas do Governo” e avisou que “a quantidade de exceções” às medidas decretadas pelo Conselho de Ministros pode atrasar o combate à pandemia e “comprometer todos os esforços” que serão feitos.

Uma vez que o Governo decidiu “manter aberto o ensino presencial acima do 7.º ano, apesar do aumento dos contágios até aos 19 anos” e “contrariamente à posição do CDS“, o dirigente propôs que se “teste massivamente nas escolas”.

Francisco Rodrigues dos Santos sublinhou também que o Governo “não pode atrasar-se e apenas dar apoios de tostões a prejuízos de milhões” da economia.

O líder centrista exigiu também ao executivo que “não sejam adiadas as cirurgias ao cancro” e que seja criada “uma via verde saúde com o setor social e particular para tratar doentes”, por forma a “salvar vidas e controlar a pandemia”.

O presidente do CDS-PP reitera ainda que os mais idosos devem ser incluídos na primeira fase da vacinação contra a covid-19.

Na quarta-feira, a ministra da Saúde enviou um despacho aos hospitais para suspender a atividade não urgente e proceder ao adiamento da atividade cirúrgica programada de prioridade normal ou prioritária desde que não implique risco para o doente.

Momentos depois, foi esclarecido pelo Ministério da Saúde que não será suspensa a cirurgia urgente ou muito prioritária, e que o despacho não se aplica a hospitais como o Instituto Português de Oncologia

PSD critica manutenção de aulas presenciais

O deputado do PSD Ricardo Baptista Leite criticou as “meias medidas” anunciadas pelo Governo para combater a pandemia, considerando que a manutenção dos estabelecimentos de ensino abertos durante um confinamento generalizado é contraproducente.

“A razão pela qual estamos nesta situação, depois de quatro meses sucessivos de meias medidas, de medidas restritivas parciais no território nacional, resulta, primeiramente e principalmente, pela falta de preparação do outono e inverno“, considerou o deputado social-democrata Ricardo Baptista Leite, em declarações aos jornalistas no parlamento.

O confinamento generalizado da população “é uma bomba atómica que se usa quando se desconhece o que é que se pode fazer de uma forma dirigida”, prosseguiu, considerando que se está a verificar, “mais uma vez, um conjunto de meias medidas, particularmente” no que diz respeito à “situação nas escolas”.

Ricardo Baptista Leite recordou que as últimas informações disponibilizadas pelas autoridades sanitárias, ao longo das últimas três semanas, apontam para um aumento no número de infeções pelo SARS-CoV-2 entre os 10 e os 19 anos, e os 20 e os 29 anos.

Por isso, os sociais-democratas esperavam que, “no mínimo dos mínimos”, o executivo liderado pelo socialista António Costa tivesse encerrado os estabelecimentos de ensino “a partir do sétimo ano de escolaridade”.

“É a diferença entre conseguirmos conter esta pandemia em três, quatro semanas, ou podermos ver um arrastar de mais e mais medidas ao longo de semanas sucessivas, seis, oito semanas, o que tem consequências absolutamente devastadoras”, completou.

A manutenção das aulas presenciais em todos os graus de ensino é “contraproducente”, na mesma altura em que “se pede à economia para travar a fundo”, considerou.

Ricardo Baptista Leite defendeu que era preferível encerrar os estabelecimentos de ensino até 30 de janeiro e reavaliar o impacto desta decisão, ao nível da contenção dos contágios, daqui a duas semanas.

O social-democrata disse também que ainda não houve “da parte do Governo o reconhecimento de que o caminho trilhado até agora é o errado” e que não há garantias sobre o “que é que vai mudar a seguir”.

O Governo tem de “mudar radicalmente de estratégia” de modo a garantir que não vai haver um aumento substancial do número de infeções que obriguem a outro confinamento “por volta da Páscoa”, considerou.

Ainda assim, justificou, o PSD uniu-se ao PS para, mais uma vez, aprovar a renovação do estado de emergência porque “Portugal está, literalmente, entre a espada e precipício”.

“Se não fosse o PSD, se dependesse dos parceiros habituais do Governo [BE, PCP e PEV] estaríamos numa situação sem estado de emergência, o que impediria todas as medidas. Isso colocaria o país numa situação de sermos lançados pelo precipício abaixo”, completou.

Escolas abertas é “medida arriscada”, diz Marçal Grilo

Já o antigo ministro da Educação, Eduardo Marçal Grilo, considera uma “medida arriscada” manter as escolas abertas na atual fase da pandemia e defendeu que os professores devem ser priorizados na vacinação.

Para Marçal Grilo, que foi o orador numa videoconferência promovida pela Federação Nacional da Educação, “a medida de deixar as escolas abertas é arriscada”, atendendo ao estado da pandemia, que considerou “um pouco descontrolada”, pelo que deverá ser feito “um acompanhamento, uma avaliação” da medida e “correção se for caso disso”.

Secundando os sindicatos, o antigo ministro da Educação advogou que os professores deviam ser priorizados na vacinação contra a covid-19, uma vez que, em seu entender, são profissionais de “serviços essenciais”.

“Lista de exceções é extremamente longa”

O epidemiologista Manuel do Carmo Gomes defendeu também nesta quinta-feira que a situação epidémica “é tão séria” que devia imperar o princípio da precaução, usando-se “todas as armas” para a travar o mais rápido possível, nomeadamente o ensino à distância.

“A lista de exceções é extremamente longa”, disse à Lusa o investigador da Faculdade de Ciências de Lisboa, considerando que, com estas medidas, o país vai levar “muito mais tempo a achatar a curva”.

Na reunião no Infarmed, que juntou na terça-feira investigadores e políticos, Manuel do Carmo Gomes alertou, com base em projeções, para o agravamento da situação epidemiológica, afirmando que dificilmente se evitará os 154 óbitos por dia de covid-19 dentro de duas semanas, número entretanto já atingido, e 14 mil casos diários.

“A minha opinião foi manifestada no Infarmed, penso que claramente, mas se calhar não fui suficientemente claro, e acho que devia imperar o princípio da precaução e usarmos todas as armas que temos neste momento para travar isto o mais depressa possível”, sublinhou.

Referindo-se particularmente às universidades, o epidemiologista disse ter “alguma dificuldade em compreender” porque é que “não se pode numa situação destas, que é tão séria, colocar parte do ensino, pelo menos, à distância, evitando a movimentação de uma série de jovens”.

“Mesmo que admitamos que dentro das salas de aulas não há contágio – enfim é discutível porque eu não acredito que a biologia do vírus mude dessa maneira – eu vejo frequentemente que os jovens socializam muito e vejo-os à porta da minha faculdade a formar grupos de convívio que seria completamente indesejável numa situação destas”, sublinhou.

Por isso, disse entender “mal estas exceções” e estar “preocupadíssimo”.

“Agora vamos ter duas semanas para ver qual é o impacto que isto tem. Se o meu pessimismo se confirmar, espero estar errado e que outros colegas tenham razão, veremos se temos de reajustar isto de outra maneira, só que no meu entender estamos a perder tempo”, avisou.

Regime presencial deve ser “a exceção e não a regra”

A Federação Académica do Porto (FAP) concordou, defendendo que o regime presencial no ensino superior “devia ser a exceção e não a regra”, discordando da decisão de manter todas as escolas abertas, apesar do confinamento.

“Face ao anúncio das novas medidas de combate à pandemia de covid-19 para todo o país, a Federação Académica do Porto considera que o regime presencial nas instituições de ensino superior devia ser a exceção e não a regra”, refere a FAP, em comunicado.
Ana Gabriela Cabilhas, presidente da FAP, disse, em declarações ao jornal Público, que há momentos em que a avaliação “pode ser presencial”, por exemplo no que toca a exames laboratoriais, mas considera que “tem de haver abertura para adaptação para os modelos online” e que “já houve tempo para esta adaptação”.

Com o surgimento do novo estado de emergência e do novo confinamento, a FAP diz ainda que a prioridade é “garantir e salvaguardar a saúde dos estudantes e das suas famílias”, mas ressalva que é “também necessário que ninguém saia prejudicado no seu percurso académico”.

“As instituições de ensino superior devem garantir as devidas condições para realizar avaliações em segurança, o que poderá passar por momentos de avaliação presenciais, mas que deverão ser excecionais. Face ao esforço e à aprendizagem das instituições em 2020, as atividades de avaliação que se encontram em curso deviam ser adaptadas para meios online, contribuindo, desta forma, para o esforço conjunto que o país terá de fazer neste momento difícil”, lê-se no comunicado.

A FAP lembra que o ensino superior “tem um número elevado de estudantes deslocados”, colocando-os “na rua e em transportes públicos, numa altura em que os números de casos de infeção e mortes têm atingido recordes”, a que acresce ainda “o facto de que 51% das infeções ocorrem em pessoas entre os 20 e os 49 anos”.

“É importante continuar a desenvolver mecanismos de inovação pedagógica, que permitam superar esta pandemia com sucesso e continuar a apostar na melhoria contínua do ensino superior”, defende.

Sofia Teixeira Santos, ZAP // Lusa

5 Comments

    • O governo tentará encobrir um possível resultado negativo sobre o Covid-19 nas escolas. Para os esperançosos, o melhor é uma cadeirinha confortável para as sessões de espera.
      Estabelecimentos de ensino são irrelevantes para o governo… é para infetar e matar toda a gente! 😉

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