Passados quase cinco anos da detenção de José Sócrates, a fase de instrução do processo Operação Marquês vai arrancar esta segunda-feira no Tribunal Central de Instrução Criminal, em Lisboa, sob a direção do juiz Ivo Rosa.
O processo – que tem mais 53 mil páginas de papel – envolve vários ex-governantes. A investigação da Operação Marquês envolveu mais de duas centenas de buscas, foram ouvidas mais de duas centenas de testemunhas e recolhidos dados bancários sobre 500 contas, em Portugal e no estrangeiro. Foram ainda autorizadas e transcritas 2.600 escutas e enviadas nove cartas rogatórias para vários países, entre eles Suíça e Angola.
A fase processual facultativa que se inicia esta segunda-feira funciona como um mecanismo de controlo jurisdicional da acusação do MP e termina com a decisão do juiz de levar ou não a julgamento os arguidos, de acordo com o Expresso.
A instrução foi requerida por 19 arguidos, entre os quais o ex-primeiro-ministro José Sócrates, o ex-ministro Armando Vara, os ex-administradores da PT Henrique Granadeiro e Zeinal Bava e o empresário Carlos Santos Silva.
José Sócrates, acusado de 31 crimes, pede que o processo seja encerrado sustentando de forma genérica que “não cometeu qualquer crime”. Mas opta por não discutir, em concreto, qualquer um dos factos que lhe são imputados.
Por sorteio eletrónico, calhou ao juiz Ivo Rosa dirigir esta fase processual. Ivo Rosa já marcou diligências até maio, sempre nas tardes dos últimos três dias de cada mês, prevendo-se que a decisão final seja conhecida perto do final do ano, dado o número de diligências e o número de testemunhas e de arguidos que querem depor.
Esta segunda-feira a primeira arguida a falar é Bárbara Vara, filha de Armando Vara, que está acusada de branqueamento de capitais. José Sócrates, que esteve preso preventivamente e em prisão domiciliária e está acusado de 31 crimes económico-financeiros, pediu para depor nesta fase processual.
Entre os 28 arguidos estão Carlos Santos Silva, Henrique Granadeiro, Zeinal Bava, Armando Vara, Joaquim Barroca, Helder Bataglia, Rui Mão de Ferro e Gonçalo Ferreira, empresas do grupo Lena e a sociedade Vale do Lobo Resorts Turísticos de Luxo.
Segundo o Jornal de Notícias, a estratégia de defesa passará por levantar questões e nulidades com o objetivo de tornar inválida parte ou mesmo a totalidade do processo.
Outro dos temas será também a forma como as provas foram recolhidas. Os advogados de Carlos Santos Silva já afirmaram no passado que muitas das evidências foram recolhidas à margem da lei, sem controlo judicial.
“O arguido descobriu pela consulta dos autos ter sido investigado durante mais de uma década em processos administrativos que devassaram por completo a sua vida pessoal, societária e financeira, fazendo tábua rasa das exigências legais prescritas no Código de Processo Penal para a derrogação do sigilo fiscal e bancário”, afirma a defesa.
Os advogados de Santos Silva insistem que o inquérito devia ter sido aberto em março de 2012, quando havia notícia de um crime.
Crítico da atuação do MP é o antigo líder da Portugal Telecom, Henrique Granadeiro, que se queixa de ter sido confrontado, em fevereiro de 2017, com informação bancária da Suíça que só chegou ao processo meses mais tarde e diz não compreender como é que esses dados chegaram ao conhecimento dos investigadores.
Granadeiro diz que o MP violou as condições impostas pelas autoridades suíças para enviarem as informações e, por isso, os dados constituem um meio proibido de prova, logo são inválidos.
Já a defesa do fundador do Grupo Lena, Joaquim Barroca, opta por analisar se os factos descritos na acusação preenchem os requisitos dos crimes imputados. Está acusado por um crime de corrupção de titular de cargo político, que envolve José Sócrates, por este alegadamente ter favorecido o Grupo Lena através de diplomacia económica junto de líderes estrangeiros sobre quem tinha influência.
Mas os advogados do empresário notam que “as decisões tomadas em países estrangeiros, relativas a negócios contratados por esses mesmos países, extravasam o conteúdo funcional do cargo de primeiro-ministro de Portugal”, não constituindo, por isso, o crime imputado a Barroca.