O ex-diretor da PJ Militar disse, esta quinta-feira, ter-se sentido “desconsiderado” com a decisão da ex-PGR de afastá-lo da investigação do furto de armamento de Tancos e rejeitou o envolvimento de uma organização terrorista neste caso.
“Fiquei perplexo e desconsiderado com a decisão [da PGR] e por não me ter deixado argumentar”, respondeu o coronel Luís Vieira ao juiz-presidente do julgamento do processo de Tancos sobre o telefonema feito pela antiga PGR, Joana Marques Vidal, a informá-lo que a investigação ao furto passaria a ser da responsabilidade da PJ.
O ex-diretor da PJM não se coibiu durante o interrogatório de afirmar ao tribunal que se sentiu desconsiderado com o telefonema da ex-PGR, dizendo que esta “não disse que a Polícia Judiciária Militar passaria a dar colaboração institucional”.
“A senhora procuradora não me disse que a PJM permanecia em colaboração institucional, nunca falou em colaboração e não me deu pretexto nenhum para falar”, referiu.
Após essa decisão, acrescentou, a sua preocupação era informar o então ministro da Defesa, Azeredo Lopes, o que fez na rua junto da casa do governante, contando que este lhe disse para aparecer em Tancos na visita que o Presidente da República iria realizar, a 4 de julho de 2017, mas afirmou que não pediu que o governante intercedesse para reverter a decisão da PGR.
“Disse ao ministro que a PJM já não tinha a investigação e que não concordava com a decisão da PGR. A minha obrigação como dirigente era informar o ministro, mas não lhe pedi para interceder”, afirmou o arguido, negando vários encontros entre ambos imputados pela acusação.
Luís Vieira, que muitas vezes respondeu ao juiz que não se lembrava de vários pormenores, afirmou também que não comunicou ao ex-ministro da Defesa a existência de um informador, dando a entender que não tinha conhecimento de muitos pormenores sobre a investigação, sendo esta da responsabilidade do coronel Estalagem.
Versões opostas sobre o que se disse ao ex-ministro
Luís Vieira afirmou ainda que não contou ao então ministro da Defesa sobre realização de uma chamada anónima, por um elemento daquela polícia, após a descoberta do armamento furtado na Chamusca.
Este depoimento contraria as afirmações do ex-investigador da PJM, o major Vasco Brazão, que disse que o ministro foi informado por telefone da referida chamada e que, inclusivamente, frisou que esta tinha de ser explicada.
“Só soube da chamada anónima uns dias depois pelo coronel Estalagem”, afirmou Luis Vieira, acrescentando que também não viu o chefe de gabinete de Azeredo Lopes a fotografar o memorando sobre o caso, que não participou na sua elaboração e que não informou o ministro sobre a existência de um informador.
Questionado pelo juiz sobre o motivo de não ter comunicado a descoberta do material ao Ministério Público, Luís Vieira afirmou: “Porque não tinha a certeza que era o material furtado, só soube isso pelas 10 da manhã”, adiantando depois que essa comunicação era da responsabilidade do diretor da investigação criminal da PJM, coronel Estalagem.
Esta atitude provocou alguma perplexidade ao juiz que lembrou ao arguido que tinha “falado com seca e Meca” menos com o Ministério Público e que era um diretor de uma polícia.
“Na minha cabeça estavam apenas dois desejos. Reverter o despacho da PGR e recuperar o material de guerra”, disse o arguido, desvalorizando a comunicação da recuperação das armas ao MP e insistindo na necessidade de retirar rapidamente o armamento do local devido ao perigo que este representava.
Sobre o material furtado, o militar referiu que este “era muito, muito perigoso e altamente sensível”, mas que tinha “a certeza que quem o levou não sabia o que estava a levar”.
Contudo, sustentou, “uma organização terrorista não fazia uma operação destas”, insistindo que desde que teve conhecimento do furto aos paióis “havia qualquer coisa que não jogava bem”.
Antes do interrogatório de Luis Vieira, o tribunal voltou a ouvir o major Vasco Brazão, que depois de responder a vários advogados se recusou a responder a perguntas do defensor do autor confesso do furto, João Paulino, quando foi confrontado com contradições em relação ao primeiro interrogatório judicial.
A determinada altura, o militar desabafou: “Se formos palavra a palavra, então eu menti do princípio ao fim”, justificando que, quando foi presente ao juiz de instrução criminal, tinha estado uma semana sem dormir e regressado de uma missão na República Centro Africana.
O magistrado lembrou o arguido que todas as suas declarações iriam ser utilizadas na ponderação da sentença.
“O senhor disse coisas muito diversas no interrogatório e depois aqui, tem noção disso?”, questionou o juiz-presidente, com o próprio Brazão a assumir as contradições.
ZAP // Lusa
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