Constança Bradell, a jovem de 24 anos que sofre de Fibrose Quística, já reuniu quase 200 mil euros, mas associação lembra que o Kaftrio é só de dispensa hospitalar.
Depois do apelo emocionado nas redes sociais, Constança Bradell conseguiu angariar, em dois dias, mais de 200 mil euros, na sequência de uma campanha de angariação de fundos, lançada por familiares e amigos para comprar o Kaftrio, um medicamento inovador para o tratamento da fibrose quística que ainda não é comercializado em Portugal.
Citada pelo Jornal de Notícias, a Associação Portuguesa de Fibrose Quística admite que a iniciativa pode ajudar a desbloquear o processo, mas alerta para o facto de o medicamento ser de dispensa hospitalar.
O fármaco está apenas disponível de forma restrita, através de um Programa de Acesso Precoce (PAP) que, sob indicação hospitalar e aprovação pelo Infarmed, o concede gratuitamente, numa primeira fase, a 10 doentes graves.
Ao diário, Herculano Rocha, presidente da Associação Portuguesa de Fibrose Quística, critica “a burocracia” que está a encravar o processo no caso de Constança Bradell e lembra que o Kaftrio é apenas produzido pelo laboratório Vertex.
O medicamento “é só de administração hospitalar“, pelo que é necessária prescrição médica para a sua aquisição.
“Com a campanha podem ter acesso ao medicamento teoricamente. Na prática nunca ninguém fez isso. Aconteceu com o caso da Matilde, mas foi mais uma pressão para o Infarmed que acabou por conceder a medicação”, disse, referindo-se ao caso da menina que sofre de Atrofia Muscular Espinhal tipo I.
“Espero que, se eventualmente o Infarmed decidir, amanhã ou dentro de uma semana, fazer uma PAP para a Constança – e ela tenha o medicamento gratuitamente -, o dinheiro seja devolvido às pessoas que o deram. Senão começamos a desacreditar isto”, disse.
Ao que o JN apurou, a doente compromete-se a entregar a verba à Associação Nacional de Fibrose Quística, caso tenha acesso ao medicamento de forma gratuita.
Em 2019, os pais de Matilde, uma menina que nasceu com Atrofia Muscular Espinhal tipo I, pediram ajuda para a compra do Zolgensma e conseguiram reunir 2,5 milhões de euros. Alcançado o objetivo, o Estado viria depois a comparticipar na totalidade a despesa associada ao fármaco – não só para Matilde mas também para outras crianças.
Os pais comprometeram-se a usar a verba para ajudar a pagar terapias e equipamentos para outros meninos doentes, mas houve doadores que quiseram reaver o dinheiro.
Caso chega à política
Durante a sessão de encerramento do XXIV Congresso Nacional da Juventude Popular, Francisco Rodrigues dos Santos aproveitou para falar do caso de Constança Bradell.
“Eu quero dizer à Constança, que já entregou uma petição pública no Parlamento para que o processo de autorização da comercialização avance, de que da parte do CDS exigimos ao Infarmed e à ministra da Saúde que garantam o acesso imediato ao medicamento, comparticipado, porque não há nada que justifique esta demora inaceitável e que se apresente como barreira a este processo a falta de dinheiro”, afirmou.
O presidente do CDS-PP aproveitou este tema para acusar o Governo socialista de, no exercício da Presidência da União Europeia, esbanjar “milhões e milhões de euros em ajustes diretos para os amigos e para as suas negociatas”.
“Não se aceita que falte um cêntimo que seja para apoiar portugueses que precisam de qualidade de vida e acesso a medicamentos para poderem ter esperança e dignidade na sua doença”, criticou.
Para Francisco Rodrigues dos Santos, “a burocracia não pode estar à frente da vida dos portugueses”. “Esse medicamento já está aprovado pela Agência Europeia do Medicamento, mas a sua venda em Portugal ainda não é possível”, lamentou.
Segundo o democrata-cristão, há 400 portugueses com a mesma doença rara, doentes esses que “se tivessem acesso ao medicamento teriam hoje um horizonte de esperança e de qualidade de vida muito maior”.
No sábado, o PAN defendeu que o Governo deve rapidamente proceder a todas as diligências para que as terapias inovadoras, que aguardam aprovação pelas entidades competentes, sejam disponibilizadas aos doentes de fibrose quística que delas necessitem.
O PS já avançou com um projeto de resolução no Parlamento apelando ao Governo socialista para acelerar o processo de aprovação de um medicamento para a fibrose quística (fq) pela da Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde (Infarmed).
Também o PSD avançou com um requerimento para ouvir no Parlamento várias entidades ligadas à fibrose quística e o Infarmed, de forma a esclarecer “dúvidas” sobre a não autorização em Portugal de novos fármacos para esta doença.
Liliana Malainho, ZAP // Lusa