Afinal não há uma espécie de girafa, mas quatro. Três delas estão em sarilhos

Michael Brown

A União Internacional para a Conservação da Natureza reconheceu a existência de quatro espécies diferentes de girafas, numa reclassificação histórica deste mamífero terrestre, o mais alto do mundo. Três das espécies agora reconhecidas estão ameaçadas de extinção.

Durante mais de 260 anos, os cientistas consideraram as girafas como uma única espécie, Giraffa camelopardalis, como foi durante muito tempo designada, existia ao longo de milhares de quilómetros de pradarias e bosques africanos.

Hoje, os cientistas vêem as girafas de forma diferente. A espécie é agora oficialmente quatro espécies diferentes, anunciou na quinta-feira a União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN).

Uma exaustiva análise genética, morfológica e biogeográfica realizada pelo Grupo de Peritos em Girafas e Ocapis (GOSG), da Comissão de Sobrevivência de Espécies da UICN, concluiu que as diferenças entre as várias populações de girafas são suficientemente significativas para justificar a sua classificação como espécies diferentes, “com histórias evolutivas distintas”.

Uma girafa já não é apenas uma girafa, por assim dizer”, afirmou Michael Brown, presidente do Grupo de Especialistas em Girafas e Ocapis da Comissão de Sobrevivência de Espécies da UIC.

Agora temos quatro espécies diferentes, cada uma com a sua própria história. Isto tem implicações dramáticas na forma como encaramos a conservação das girafas em África”, acrescentou Brown.

As quatro espécies estabelecidas oficialmente são: a girafa-do-norte (Giraffa camelopardalis), a girafa-reticulada (Giraffa reticulata), a girafa-masai (Giraffa tippelskirchi) e a girafa-do-sul (Giraffa giraffa).

De cima para baixo, da esquerda para a direita: girafa-do-sul (Giraffa giraffa), girafa-masai (Giraffa tippelskirchi), girafa-do-norte (Giraffa camelopardalis), e girafa-reticulada (Giraffa reticulata)

Até agora classificadas como uma única espécie com nove subespécies, as girafas podem no entanto voltar em breve a ser novamente apenas uma espécie: dados preliminares sugerem que três dessas espécies estão ameaçadas de extinção, nota o The New York Times.

É fácil distinguir as girafas de outros mamíferos graças ao seu pescoço magnificamente comprido. Mas existem também diferenças subtis que distinguem as próprias girafas entre si.

Já no século XIX, por exemplo, zoologistas europeus que estudavam peles de girafa enviadas para museus notaram padrões e colorações distintas.

As girafas de diferentes regiões pareciam apresentar pelagens características, o que levou alguns investigadores a defender que a espécie incluía oito ou nove subespécies — populações distinguíveis entre si, mas ainda capazes de se cruzar.

No século XX, as girafas sofreram um preocupante declínio. O vírus da peste bovina, que infetava o gado em África, dizimou muitas populações. Cercas e estradas fragmentaram o seu habitat, e caçadores furtivos mataram numerosos animais. Entre 1985 e 2015, a população de girafas caiu cerca de 40%.

Essa redução levou a IUCN a classificar a espécie como vulnerável em 2016. Mas essa avaliação partia do pressuposto de que todas as girafas pertenciam a uma única espécie — e novas provas vieram pôr essa ideia em causa.

Um estudo genético publicado em 2024 na Current Biology revelou, por exemplo, que as girafas atuais pertencem a quatro ramos principais que quase não se cruzaram desde que divergiram de um ancestral comum há cerca de 280 mil anos.

Outro estudo, publicado na PLOS One também em 2024, que analisou 515 crânios de girafa, revelou diferenças anatómicas entre os quatro grupos.

Os investigadores verificaram que os ossicones — excrescências em forma de corno na cabeça das girafas — variavam significativamente. No extremo norte da sua distribuição, as girafas apresentam um ossicone elevado, acima da testa; já nas da África Austral forma-se apenas uma saliência baixa.

A espécie com maior população é a girafa-do-sul. Vive na África do Sul e em países vizinhos e, segundo o relatório anual de 2025 da Giraffe Conservation Foundation, conta com 68.837 animais.

As outras três espécies têm distribuições e populações bastante menores. A girafa-masai habita a África Oriental. A girafa-reticulada estende-se mais a norte, no Quénia e no sul da Etiópia. A quarta espécie, girafa-do-norte, que manteve o nome original da espécie, Giraffa camelopardalis, sobrevive em focos dispersos do Sudão do Sul ao Níger.

Segundo Michael Brown, o pequeno número de exemplares poderá levar a que estas três espécies venham a ser classificadas como ameaçadas.

Com apenas 7.037 exemplares, dispersos em bolsões isolados e em países afetados pela pobreza e pela guerra, a girafa-do-norte é a espécie que enfrenta os maiores desafios à sua sobrevivência.

ZAP //

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