O futuro estatuto de imigração após a saída do Reino Unido da União Europeia é confuso para os residentes portugueses como Hélder Morgado, que chegou à Escócia há dois anos, pouco depois do referendo que ditou o Brexit.
Apesar de se considerar informado pela imprensa portuguesa e britânica e de ser indicado pelo grupo de amigos como o mais interessado do grupo pela atualidade, o barcelense de 40 anos ainda tem dúvidas.
“Não é muito claro, tenho muitas dúvidas. Gostava de ter informação mais definitiva sobre o que preciso de fazer, mas há muita especulação”, afirmou o auxiliar de cuidados de saúde à agência Lusa.
Equipado com um cachecol e camisola da seleção nacional de futebol, cujo jogo amigável contra a Escócia assistiu no domingo em Glasgow, Hélder Morgado admitiu que ainda não tentou pedir o estatuto de residência.
“Não me preocupei muito porque [a saída] é só em 2019 e ouvi dizer que o governo britânico vai dar mais dois anos para as pessoas se registarem, por isso penso que vai haver tempo suficiente”, justificou.
Enquanto não completar cinco anos consecutivos a viver no Reino Unido, Morgado só terá direito a um título provisório [‘pre-settled status’], sendo o estatuto de residente permanente [‘settled status’] atribuído àqueles que estão há cinco anos ou mais no país.
O governo britânico prometeu que vai defender os direitos dos europeus depois da saída da UE, e afirmou que aqueles que chegarem antes do Brexit vão poder ficar e completar os cinco anos necessários para o título de residência permanente.
O ‘settled status’, indicou o Ministério do Interior, dará aos europeus o direito de “ficar no Reino Unido o tempo que quiserem” após dezembro de 2020, com acesso ao mercado de trabalho, serviços públicos como a educação, saúde, apoios sociais e pensão de reforma.
Depois do Brexit, revelou a primeira-ministra, Theresa May, os cidadãos dos países da UE vão passar a ser tratados da mesma forma que os restantes países de fora da UE e o acesso a empregos britânicos por imigrantes será prioritariamente dado a trabalhadores com melhores qualificações, enquanto que aqueles com menos qualificações vão enfrentar mais restrições.
Apesar de qualificar-se para o estatuto de ‘pre-settled’, Hélder Morgado receia que, mesmo assim, seja necessário candidatar-se a visto de trabalho e questiona-se se “será viável ficar, se será que vai ser fácil”, ou se existe o risco de perder o emprego.
João Lopes, de 37 anos, dos quais 14 anos passou na Escócia, onde trabalha na construção civil, também está confuso porque a informação que recebe vem sobretudo das redes sociais, onde leu que mesmo aqueles com mais de cinco anos de residência “não precisam de fazer nada”.
Mas o processo de candidatura para os cidadãos europeus que queiram ficar no Reino Unido após o Brexit, no final de março do próximo ano, será obrigatório para todos, de idosos a crianças, com exceção daqueles com dupla nacionalidade.
É o caso do filho menor de João Lopes, que nasceu em Edimburgo e teve direito a passaporte britânico apesar de nenhum dos pais ter título de residência permanente.
Albino Pereira, de 62 anos, já conseguiu o cartão azul graças à ajuda do serviço de aconselhamento aos cidadãos Citizens Advice e do consulado português em Manchester.
Para isso precisou de preencher um formulário de 85 páginas e anexar numerosos documentos, além de pagar uma taxa de 65 libras (74 euros), mas quando fizer o registo após 2019 no sistema eletrónico do ministério do Interior britânico verá ser atribuído de forma automática e gratuita o ‘settled status’.
“Mas estou preocupado com o meu filho, que tem deficiência profunda, e a minha mulher, que trata dele e não trabalha. Eles só cá estão há dois anos”, confiou Pereira, desconhecedor de que o novo sistema promete facilitar o registo dos familiares que não tenham trabalhado no Reino Unido.
O irmão de Hélder, Carlos Morgado, conta que não é só a incerteza sobre o Brexit que está a levar os europeus a irem-se embora ou a procurarem outros países para imigrarem.
“A libra desvalorizou, o custo de vida aumentou e os salários não sobem. Ainda há portugueses a chegarem para procurar trabalho, mas já não é tão fácil”, explicou à Lusa.
Possibilidade de acordo é “real”, considera Santos Silva
O ministro dos Negócios Estrangeiros português, Augusto Santos Silva, afirmou que “é real a probabilidade” de um acordo sobre o Brexit na cimeira europeia desta semana, mas, não havendo, é fundamental que “haja avanços”.
“Os elementos de que disponho fazem-me pensar que é real a probabilidade de haver acordo”, disse o ministro à Lusa, na sexta-feira, a propósito do Conselho Europeu da próxima quarta e quinta feira.
Santos Silva escusou-se a dar pormenores, explicando que a diplomacia portuguesa acompanha as negociações “hora a hora”, mas se fosse pronunciar-se sobre isso, “não estaria a negociar bem”.
Sublinhando repetidamente a importância para todas as partes de haver um acordo de saída do Reino Unido da União Europeia, o ministro admitiu contudo que é possível que o processo negocial não seja concluído agora.
“Sabemos que está na última milha, mas também sabemos […] que a última milha é uma milha muito difícil. Portanto, a expectativa de Portugal é que haja avanços nestes dias e que o Conselho Europeu da semana que vem já assinale esses avanços”, disse.
Questionado sobre, caso não haja ainda um acordo, quais são as perspetivas de concluir a negociação, tendo em conta que faltam menos de seis meses para a data prevista para a saída, Santos Silva frisa que os “prazos, neste momento, ainda não estão ultrapassados” e disse encarar esta fase “com confiança”.
“O presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, já disse que se for necessário fazer um conselho extraordinário em novembro, se fará. Depois haverá um conselho ordinário, um Conselho Europeu, outra vez em dezembro. Portanto, estamos a trabalhar com prazos que neste momento ainda não estão ultrapassados e vamos encarar este último impulso negocial com confiança”, disse.