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Um “no século XIX”, outro “atrasado no tempo”. João Ferreira e Mayan descobriram que os seus infernos são diferentes

José Sena Goulão / Lusa

O candidato a Belém apoiado pelo PCP, João Ferreira, e o candidato apoiado pelo Iniciativa Liberal (IL), Tiago Mayan Gonçalves, estiveram frente a frente em mais uma ronda de debates televisivos no âmbito das eleições presidenciais marcadas para 24 de janeiro. 

Transmitido pela TVI e moderado pela jornalista Carla Moita, o candidato a Belém apoiado pelo PCP, João Ferreira, e o candidato apoiado pelo Iniciativa Liberal (IL), Tiago Mayan Gonçalves, discutiram de forma acesa a economia portuguesa e as formas para recuperar da crise.

João Ferreira defendeu que é preciso “relançar a atividade económica e combater a crise social” através do reforço do mercado interno – “desbloquear a oferta e reforçar a capacidade produtiva nacional” -, “recuperar empresas e setores estratégicos” e “agir do lado da procura.

Isto é uma receita para o desastre. Supor que Portugal está a aplicar políticas liberais é rísivel. Esse é que é o problema. O João está preso no século XIX. Quer nacionalizar tudo, é esse o objetivo perfilhado [pelo PCP]”, atirou Mayan. “A ideologia comunista trouxe sempre a desgraça e a destruição económica.”

“Os países desenvolvidos não têm esses sectores [nas mãos do Estado]. O que fizemos [em Portugal] foi substituir os monopólios das mãos no Estado e entregar monopólios a empresas que vivem encostadas ao Estado. Esse é um modelo contrário ao liberal”, contrariou Mayan.

Questionado sobre como criar emprego e resolver a crise, o candidato da IL respondeu: “É a atividade económica. E o Estado esmaga estas empresas com impostos e burocracias”.

Em relação ao setor bancário, João Ferreira defendeu a a reconstituição. “Se o estado paga, o Estado tem de ser dono. Se o Estado intervém, tem de o pôr ao serviço do país”, disse.

Já Mayan garantiu que o seu partido nunca defenderá resgates de bancos. “Uma empresa que opera no mercado e falha, é o destino. A mim surpreende-me que seja o João sempre a querer ajudar os bancos.”

“Só no paraíso liberal é que esta destruição liberal funciona. Mas o paraíso liberal é o inferno dos povos, porque eles sentem sempre o impacto da destruição criadora que os liberais tanto elogiam. Isso só nos contos de fada liberais”, criticou o candidato comunista. “Infernos na terra é a Coreia do Norte, é a Venezuela”, devolveu Mayan.

“O estado de emergência não contribuiu em nada”

Questionado sobre a evolução da pandemia de covid-19, num dia em que Portugal ultrapassou a barreira dos 10 mil casos diários, João Ferreira defendeu que a gravidade da situação não deve ser minimizada e as medidas de emergência devem ser tomadas, como o reforço do Serviço Nacional de Saúde (SNS), medidas de intervenção sobre os cuidados intensivos e sobre o rastreio e controlo das cadeias de transmissão, proteção dos lares, medidas de proteção nos transportes públicos e equipamentos públicos.

O candidato comunista considerou que são precisas “restrições de contactos sociais”, mas “o estado de emergência não contribuiu em nada para adotar as medidas imprescindíveis para reduzir os casos” e criou medidas “perversas”, como a concentração de pessoas num horário mais reduzido.

O candidato disse que as medidas são passíveis de adotar sem estado de emergência.

Já Mayan considerou que “este país não aguenta um confinamento geral de novo”. Segundo o candidato, o novo confinamento levaria à destruição do país. “A pobreza também mata”, afirmou.

“Temos de olhar de forma séria e integrada para os grupos mais vulneráveis e definir um plano imediato. Teria de ser esse o foco”, afirmou, acrescentando que “isto é uma prova do falhanço do Governo na gestão desta pandemia”.

Sobre a sua campanha, João Ferreira disse a agenda “tem sido alterada” por causa da evolução da pandemia. Já o candidato da IL afirmou que não quer “fazer o que não é permitido ao cidadão comum”.

“A segunda volta constrói-se agora”

Questionado sobre se numa eventual segunda volta votaria Marcelo ou Ana Gomes, Mayan recusou responder. “O que estou a dizer às pessoas é não vou decidir por vocês. Tudo o que disser soará a orientação de votos”, disse.

Também João Ferreira recusou responder à questão sobre se admitiria abdicar da sua candidatura em prol de Ana Gomes para obrigar Marcelo a ir a uma eventual segunda volta. “Estamos a construir o resultado das eleições, a segunda volta constrói-se agora e eu estou a fazer o possível para abrir um horizonte de esperança no país”, disse.

 

Na questão final feita pelo candidato comunista ao liberal, João Ferreira perguntou o que é que faria com a Constituição que diz que todos os portugueses têm direito a uma habitação com condições de qualidade e conforto e que o Estado tem um papel no assegurar dessas condições.

“Assegurar que [revogaria] leis retrógradas que cristalizam o mercado de arrendamento. Descentralizar políticas de habitação, como se faz na cidade do Porto, fomentar o mercado de arrendamento para famílias e jovens. Sem isso não temos habitação”, respondeu Mayan.

Lamento informá-lo que está um bocado atrasado no tempo. Sabe que já tivemos um Governo PSD/CDS e uma lei Assunção Cristas que fez aquilo exatamente que diz que é preciso fazer. E lamento ter de dizê-lo. As consequências foram devastadoras”, atirou o comunista.

Questionado sobre o orçamento de campanha, previsto em 400 mil euros, João Ferreira assegurou que é uma “estimativa máxima”. “Com certeza que o orçamento final será menor, e no fim será entregue lista com todas as despesas feitas”, disse.

Mayan fez ainda uma pergunta sobre a razão pela qual o PCP insiste em benefícios fiscais para os partidos. O comunista respondeu que os partidos fazem parte da democracia. “Eu não tenho uma visão dos partidos como se fossem empresas, o partido a que pertenço vive das contribuições dos militantes e é dos que menos depende do Estado no que toca a subvenções. Mas o partido tem, ou deve ter, um papel com relevância na intervenção social”, afirmou.

O debate terminou com uma nota do candidato liberal: “Quando falámos de isenção fiscal para os partidos falámos de IMI. Não são as grandes empresas que pagam IMI. Sou eu, a Carla [Moita, a moderadora do debate]. João considera que estas pessoa devem pagar, mas não o seu partido”.

Para esta quinta-feira, estão agendados debates entre Marisa Matias e André Ventura (na SIC, às 21h); Ana Gomes e Tiago Mayan (na TVI24, às 22h); e Vitorino Silva e Marcelo Rebelo de Sousa (na RTP3, às 22h45).

Maria Campos, ZAP //

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