Os deputados têm dois meses para conseguir um acordo para regular o teletrabalho, depois de o parlamento ter adiado por 60 dias a votação de projetos dos partidos. Para a ministra do Trabalho, a não regulação do teletrabalho pode levar a relações laborais indignas.
Em entrevista ao Diário de Notícias e à TSF, a ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Ana Mendes Godinho, considerou que as novas formas de trabalho podem trazer “novos desafios” às relações laborais.
“As novas formas de trabalho têm de ser vistas nas várias dimensões que tem que ver com a capacidade de conciliação da vida pessoal com a vida profissional, com a vida familiar, com a capacidade de desligar, com a capacidade da desconexão quando está a trabalhar fora de um local de trabalho típico, com um conceito tradicional de local de trabalho”, afirmou a governante.
Uma das propostas em cima da mesa na regulação do teletrabalho é o pagamento das despesas que ainda divide os partidos. Para a ministra, “teletrabalho não pode gerar custos acrescidos ao trabalhador”.
“Tem de haver um efeito nulo que garanta que o trabalhador não tem mais despesas nem tem despesas acrescidas porque a forma de prestação do trabalho mudou”, continuou.
A ministra recordou que Portugal foi dos primeiros países a regular o teletrabalho em 2003, “mas claramente não estava preparado para uma adesão massiva dos trabalhadores num contexto de imposição. Naturalmente, agora precisamos, e isso ficou evidente durante a pandemia por termos tido tantas pessoas em teletrabalho e em contextos tão exigentes, de regular o teletrabalho de outra forma”.
Para Ana Mendes Godinho, é necessário regular “a questão das despesas, a questão de frisar que o teletrabalho deve ser sempre por acordo e que deve ser esse um princípio basilar, e de garantir de facto que o trabalhador não tem custos acrescidos, e também definir algumas regras, nomeadamente quanto à segurança e à saúde no trabalho, quanto à questão de o risco até por acidentes de trabalho ficar salvaguardado, quando isto aconteça noutro contexto que não o contexto tradicional do local de trabalho.”
Sobre o facto de o teletrabalho estar previsto até ao final do ano, mas ter um prazo de vigência até dia 16 de maio,a ministra explicou que “é um diploma que prevê um enquadramento da possibilidade de haver teletrabalho obrigatório nas funções que são compatíveis até ao final do ano”.
Assim, “em função da evolução da pandemia será avaliada a necessidade de manutenção do teletrabalho que, naturalmente, poderá evoluir para se manter obrigatório ao longo do tempo”.
Dois meses concluir leis do teletrabalho
Esta quinta-feira, os deputados usaram uma figura do regimento para pedir que baixem à comissão sem votação os 10 projetos de lei que regulamentam o teletrabalho, um agendamento que partiu do BE, a que se juntaram depois as propostas do PS, PSD, PCP, CDS-PP, PAN, PEV e da deputada não inscrita Cristina Rodrigues.
Desta forma, permite-se que todas as propostas sejam discutidas em comissão e, havendo acordo, a comissão propõe um texto de substituição que depois é votado na generalidade, especialidade e em votação final global.
Os partidos que não se revejam nesse texto podem levar os seus projetos a votação.
No debate parlamentar, na quarta-feira, o secretário de Estado Adjunto, do Trabalho e da Formação Profissional, Miguel Cabrita, admitiu “margem” para encontrar “soluções e equilíbrios” no parlamento sobre a regulamentação do teletrabalho, depois de o PS, através da líder parlamentar, Ana Catarina Mendes, ter dito o mesmo.
Entre as propostas, identificam-se convergências na necessidade de a opção pelo teletrabalho depender de acordo com o trabalhador, de acautelar as questões de privacidade, de prever que os acidentes que aconteçam em casa, quando em teletrabalho, possam ser considerados acidentes de trabalho e na garantia da igualdade de tratamento entre os trabalhadores “à distância” e aqueles que estão presencialmente.
Contudo, há ainda muitos pontos divergentes entre as propostas dos partidos, destacando-se o pagamento das despesas dos trabalhadores em teletrabalho com a eletricidade, a água ou as telecomunicações.
Maria Campos, ZAP // Lusa