A regulação do teletrabalho e os direitos dos trabalhadores neste regime vão esta quarta-feira a discussão no parlamento, com 10 projetos de lei dos partidos em debate na generalidade.
Entre as propostas, identificam-se convergências na necessidade de a opção pelo teletrabalho depender de acordo com o trabalhador, de acautelar as questões de privacidade, de prever que os acidentes que aconteçam em casa, quando em teletrabalho, possam ser considerados acidentes de trabalho e na garantia da igualdade de tratamento entre os trabalhadores “à distância” e aqueles que estão presencialmente.
Contudo, há ainda muitos pontos divergentes entre as propostas dos partidos.
Segundo o ECO, o pagamento de despesas é um dos pontos mais polémicos da questão do teletrabalho despertada pela pandemia. Por um lado, o PS, PSD e Bloco de Esquerda atiram a questão para a negociação entre empregador e trabalhador.
Por outro, o PCP e o PAN querem fixar, pelo menos, um valor mínimo a pagar ao trabalhador. Os comunistas entendem que o valor diário não poderá ser inferior ao correspondente a 2,5% do valor do Indexante dos Apoios Sociais (IAS) — 10,97 euros. O PAN concorda, entendendo que o abono deve cobrir os consumos de água, eletricidade, climatização, Internet e telefone.
Sobre o direito de desligar, todos os partidos defendem o descanso do trabalhador, mas diferem nas soluções propostas para este fim.
O PS estabelece que um dos deveres do empregador deverá ser abster-se de contactar o teletrabalhador no período de desligamento e definem que o acordo de teletrabalho deverá fixar o horário em que o trabalhador “tem o direito de desligar todos os sistemas de comunicação de serviço com o empregador, ou de não atender solicitações de contacto por parte deste, não podendo daí resultar qualquer desvantagem ou sanção”. O PAN concorda com esta abordagem.
O PSD defende que seja estabelecido que o empregador deve respeitar o horário de trabalho e os tempos de descanso e de repouso da família do trabalhador. Para o PCP, o horário de trabalho não se pode iniciar antes das 8h e terminar após as 19h.
Já o BE quer mudar a legislação laboral de modo a salientar que o “período de descanso deve corresponder a um tempo de desconexão profissional” e sugerem que a violação reiterada deste direito deverá considerada indício de assédio. Já o CDS entende que o empregador possa contactar o trabalho, em caso de força maior e de urgência, devidamente justificável.
Teletrabalho só por acordo
Em relação ao teletrabalho em condições normais – fora da situação pandémica -, os partidos concordam que o teletrabalho só deverá ser adotado sob acordo, ou seja, com o “sim” do trabalhador e do empregador.
Para o PS, se o teletrabalho for iniciativa do empregador e o trabalhador recusar, este não terá de fundamentar a sua decisão, não podendo isto ser causa de despedimento ou de qualquer outra sanção. Se for o trabalhador a propor e o empregador não quiser avançar nesse sentido, terá de fundamentar a recusa por escrito.
Os comunistas querem garantir que o trabalhador pode rejeitar a proposta de teletrabalho, quando considere que “não estão reunidas as condições para que preste a sua atividade com dignidade, privacidade e respeito pelas condições de segurança e saúde no trabalho”.
O Bloco quer garantir que os trabalhadores com filhos até 12 anos podem ir para teletrabalho sem o empregador se possa opor.
Em linha com os bloquistas, o PAN alargar o universo de trabalhadores que têm direito a teletrabalho, passando a estender esta possibilidade aos trabalhadores com filhos ou dependentes menores de 12 anos, menores de idade com doença oncológica ou com deficiência ou doença crónica; trabalhadores reconhecidos como cuidadores informais não principais; trabalhadores com doença crónica ou com grau de incapacidade igual ou superior a 60%; e aos trabalhadores-estudantes.
Em relação à duração dos acordos de teletrabalho, de acordo com o Jornal de Negócios, o PSD não altera as regras em vigor, que só preveem a possibilidade de regresso nos primeiros 30 dias ou no final do período.
Por seu lado, o PS vai ao encontro das propostas de BE, PCP e Verdes, que querem assegurar que o trabalhador possa voltar ao trabalho presencial a qualquer momento.
O projeto do PS propõe que estes acordos de teletrabalho possam ser “a prazo” com a duração máxima de seis meses ou que, quando forem por tempo indeterminado, “qualquer das partes possa fazê-lo cessar mediante comunicação à outra”, o que “produzirá efeitos no 60.º dia posterior”.
Privacidade do trabalhador
Relativamente à privacidade, os partidos concordam que deve ser vedada aos empregador a captura de imagem, de registo de som, de registo de escrita, de acesso ao histórico ou o recurso a outros meios de controlo que possam afetar o direito à privacidade do trabalhador.
Por outro lado, para o PS, o empregador pode exigir ao trabalhador relatórios diários ou semanais sobre os assuntos tratados na sua atividade e os respetivos resultados.
Sobre as visitas ao domicílio, para o PSD, só devem ser efetuadas na presença do trabalhador, durante o período normal de trabalho. Além disso, para os sociais-democratas, bloquistas e comunistas, só devem servir para a instalação, reparação e manutenção dos instrumentos de trabalho.
Quanto aos acidentes, PS, PSD, PAN e Bloco propõem que o regime legal de reparação dos acidentes de trabalho e das doenças profissionais seja também aplicado às situações de teletrabalho.
O PCP defende que o empregador deverá atualizar os seguros de acidentes de trabalho, passando a considerar o exercício da atividade laboral em regime de teletrabalho, seja qual for o local onde seja prestado.
Para o PS, BE e PAN, os teletrabalhadores devem manter os contactos presenciais com as suas equipas de trabalho e empregadores.
Os partidos consideram ainda que teletrabalhadores e trabalhadores presenciais devem gozar os mesmos direitos.