A legalização da canábis para uso recreativo é debatida esta quinta-feira no Parlamento, com BE e PAN a apresentarem projetos de lei idênticos, discordando apenas quanto aos locais de venda.
O Bloco de Esquerda (BE) defende que a venda deve ser feita em estabelecimentos licenciados para o efeito, que “devem ter, apenas e só, como atividade principal o comércio de plantas, substâncias ou preparações de canábis”. Por sua vez, o Pessoas-Animais-Natureza (PAN) considera que a venda “deve ocorrer exclusivamente em farmácias, porque são pontos de venda neutros”, onde há profissionais habilitados para prestar esclarecimentos.
Na semana em que foi publicada a regulamentação da lei da canábis para fins terapêuticos, aprovada em julho passado, os deputados voltam a discutir a questão, agora para legalizar a droga para uso pessoal e não medicinal, permitindo mesmo o autocultivo.
Os projetos não são consensuais. Por um lado, o bastonário da Ordem dos Médicos, Miguel Guimarães, diz que a instituição tem de tomar uma posição, pelo impacto da medida na saúde. Por outro, a Associação de Estudos Sobre Canábis – Cannativa considera que a legalização seria “um grande passo” para combater o crime organizado e “um passo na direção da saúde pública”.
Os dados do último inquérito nacional indicam que um em cada 10 portugueses já consumiu canábis pelo menos uma vez na vida e que há uma tendência para aumento, sobretudo entre os portugueses que têm hoje entre 25 e 44 anos.
Caso os projetos sejam aprovados, Portugal será o terceiro país do mundo com a legislação mais permissiva, depois do Uruguai e do Canadá.
O Bloco foi o primeiro partido a apresentar a iniciativa legislativa. O projeto do partido propõe a legalização da canábis para consumo pessoal não medicinal, passando a lei a regular os aspetos da produção e do cultivo, da comercialização, da aquisição, detenção e consumo da planta ou derivados.
No seu projeto de lei, o PAN afirma que o objetivo da regulação do uso recreativo da canábis é a “proteção da saúde e segurança pública”, providenciando um acesso seguro e informado.
Os dois partidos defendem que a venda deste produto só pode ser feita a maiores de 18 anos e que não padeçam de doença psíquica. Além disso, propõem igualmente a proibição de publicidade a produtos à base de canábis e aos estabelecimentos que os vão vender e que as embalagens sejam neutras e informativas, alertando para os eventuais danos para a saúde do consumidor.
Relativamente ao cultivo para o uso pessoal, o projeto de lei do BE permite o autocultivo até um limite máximo de cinco plantas por habitação própria e permanente e o PAN de seis plantas.
Se PSD e PS forem coerentes, votam pela legalização
A coordenadora bloquista Catarina Martins, defendeu esta quarta-feira que se PSD e PS forem coerentes com as posições internas aprovarão o projeto de lei de legalização da canábis do BE que o parlamento debate na quinta-feira.
Num encontro promovido pelo Bloco num bar de Lisboa sobre a iniciativa legislativa, que é debatida em conjunto com uma idêntica do partido Pessoas-Animais-Natureza (PAN), Catarina Martins disse não saber como vai ser votado o projeto de lei mas garantiu que vai haver uma “clarificação da posição dos partidos”.
Se os partidos que “internamente” defendem a legalização votarem de acordo a iniciativa passa, disse a coordenadora do BE, lembrando que o PSD aprovou em congresso uma moção nesse sentido.
“Se o PSD votar de acordo com a decisão do congresso votará a favor. E o PS não teria muito campo para votar contra se houver coerência com posições defendidas. Se os partidos votarem de acordo com o debate interno passará“, disse, referindo-se à proposta de legalização da canábis para uso recreativo e sugerindo que se a iniciativa for aprovada na generalidade pode ser melhorada em sede de especialidade.
Lembrando que o Bloco já no passado apresentou a proposta e que caso seja chumbada não vai desistir dela, Catarina Martins disse que “há neste momento razões para consenso político em torno da legalização”, quer por haver outras experiências internacionais, quer por haver no país um debate sobre a questão, ao ser separada a questão medicinal (aprovada em Julho passado) do uso recreativo.
“E há uma urgência de tempo, porque o número de consumidores está a aumentar e a toxicidade do produto também está a aumentar”, disse, afirmando depois que aprovar o projeto de lei não tem a ver com esquerda ou direita mas sim com saúde pública.
Porque “a proibição não resulta“, porque é das substâncias mais consumidas, porque é um “negócio muito lucrativo nas mãos de criminosos”, a legalização da canábis é uma questão que faz sentido também em termos de saúde pública, já que hoje, por ser comprada de forma ilegal, as pessoas não sabem o que estão a consumir e o Estado não assume qualquer compromisso, justificou a coordenadora do Bloco, classificando como hipocrisia poder-se consumir mas não se poder comprar ou produzir.
ZAP // Lusa