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Nem todos os russos são bestas

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Proibição após proibição, exagero após exagero. Crónica sobre os castigos aos russos que nada têm a ver com a guerra.

Primeiro ponto: o autor deste artigo não é a favor do regime russo.

Segundo ponto: o autor deste artigo não é a favor do regime ucraniano.

Ponto principal: o autor deste artigo é a favor das pessoas. E da justiça.

A Rússia invadiu a Ucrânia no dia 24 de Fevereiro de 2022.

Por isso, a partir desse dia, todos os russos passaram a ser bestas. São todos perigosos, inconscientes, injustos.

Ou inconsciente e injusto – e perigoso – será metermos todos no mesmo “saco”?

Os sinais de generalização

É que podemos alterar aquele parágrafo ali em cima: “Uma percentagem muito baixa da população da Rússia, sob ordens de uma percentagem ainda menor formada por políticos e militares da Rússia, invadiu parte da Ucrânia”.

É diferente de “Rússia invade Ucrânia”, não é?

Horas depois do início da invasão, começaram a aparecer as consequências para a Rússia, em vários aspectos: a nível financeiro, as primeiras (e hoje famosas) sanções e a nível desportivo – aqui, até os Jogos Paralímpicos foram afectados, na semana seguinte.

Obviamente era preciso dar sinal – ou muitos sinais – de oposição à guerra na Ucrânia. Castigar o país invasor em diversos aspectos foi uma decisão rápida, natural e compreensível.

Por outro lado, a generalização é muito perigosa, arriscada e injusta.

Que responsabilidade têm os bancos e os comerciantes russos das decisões que Putin e companhia tomam?

E será que a população – a população! – russa é a favor da guerra? Ainda no ano passado, uma sondagem nacional mostrou que não; e uma entrevista ao ZAP deu um exemplo disso, em Portugal.

“Não cumprimento”

Focando no desporto: que responsabilidade têm os atletas? Não foram aos Jogos Paralímpicos por questões de segurança para os próprios? Talvez. Argumento racional.

Mas o tempo vai passando e a discriminação mantém-se. Os russos (e os bielorrussos) já participam, mas sem bandeira e sob tratamento diferente.

Ainda há poucos dias, no torneio de ténis em Wimbledon, a ucraniana Elina Svitolina não cumprimentou a bielorrussa Victoria Azarenka depois de um jogo entre ambas. Porque mantém a sua postura de sempre: não vai apertar a mão de tenistas russas ou bielorrussas enquanto a guerra na Ucrânia continuar.

Porquê…?

Obviamente percebo a postura contra o regime de Moscovo. Mas contra uma tenista? Uma colega de profissão que tem zero relação com a guerra?

E mais: antes, em Roland Garros, Svitolina fez o mesmo em três jogos, não cumprimentou adversárias de Rússia e Bielorrússia – e foi assobiada pelo público no último caso, após o duelo com a bielorrussa Aryna Sabalenka (que disse que não apoia a guerra, depois desse jogo).

E ainda mais: a ucraniana Svitolina pediu que todas as tenistas da Rússia e da Bielorrússia fossem banidas dos torneios internacionais.

Porquê…?

Era bonito ver cenas destas:

Lisboa, 2023

Mas, deixando o desporto e centrando-me em algo que nos diz mais: a Jornada Mundial da Juventude, que começa daqui a pouco mais de uma semana, em Lisboa.

“É muito bonito e poético sentar à mesa o agredido e o agressor, o assassino e a família do assassinado, mas é preciso tempo. A dor não prescreve e a dor não sara e temos que fazer caminho”, afirmou Américo Aguiar.

O bispo e coordenador do evento queria juntar russos e ucranianos à mesa, mas isso não vai acontecer em Lisboa. É preciso tempo. Compreende-se.

Mas estas proibições/condições estão para lá da organização directa da Jornada Mundial da Juventude.

Horas antes destas declarações, soube que há portugueses a recusar receber em casa jovens de Bielorrúsia e Polónia. Não cedem casa a jovens desses dois países. Juntos, não. E nem são de Rússia ou Ucrânia.

São jovens que vêm celebrar, cantar a religião, ver o Papa… Serão assim tão perigosos?

Ou podia apresentar outra perspectiva: não seria uma oportunidade mais do que adequada para repetirmos imagens como aquela entre os dois desportistas nos Jogos Olímpicos?

Dar uma imagem real de união, de paz, entre pessoas daqueles dois países, sim, mas que nada têm a ver com a guerra?

Portugal não poderia ser o palco de um incentivo mundial, bonito e importante?

Ainda não. É preciso tempo.

Até quando?

Nuno Teixeira da Silva, ZAP //

15 Comments

  1. Até quando?
    Simples, até a Rússia abandonar a Ucrânia, parar o genocídio hitleriano, punir os responsáveis e pagar os estragos.

  2. Claro que a invasão foi decidida pelo Putin e não pelos russos em geral! Mas têm que ser estes a correr com a liderança do poder se não concordam com as decisões desta. É arriscado faze-lo? É… mas mais risco correm as populações inocentes bombardeadas na Ucrânia e que não foram responsáveis por colocar Putin no poder, nem por o lá manter, Arriscaram quando foram para a rua em 2013 em Kiev e correram com o presidente fantoche pro-Kremlin (na mesma linha do atual da Bielorussia), Que a população russa de Moscovo e S.Petersburgo (incluindo os atletas…) faça o mesmo, em vez de envergar t.shirts com o Z impresso…

  3. Obviamente um cidadão russo que se desmarque e denuncie o ditador fascista comunista deve ser bem tratado. Os outros são colaboracionistas.

  4. As ideologias fascista e comunista são extremamente distintas e frequentemente opostas entre si.
    Enquanto o fascismo defende um governo autoritário e nacionalista, o comunismo busca uma sociedade sem classes e a propriedade coletiva dos meios de produção.
    Dada a natureza contraditória dessas ideologias, é improvável que uma pessoa possa adotar ambas simultaneamente de forma consistente.

  5. O Luis Aguiar devia ir passar umas férias à Ucrania, lá bem para a frente da guerra. A ver se no fim ia pensar nos pobrezinhos russos que tanto sofrem nas nãos do ocidente, e não nos pobrezinhos Ucranianos que levam com bombas dia sim dia sim, e vivem num pais em ruinas.
    Calado eras um autor.

  6. Entre 1933 e 1945 , durante o 3º Reich , também nem todos os Alemães eram Nazis , e os que rejeitavam o Regime , tinham os Dias contados . Tudo isto para chegar a conclusão , que en termos de “Bestas” , o Mundo , delas está repleto e ocupam essencialmente os Tronos do Poder . Quanto aos seus Administrados ou se submetem ou se revoltam !

  7. Tiveram que ser os portugueses a correr com o Salazar. E os portugueses (ALGUNS) correram riscos à conta disso. Têm que ser os Russos a correr com o Putin. A menos que fiquem à espera que outros tratem do assunto!

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