A extrema-direita europeia tem feito um esforço para se distanciar do “amigo” Vladimir Putin desde que a Rússia invadiu a Ucrânia. Em Portugal, André Ventura também tem criticado, sem “meias palavras” a invasão, mas no Chega, há quem atire culpas ao presidente ucraniano e não há posição oficial quanto aos refugiados.
Matteo Salvini, do partido anti-imigração de Itália, e Marine Le Pen, da Frente Nacional de França, estão entre os políticos da direita populista europeia que condenaram as acções militares da Rússia contra a Ucrânia.
Em Portugal, André Ventura também as condenou desde a primeira hora. E, nesta semana, anunciou a desvinculação do Grupo Parlamentar de Amizade Portugal-Rússia, propondo “a extinção” desta entidade.
Contudo, no seio do Chega, têm surgido outras posições menos claras quanto à guerra. O Conselheiro Nacional número um do Chega acusa o “Presidente da Ucrânia de estar a prolongar a agonia do seu povo”, defendendo que Zelenskyy “tem a obrigação moral e histórica de parar de lutar, para poupar o seu povo”.
Num vídeo publicado no seu canal no Youtube intitulado “As Rações e as Razões para o fim da Guerra”, João Tilly acaba por colocar em Zelenskyy o ónus da guerra, salientando que “é uma guerra que não se pode ganhar, nem empatar” e que é preciso deixar os “nacionalismos” de lado.
João Tilly também fala de Putin como um comunista, ou um fascista, “ou as duas coisas, que é quase igual”, como diz.
“Se Putin quisesse, há muito tinha arrasado a Ucrânia toda”, diz também, notando que, “provavelmente, não quis matar centenas de milhares de pessoas”.
Também o vice-presidente do Chega, António Tânger Correia, o nome proposto pelo partido como candidato a Conselheiro de Estado, publicou no Facebook um texto a culpar Zelenskyy pelas “decisões irreflectidas, idiotas e perigosas” que levaram à guerra.
Esta publicação, que entretanto despublicou para o público em geral, foi uma “cópia” de um texto assinado pelo utilizador do Facebook Júlio de Magalhães, como o próprio Tânger Correia veio a admitir.
O “Like” do antigo Embaixador ao texto original ainda pode ser encontrado na publicação de Júlio de Magalhães, onde se refere ainda a incompreensão pelo “coro de lamentações que se ergue da parte daqueles que não se indignaram quando os Estados Unidos e seus Aliados e a NATO atacaram, invadiram e ocuparam”.
Chega não assume posição sobre refugiados ucranianos
Por esclarecer, no Chega, está a posição do partido quanto aos refugiados ucranianos que estão a ser acolhidos por vários países europeus, incluindo Portugal.
No programa político está escrito que “aqueles que a sociedade portuguesa acolher terão de ser sempre enquadrados numa política de imigração regulada, criteriosa, assente nas qualificações, nas reais necessidades do mercado de trabalho e na mais-valia que os imigrantes poderão trazer ao país”.
O programa eleitoral do Chega ainda lamenta que as fronteiras nacionais tenham sido “escancaradas a povos de toda a parte, sem critério e sem preocupação com as reais possibilidades de integração dos imigrantes”.
Na rede social Twitter, André Ventura tem feito várias publicações a condenar a guerra na Ucrânia, entre ataques ao PCP e ao Bloco de Esquerda pelas suas posições contra a NATO no âmbito da invasão russa. Mas não se tem referido à questão dos refugiados em si.
A 7 de Março, por exemplo, escreveu o seguinte: “grandes ucranianos. Enormes! Que humanidade!”.
Grandes ucranianos. Enormes! Que humanidade! pic.twitter.com/WJTVkHeoC9
— André Ventura (@AndreCVentura) March 7, 2022
Dois dias antes, tinha assinalado que “é importante fazermos tudo o que pudermos para proteger o povo ucraniano“, salientando que “os europeus não vão assobiar para o lado com a morte de milhares de inocentes bem perto das suas fronteiras”.
“Não se adia a solidariedade e o apoio a um povo oprimido e a um país invadido”, notou a 1 de Março, anunciando que várias distritais do Chega estavam a recolher bens para ajudar “o povo ucraniano”.
“Há momentos na vida em que não há ideologia nem interesses partidários. Há a verdade e a defesa da vida humana e da liberdade”, escreveu a 28 de Fevereiro depois de um encontro com a Embaixadora da Ucrânia em Portugal, publicando uma fotografia ao lado da diplomata.
Encontro com a Sra.Embaixadora da Ucrânia em Portugal, Inna Ohnivets, expressando a minha solidariedade e compromisso em nome de todos os militantes e dirigentes do CHEGA! pic.twitter.com/YLDK1XIFjW
— André Ventura (@AndreCVentura) February 27, 2022
Ventura está, assim, à imagem de outros políticos populistas, a aproveitar a onda de solidariedade para com os refugiados ucranianos.
Extrema-direita europeia cavalga a onda solidária
A extrema-direita europeia tinha tido, até esta guerra, uma especial admiração por Putin, devido à postura eurocéptica e ao apreço pelas políticas anti-LGBT, anti-imigração e contra uma imprensa livre. Mas, depois da invasão da Ucrânia, tem procurado distanciar-se do presidente russo.
Salvini que se tem manifestado declaradamente contra a imigração em massa, chegou a visitar a cidade polaca de Przemysl, na fronteira com a Ucrânia, para mostrar o seu apoio a este país e aos refugiados da guerra.
O presidente da Câmara de Przemysl recusou-se a recebê-lo e aconselhou Salvini a “ver o que seu amigo Putin fez” enquanto mostrava uma camisola com o rosto do presidente da Rússia, idêntica à que o político italiano usou em 2014, em visita a Moscovo.
Salvini a ter o tratamento merecido. https://t.co/jS2GEQBLsu
— Nuno Gouveia (@Gouveia) March 8, 2022
Em França, com a aproximação das eleições de Abril, Le Pen tem tentado fintar os laços passados com a Rússia, nomeadamente devido ao financiamento de bancos russos ao seu partido. A líder da Frente Nacional fala, agora, de um “regime autoritário” e condena a invasão à Ucrânia que define como uma “clara violação do direito internacional e absolutamente indefensável”.
Na Hungria, também haverá eleições em Abril, o que tem levado o primeiro-ministro Viktor Orbán a lidar com a situação com muita cautela. Assim, não se negou a acolher refugiados ucranianos, ao contrário do que aconteceu na crise migratória de 2015 quando a Hungria construiu um muro na fronteira, dificultando a passagem de milhares de refugiados e migrantes para outros Estados-membros da União Europeia.
Orbán viu-se forçado a “condenar a ofensiva armada da Rússia”, mas não permitiu a passagem directa de armas da Hungria para a Ucrânia, só para não criar demasiada animosidade com Putin.
O Ventura sabe muito e tem-se afastado do Putin – o maior patrocinador da extrema-direita europeia – mas o seu amigo Salvini mostrou a “moral” desta gente e fez uma bela figura!…