Novos estudos da tinta em que foi escrito o “Evangelho da Mulher de Jesus”, um papiro controverso que sugere que Jesus era casado com Maria Madalena, parecem apontar para a possibilidade de que o documento possa ser autêntico. Porém, os resultados ainda não foram publicados e a origem do papiro continua rodeada de polémica.
O debate sobre a autenticidade do “Evangelho da Mulher de Jesus” teve início assim que Karen King, professora da Universidade de Harvard, anunciou a sua descoberta, em setembro de 2012.
Escrito em copta, língua egípcia antiga, o fragmento de papiro contém uma linha onde se lê a frase “Disse-lhes Jesus: Minha esposa…”.
O fragmento também se refere a uma “Maria”, possivelmente Maria Madalena.
Karen King datou provisoriamente o papiro como sendo do século IV, sugerindo que poderia ser uma cópia de um evangelho escrito em grego no século II.
Uma análise ao papel, detalhada o ano passado na Harvard Theological Review, sugeriu que o documento teria cerca de 1.200 anos.
Há a possibilidade de que a tinta também seja dessa época, mas está ainda em curso uma investigação para a datar com mais precisão.
Uma nova investigação
Durante o ano passado, vários estudiosos defenderam a conclusão de que o papiro era uma falsificação.
Para tentar pôr fim à polémica, investigadores da Universidade de Columbia estão agora a efectuar novos testes à tinta do papiro.
As análises iniciais publicadas pela equipa em 2014 indicaram que a tinta poderia ter sido feita em tempos antigos.
As novas análises, mais definitivas, podem fornecer apoio à autenticidade do papiro.
No entanto, os cientistas não vão comentar os resultados antes da sua publicação.
De onde veio afinal o papiro?
O actual proprietário do papiro insiste em permanecer anónimo. Alega que comprou o “Evangelho da Esposa de Jesus” em 1999, juntamente com outros textos cóptas, a um homem chamado Hans-Ulrich Laukamp.
Este, por sua vez, adquiriu o documento em Potsdam, no que era a Alemanha Oriental, em 1963.
Laukamp morreu em 2002, e a afirmação de que era proprietário do texto tem sido fortemente questionada.
Rene Ernest, o homem a quem Laukamp e sua esposa Helga incumbiram de representar as suas propriedades, diz que Laukamp não tinha interesse em antiguidades e que em 1963 vivia em Berlim Ocidental.
Por isso, não poderia ter passado o muro de Berlim, para ir a Potsdam.
Axel Herzsprung, um associado de Laukamp, diz também que nunca teve interesse em antiguidades ou possuiu um papiro.
Laukamp não tem filhos ou parentes vivos que possam verificar estas alegações.
A questão da sua origem poderia levar a que se coloque em causa a autenticidade do papiro. Por isso, os investigadores estão à procura de informações que confirmem a origem do documento.
Karen King relata, num artigo publicado em 2014 na Harvard Theological Review, que o proprietário anónimo lhe forneceu “a fotocópia de um contrato para a venda de 6 fragmentos de papiro em copta”, dos quais um se acreditava ser um Evangelho.
O contrato inclui o nome de Hans-Ulrich Laukamp e a data: 12 de novembro de 1999. Tem ainda a assinatura de ambas as partes.
Várias bases de dados públicas têm assinaturas de Laukamp, em documentos autenticados, entre 1997 e 2001. Essas assinaturas podem ser usadas para comparação com o registo da venda do Evangelho.
A análise forense de caligrafia nem sempre é conclusiva, mas já foi usada para determinar se assinaturas feitas em documentos ou obras de arte são autênticas ou falsificadas.
Se se concluir que Laukamp nunca possuiu o papiro e que o proprietário anónimo não disse a verdade, então o lado da balança inclina-se para a falsificação.
Mais dúvidas
O ano passado, Christian Askeland, do Instituto de Pesquisa Bíblica Septuaginta, em Wuppertal, na Alemanha, analisou um segundo papiro copta contendo parte do “Evangelho de João”, que o proprietário anónimo do “Evangelho da Esposa de Jesus” também tinha cedido a Harvard.
Este segundo texto foi também supostamente comprado a Laukamp, e testes de carbono apontam que o documento teria cerca de 1.200 anos.
O segundo papiro foi escrito num dialecto copta chamado Lycopolitan, considerado extinto há cerca de 1.500 anos. Askeland concluiu que o documento era uma imitação e, por partilhar características com o “Evangelho da Esposa de Jesus”, considera que ambos são falsos.
Karen King não concorda com esta conclusão, notando que o fragmento do “Evangelho de João” poderia ter sido copiado na antiguidade, muito tempo depois de o Lycopolitan se ter extinguido.
Além disso, James Yardley, investigador da Universidade de Columbia, realça que novos testes confirmam que o “Evangelho da Esposa de Jesus” contém tinta diferente da do papiro do “Evangelho de João”.
Tal parece contrariar o argumento de Askeland de que os dois papiros foram escritos pela mesma pessoa.
Entretanto, diversos estudiosos notam que a escrita copta no “Evangelho da Esposa de Jesus” é muito semelhante a um outro texto cristão, chamado “Evangelho de Tomé” — incluindo até um erro gramatical, introduzido numa edição de 2002.
Este erro grosseiro indicaria que o “Evangelho da Esposa de Jesus” teria sido escrito por falsificadores, que teriam copiado a edição moderna do “Evangelho de Tomé”.
Em 2014, Karen King contestou esta afirmação, realçando que até os antigos escribas cometiam erros gramaticais semelhantes.
E estavam certamente longe de imaginar a polémica que, 1.200 anos depois, tais erros poderiam levantar.
ZAP / HypeScience
Lá vem o Carmo e a Trindade…
Naquele tempo nem havia mulheres quanto mais!