Lei da eutanásia já define “lesão definitiva” para ser Constitucional. Votação no dia 5 de Novembro causa polémica

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Mário Cruz / Lusa

A decisão de levar o diploma alterado da eutanásia a votos ainda nesta legislatura tem suscitado críticas do PSD e do CDS e de associações, que acreditam que o parlamento não tem legitimidade para votar a proposta.

Apesar de várias leis importantes poderem ficar em stand-by até às eleições, o diploma da eutanásia vai mesmo a votos na próxima semana, no último fôlego desta legislatura.

O parlamento vai discutir as alterações propostas por PS, BE, PAN, PEV e IL à lei — que já foi vetada por Marcelo Rebelo de Sousa em Março e que suscitou dúvidas no Tribunal Constitucional — no dia 4, quinta-feira, e vai votar o documento na sexta-feira, dia 5 de Novembro.

As bancadas do PSD e CDS protestaram contra marcação da votação na conferência de líderes que decide os agendamentos da Assembleia. Os partidos consideram que, visto estarmos ao cair do pano deste parlamento que está prestes a ser dissolvido e a braços com uma crise política, esta não é a hora de se votar um diploma considerado fracturante e que exige mais debate.

O líder parlamentar social-democrata argumentou que é uma matéria “delicada porque envolve vida e morte” e tem de ser debatida “com serenidade e seriedade e não na 25.ª hora”. Adão Silva referiu também que é favor da legalização da morte assistida, mas que prefere que o assunto vá a referendo. O PSD vai dar liberdade de voto aos deputados.

Já Cecília Meireles também se mostrou contra. A deputada do CDS explica que a eutanásia “é uma questão muito diferente, é quase civilizacional” e que não faz sentido “discutir aqui o assunto quando já foi ouvido o Conselho de Estado e até possa já estar anunciada a dissolução da Assembleia”. O Chega partilha da mesma opinião, dizendo que a AR não tem “neste momento, legitimidade para discutir e votar sobre tão importante e decisiva matéria”.

Os partidos que defendem a lei discordam, dizendo que até a dissolução ser efectiva, o parlamento mantém as suas funções e poderes normais. À saída da reunião para marcar a agenda da AR, Pedro Filipe Soares mostrou-se satisfeito com a abertura do Presidente da República para ultrapassar o veto inicial.

“Tal como foi dito pelo líder parlamentar do PSD, o Presidente da República comunicou ao Presidente da Assembleia da República toda a sua disponibilidade para que esse veto fosse ultrapassado num curto espaço de tempo. Esperamos que a disponibilidade do Presidente da República seja de facto construtiva”, começou o deputado. O líder parlamento do BE espera também que a abertura de Marcelo não sirva “para levar a um veto, porque a Assembleia da República está dissolvida”.

“Isso é que não faria sentido nenhum. Era um jogo até quase maquiavélico. Não nos parece que o Presidente da República o pudesse levar por diante. Por isso, defendemos que se aproveite este tempo em que a Assembleia ainda tem para a dissolução – naquilo que para nós não era uma inevitabilidade, mas, tudo indica, será uma realidade -, a possibilidade de o parlamento colocar um ponto final positivo nos processos legislativos sobre a lei do clima e a morte assistida”, rematou.

No início de setembro, o deputado do BE José Manuel Pureza defendeu que a nova versão da legislação da despenalização da morte medicamente assistida foi feita com “todo o rigor” e “minúcia jurídica” para superar “os obstáculos levantados pelo Tribunal Constitucional”.

“Fomos naturalmente sensíveis àquilo que o Tribunal Constitucional (TC) declarou e procurámos fazer algumas reformulações com todo o rigor, com toda a cautela, com minúcia jurídica, para que os obstáculos levantados pelo TC pudessem ser superados”, salientou Pureza, membro do grupo de trabalho que preparou a nova versão, em declarações à Lusa.

Em julho, no final da anterior sessão legislativa, PS, BE, PAN, PEV e Iniciativa Liberal, partidos com projectos sobre a eutanásia, acordaram, em reunião informal, o texto final para ultrapassar o “chumbo” do Tribunal Constitucional desta lei.

O Tribunal Constitucional chumbou a 15 de Março, por uma maioria de sete juízes contra cinco, a lei sobre a morte medicamente assistida, em resposta a um pedido de fiscalização preventiva feito pelo Presidente da República. Face à declaração de inconstitucionalidade, o Presidente da República vetou o diploma, devolvendo-o ao parlamento.

No parlamento, a 29 de janeiro, votaram a favor do diploma a maioria da bancada do PS, 14 deputados do PSD (incluindo Rui Rio), todos os do BE, do PAN, do PEV, o deputado único da Iniciativa Liberal e as deputadas não inscritas Cristina Rodrigues (ex-PAN) e Joacine Katar Moreira (ex-Livre).

Para fintar o chumbo do Tribunal Constitucional, o novo documento faz uma definição exaustiva do termo “lesão definitiva e de gravidade extrema”, que os juízes tinham considerado demasiado vago.

“Lesão definitiva de gravidade extrema: lesão grave, definitiva e amplamente incapacitante que coloca a pessoa em situação de dependência de terceiro ou de apoio tecnológico para a realização das atividades elementares da vida diária, existindo certeza ou probabilidade muito elevada de que tais limitações venham a persistir no tempo sem possibilidade de cura ou de melhoria significativa”, lê-se na revisão à lei.

O texto também passou a definir sofrimento como sendo “físico, psicológico e espiritual, decorrente de doença grave ou incurável ou de lesão definitiva de gravidade extrema, com grande intensidade, persistente, continuado ou permanente e considerado intolerável pela própria pessoa“. Desta forma, a lei também não permitirá que quem sofre apenas psicologicamente possa pedir o suicídio medicamente assistido, como acontece noutros países que legalizaram a eutanásia, como a Bélgica ou a Holanda.

O médico orientador, que será responsável pelo processo, deve ser também indicado pelo doente e o médico especialista chamado a pronunciar-se não deve pertencer à mesma equipa que o médico orientador.

Federação Portuguesa Pela Vida e Médicos Católicos contra voto “na 25ª hora”

Em declarações à Renascença, o presidente da Associação de Médicos Católicos considera que a “urgência” de agendar a votação da lei da eutanásia revela “desespero em aprovar a medida na 25.ª hora”.

José Diogo Ferreira Martins admite estar “profundamente surpreendido e muito triste” e diz que “as prioridades dos deputados não têm a ver com os problemas reais do país”.

Ana Sofia Carvalho, especialista em bioética, encara com “estupefacção” o agendamento do voto. “Todos os dias somos surpreendidos com novidades que nos deixam apavorados. Como é que tudo pode ser motivo para aprovar uma coisa destas?”, critica, ouvida pela mesma rádio.

Esta marcação do voto é “particularmente significativa, quando sabemos o tsunami a nível de saúde que vamos viver nesta era pós-Covid”. “Sabemos que os doentes não Covid foram alvos de uma injustiça e que o número de cormobilidades associadas aos doentes que ficaram sem acompanhamento é gritante. O Governo, consciente disso, tinha no OE um aumento de 700 milhões para a Saúde, que não foi aprovado. Parece que, já que não nos podem dar tratamento, querem dar a hipótese de pedir para morrer“, critica.

A Federação Portuguesa Pela Vida também não aprova a votação “em cima do joelho” por um parlamento “a prazo” e que ignora o “clamor popular” contra esta lei.

José Seabra Duque, membro da direcção do grupo, considera a decisão “incompreensível” e “condena veementemente a maneira despótica como este assunto foi tratado”.

A federação “tem estado sempre na linha da frente contra a eutanásia” e, sobre este tema, já levou uma petição ao parlamento, que diz ter sido ignorada, bem como um pedido de referendo com 95 mil assinaturas, revela à LUSA.

Adriana Peixoto, ZAP // LUSA

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5 Comments

  1. Abutres, o que é que o orçamento de estado tem a ver com a lei da eutanásia? Muito gostam estes conservadores de baralhar tudo para impor a sua moralidade de surra. Deixem as demagogias, eutanásia já, e já vai tarde! Gostam do livre mercado mas não gostam do livre arbítrio?…

    • o suicídio é um crime contra a pópria vida… mas livre. Quem pretende morrer pode suicidar-se- Porquê o “empurrar” a responsabilidade, que é minha, para o Governo? Se está farto da vida, trate disso, mas de livre e espontânea vontade. Não incomode quem não deve querer encargos dessa natureza. Os portugueses ainda são livres para dicidir sobre isso. Assim pudéssemos nós decidir sobre a vida! Pudesse eu decidir pela vida, quando a mortr chegar!
      Porque têem tanto medo de um referendo, onde as pessoas podem secidir pela sua própria vomyade?
      Hipócritas!

    • Completamente se acordo. A aprovação da lei da eutanásia é só feita por motivos económicos. Tenham vergonham na cara e pensem , em consciência se essa aprovação apressada, não vos trará um sofrimento atro.

  2. Se se aprovar essa lei, na próxima semana, é porque os deputados desconhecem o que é prioritário atualmente. Lamentável.

  3. Se temos que votar para as legislativas, podemos aproveitar a boleia para mais um voto (da eutanásia)! não são os deputados que vão ter que votar nisso, são as pessoas deste país, que devem decidir, se querem morrer ou não! O tribunal constitucional já tinha votado! não tinha? ou porque caiu o governo já não são válidas as leis judiciais?! Os partidos de esquerda já mostraram que não valem nada, mas ainda não estão satisfeitos, ainda querem pôr mais lenha na fogueira, para mostrarem que não valem mesmo nada! Que falta de inteligência! em vez de tentarem sair do charco ainda se enfiam mais! Atenção gente: vamos votar do mesmo modo que votámos nas autárquicas! se todos ficaram contentes, então vamos repetir a dose!!

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