Pedro Sarmento Costa / EPA

“Todos, sem exceção, estamos todos sentados (onde eu me incluo) a ver no sofá o que está a acontecer ao país”.
Foi uma sexta-feira de pânico na aldeia de Cerejo, em Pinhel (Guarda). Os incêndios cercaram a aldeia e deixaram os habitantes locais em desespero.
Seis casas e pelo menos seis veículos arderam por causa das chamas, que mataram alguns animais, entre ovelhas e cabras.
Pedro Ivo, presidente da Junta de Freguesia de Terras de Massueime (Ervas-Tenras / Cerejo), contou que o “fogo estava longe, mas em dois minutos chegou à aldeia”.
“Não havia hipótese. Não há meios. Não sei que lhe diga. É o desespero total e… Só quem vive estas situações… É muito triste”, completou o presidente de Junta, em lágrimas.
Sérgio Costa, presidente da Câmara Municipal da Guarda, deixou palavras fortes: “Estamos todos fartos do que está a acontecer. Todos, sem exceção, estamos todos sentados (onde eu me incluo) a ver no sofá o que está a acontecer ao país”.
“Deixem-se de guerras. Isto é um aviso à navegação política nacional, que são todos responsáveis por este processo: deixem de brincar às eleições – presidente da República, candidatos a presidente da República, primeiro-ministro, representantes da Assembleia da República, partidos políticos – acabem com isso, sentem-se à mesa, para de uma vez por todas haver um pacto de regime. Para ver se conseguimos debelar isto, acabar com isto de uma vez por todas”.
O autarca lamentou ainda, na RTP, a falta de telefonemas do Governo. Só foi contactado por Marcelo Rebelo de Sousa.
Luís Montenegro cancelou o resto das férias. Fonte do gabinete do primeiro-ministro indicou à Lusa que o primeiro-ministro cancelou o período de férias que tinha previsto entre esta sexta-feira e a próxima sexta, 22 de agosto, tendo estado de férias nos últimos cinco dias “embora com agenda pública em quatro desses dias”.
Mais tarde, o mesmo Sérgio Costa disse na agência Lusa que a situação no local estava “incontrolável porque os meios são muito insuficientes. Vejo aqui mais viaturas das nossas Juntas de Freguesia equipadas com os ‘kits’ contra incêndios do que veículos dos bombeiros ou da Proteção Civil”, disse o presidente da Câmara Municipal da Guarda.
“São os populares e as Juntas de Freguesia a controlar. Por duas vezes, pedi apoio à Proteção Civil e eles dizem que não têm meios. Ou seja, o sistema de combate de incêndios no país faliu“, afirmou o mesmo autarca, na TSF.
“Abandono” em Arganil
O incêndio de Arganil estendeu-se aos concelhos de Oliveira do Hospital e Pampilhosa da Serra, todos no distrito de Coimbra, mas também a Seia (Guarda) e à Covilhã (Castelo Branco).
O presidente da Junta de Pomares (Arganil) acusou esta sexta-feira os bombeiros de uma vila do distrito de Setúbal de o terem “abandonado”, quando guiava os operacionais a uma aldeia que estava sem água com o incêndio à porta.
O caso aconteceu, segundo Amândio Dinis, na tarde desta sexta-feira, no lugar de Espinho, uma pequena aldeia com cinco habitantes, localizada no fundo de uma encosta perto de Sobral Gordo e Sobral Magro “que estavam sem água, sem nada e precisavam de ajuda”.
“Estavam os bombeiros parados ali na aldeia das Corgas, fui lá chamá-los, lá já não estavam a fazer nada, já estava tudo ardido”, contou o autarca, que, perante a resposta dos operacionais de que não conheciam o caminho, se disponibilizou a levá-los até ao local.
Ao subirem a serra, perante a existência de mimosas no acesso, a impedirem a passagem, o presidente da Junta de Freguesia exortou os bombeiros a removerem as árvores e a resposta espantou-o: os operacionais não tinham uma motosserra “por serem [bombeiros] urbanos ou não sei quê”, declarou.
Como solução de recurso, o autarca ligou a um conhecido, empreiteiro de profissão, que acabou por cortar as árvores.
A ‘comitiva’ seguiu viagem, mas, quando Amândio Dinis chegou à aldeia, percebeu que os operacionais que o seguiam teriam voltado para trás. “Receberam ordem do comando e voltaram para trás. Já viu isto? Já vinham aqui perto e agarraram, voltaram para trás”, acusou.
“Eles primeiro disseram que não traziam motosserra. Afinal traziam um ‘motosserazito’. Andaram a cortar, mas estavam de má vontade”, acrescentou.
“‘Você escusava de nos trazer para aqui’“, terão dito os operacionais, citados pelo presidente da Junta.
Amândio Dinis adiantou que o dispositivo de bombeiros em Corgas era composto por quatro carros, mas que à aldeia de Espinho, localizada a cerca de sete quilómetros, acompanhou-o “só um e o comando”, que voltaram para trás três quilómetros antes de chegarem ao destino.
“Se são bombeiros urbanos, se não é para combater [o incêndio], se isto aqui é a parte florestal, o que é que eles vêm para cá fazer?“, questionou Amândio Dinis.
“Isto é uma miséria, quem comanda isto tudo é atrás de uma secretária, com certeza”, lamentou o autarca.
O território da freguesia de Pomares, onde o incêndio que eclodiu no Piódão já tinha andado na quarta-feira, acabou por ser totalmente consumido pelas chamas na quinta-feira e esta sexta-feira. “Ardeu tudo, toda a parte florestal, salvaram-se as aldeias”, ilustrou.
ZAP // Lusa