EUA tentaram avisar Ucrânia sobre invasão russa quatro meses antes, mas Kiev desconfiou

Brendan Smialowski / AFP

Vladimir Putin e Joe Biden apertam as mãos na Cimeira EUA-Rússia de Villa La Grange, Genebra, 16 de Junho de 2021

Cerca de quatro meses antes da invasão russa à Ucrânia, os Estados Unidos já sabiam das intenções de Moscovo e tentaram avisar Kiev — sem grande sucesso.

No dia 24 de fevereiro de 2022, a Rússia lançou uma invasão militar em larga escala contra a Ucrânia. Cerca de quatro meses antes, o Presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, soube das intenções do seu homólogo russo, Vladimir Putin.

Em outubro do ano passado, os serviços de informação dos EUA informaram Biden sobre os planos para a invasão da Ucrânia, avança o The Washington Post.

Os norte-americanos já estavam atentos às movimentações da Rússia, que reforçava a presença militar junto à fronteira ucraniana. Ainda assim, Joe Biden não queria acreditar quando os seus serviços de informação lhe comunicaram as intenções russas.

A administração Biden esteve várias vezes reunida, em segredo, para discutir a possível invasão da Rússia à Ucrânia. Dentro da Sala Oval da Casa Branca, as opiniões dividiam-se. Havia quem levasse a sério a possível invasão russa, enquanto outros viam-na com ceticismo.

A reportagem do The Washington Post, citada pelo Observador, mostra que os Estados Unidos decidiram que não deveriam intervir diretamente na guerra e deviam coordenar a resposta com os aliados da NATO.

As informações recolhidas pelos serviços secretos americanos sugeriam que o Kremlin atacaria Kiev desde Chernihiv e Chernobyl no inverno. As tropas russas planeariam chegar à capital ucraniana três a quatro dias depois do início da invasão. O plano era tirar o Presidente ucraniano, Volodymyr Zelenskyy, do poder.

Posteriormente, a ideia era conquistar o resto do país. Uma etapa do plano que poderia demorar semanas, reconheciam os russos.

A razão para a invasão? Segundo os serviços de informação americanos, em causa estava a construção do legado de Vladimir Putin. O líder russo entendia que já não tinha muito mais tempo para transformar a Rússia na superpotência que idealizava e, como tal, entendeu que conquistar a Ucrânia seria um importante passo rumo a isso.

Jake Sullivan, conselheiro de segurança nacional, lembra que Biden teve “duas reações”.

Primeiro tentou evitar que a invasão acontecesse. Para tal, ordenou aos diplomatas dos EUA “irem a Moscovo para se sentarem com russos e dizer-lhes que ‘haveria consequências'”. Depois, tentou avisar os aliados da NATO e orquestrar uma resposta conjunta ao início do conflito militar.

Houve duas reuniões com diplomatas russos e uma chamada telefónica entre Biden e Putin. Os apelos norte-americanos caíram em saco roto e a mensagem transmitida era que a decisão de Vladimir Putin de invadir a Ucrânia estava praticamente fechada.

Os EUA também tentaram avisar os ucranianos das pretensões russas, mas foram recebidos com ceticismo. O secretário de Estado norte-americano encontrou-se pessoalmente com Volodymyr Zelenskyy. “Foi uma conversa complicada”, recordou Antony Blinken.

Mais tarde, o ministro dos Negócios Estrangeiros ucraniano, Dmytro Kuleba, reuniu-se com vários diplomatas norte-americanos em Washington.

“Comecem a cavar trincheiras”, disse um deles. Kuleba e a sua equipa diplomática apenas sorriram. “Estou a falar a sério. Comecem a cavar trincheiras. Serão atacados”, reiterou o norte-americano.

Zelenskyy admite que, apesar de tudo, se a população tivesse sido informada anteriormente, os russos “teriam devorado” a Ucrânia.

“Durante o caos, as pessoas fogem do país”, salientou o Presidente ucraniano. “Por mais cínico que possa soar”, o melhor que aconteceu foi os ucranianos terem ficado no país.