A presidente afastada Dilma Rousseff fez o seu discurso de defesa no Senado esta segunda-feira citando a Constituição de 1988 e afirmando que “jamais atentaria contra o que acredito ou praticaria atos contrários aos interesses dos que me elegeram.”
“Sei que, em breve e mais uma vez na vida, serei julgada. E é por ter a minha consciência absolutamente tranquila em relação ao que fiz, no exercício da presidência da república, que venho pessoalmente à presença dos que me julgarão. Venho para olhar diretamente nos olhos de vossas excelências e dizer, com a serenidade dos que nada têm a esconder, que não cometi nenhum crime de responsabilidade. Não cometi os crimes dos quais sou acusada injusta e arbitrariamente”, afirmou a presidente.
“Como todos, tenho defeitos. Mas entre os meus defeitos não estão a deslealdade e a covardia. Não traio os compromissos que assumo”, afirmou Dilma, que também lembrou o fato de ter sido torturada durante a Ditadura Militar. “Não luto pelo meu mandato por vaidade ou apego ao poder, luto pela democracia e pelo bem estar do povo.”
Dilma Rousseff mencionou governos que sofreram forte oposição como o de Getúlio Vargas, Juscelino Kubitschek e João Goulart e classificou como golpe o processo de destituição contra si, afirmando ser um pretexto para derrubar um governo legítimo.
“O governo de uma mulher que ousou ganhar duas eleições presidenciais consecutivas. São pretextos para viabilizar um golpe na Constituição. Um golpe que, se consumado, resultará na eleição indireta de um governo usurpador”, afirmou.
A presidente afastada disse ainda estar a sentir “um gosto amargo” na boca diante das acusações que estão a ser feitas contra si no processo do impeachment e afirmou: “Não esperem de mim o obsequioso silêncio dos covardes.”
Dilma reforçou que “não cometeu nenhum crime de responsabilidade” e que a perda do apoio parlamentar não seria suficiente para justificar seu afastamento.
“As provas deixam claro que as acusações contra mim dirigidas não passam de pretextos, embasados por frágil retórica jurídica”, disse Dilma. “Quem afasta o presidente pelo ‘conjunto da obra’ é o povo, nas eleições”, defendeu.
A presidente afastada citou o resultado da eleição de 2014 como um rude golpe contra setores das elites conservadoras, que desde então estariam a tentar “tirá-la do poder”. “Tudo fizeram contra o meu governo”, afirmou.
“Contrariei muitos interesses. Por isso, paguei e pago um elevado preço pessoal pela postura que tive. Arquitetaram a minha destituição, independentemente da existência de quaisquer fatos que pudesse justificá-la perante a nossa Constituição”
A petista fez menção ao ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha, alegando que o processo de destituição contra ela foi aberto por “chantagem explícita”. “Articularam e viabilizaram a perda da maioria parlamentar. Estamos a um passo de uma grave ruptura institucional. Estamos a um passo da concretização de um verdadeiro golpe de Estado.”
Crimes
Durante a defesa, Dilma questionou os crimes sobre os quais estaria a ser acusada. “Quais foram os crimes hediondos que pratiquei?”, perguntou, afirmando em seguida que a edição dos decretos de créditos suplementares assinados por elas seguiram as regras constitucionais.
“Querem me condenar por decretos que atendiam as demandas da população?”, disse, reforçando que o Tribunal de Contas da União já havia aprovado contas de outros presidentes que editaram decretos iguais, sem ter identificado qualquer irregularidade.
Já na parte final de seu discurso, Dilma disse que ficou magoada com as “agressões verbais e com a violência do preconceito” que sofreu durante o processo de destituição, mas que conseguiu superar tudo isso com “o apoio e a disposição de luta de milhões de brasileiros na rua”. A presidente afastada mencionou principalmente a força que recebeu das mulheres.
“As mulheres brasileiras foram parceiras incansáveis de uma batalha em que a misoginia e o preconceito mostraram suas garras. Bravas mulheres brasileiras que tenho a honra e o dever de representar como primeira mulher Presidente da República. Diálogo, participação e voto direto são as melhores armas que temos para preservar a democracia. Confio que as senhoras e senhores senadores farão justiça.”
Ao finalizar a defesa, Dilma pediu aos senadores que considerassem o “precedente” que poderia ser aberto com “a condenação de um inocente”.
“Sofro de novo com o sentimento de injustiça e o receio de que, mais uma vez, a democracia seja condenada junto comigo. Faço um apelo final a todos os senadores: não aceitem um golpe que, em vez de solucionar, agravará a crise brasileira”, pediu Dilma.
A presidente afastada encerrou o seu discurso de cerca de 45 minutos ao som de aplausos e gritos no Senado. Logo em seguida, o pesidente do STF, Ricardo Lewandowski, suspendeu a sessão por alguns minutos, antes de retomá-la com as perguntas dos senadores.
A primeira inscrita foi a senadora Katia Abreu, do PMDB, que discursou em defesa da permanência de Dilma no poder.
Dia D
Dilma Rousseff chegou ao Senado pouco depois das 9h da manhã desta segunda-feira para apresentar a sua defesa no julgamento final do processo de destituição está em andamento desde maio. Hoje é um dia chave para a presidente afastada, que chegou acompanhada do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do cantor e compositor Chico Buarque.
Por volta de 9h45, Dilma foi conduzida para a mesa do Senado pelo presidente da Casa, Renan Calheiros – sem aplausos, nem vaias. Ela tem 30 minutos para falar, prorrogáveis por mais 30. Enquanto isso, do lado de fora do Congresso, algumas dezenas de manifestantes pró e contra a destituiçãoa destituição se dividem entre os lados do muro colocado ali para separar apoiadores e críticos de Dilma.
Depois do discurso, terão início os questionamentos dos senadores – 47 dos 81 já se inscreveram.
O ex-presidente Lula da Silva vai assistir à defesa de Dilma acompanhado de um grupo de 20 a 30 aliados, como ex-ministros dos governos petistas e assessores, mas lideranças e autoridades pró-impeachment também estão no Senado.
A expectativa é que o depoimento se estenda até parte da noite. A votação final que definirá o impeachment deverá acontecer na terça ou na quarta-feira desta semana.
ZAP / BBC
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