Grande parte dos partidos com assento parlamentar reagiram esta terça-feira ao longo do dia à auditoria externa ao BES e ao Novo Banco, que revelou perdas líquidas de 4.042 milhões de euros no banco.
O PS, que revelou que o documento “descreve um conjunto de insuficiências e deficiências graves” até 2014, aponta o dedo ao Governo de Pedro Passos Coelho, ao passo que o CDS exige explicações sobre perdas a Mário Centeno e João Leão.
Os socialistas consideraram que a auditoria ao Novo Banco identifica a origem da “doença” financeira no Banco Espírito Santo (BES) e acusou o Governo PSD/CDS e a anterior administração do Banco de Portugal de terem “falhado“.
Estas posições foram transmitidas à agência Lusa pelo vice-presidente da bancada socialista João Paulo Correia, em reação à auditoria que a Deloitte entregou ao Governo sobre os atos de gestão dos últimos 18 anos do BES/Novo Banco.
“Esta auditoria diz-nos que a doença do BES passou para o Novo Banco, ao contrário do que tinha sido anunciado e prometido pelo anterior Governo PSD/CDS e pela administração do Banco de Portugal no dia da resolução”, em 03 de agosto de 2014, apontou o vice-presidente do Grupo Parlamentar do PS.
João Paulo Correia referiu que o executivo de Passos Coelho e a equipa do BdP liderada por Carlos Costa “prometeram ao país que iriam constituir um banco bom, que os ativos tóxicos ficariam no BES e que este Novo Banco ficaria com a matéria positiva do BES”.
“Mas esta auditoria diz-nos que as perdas que o Novo Banco tem registado – e que têm motivado injeções de capital por parte do Fundo de Resolução ao longo dos últimos anos – são resultado exatamente destes ativos tóxicos que passaram do balanço do BES para o balanço do Novo Banco. Estamos a falar de créditos que tinham um valor muito acima daquilo que realmente valiam à época”, exemplificou o dirigente socialista.
De acordo com João Paulo Correia, o Governo PSD/CDS e o Banco de Portugal, “por taticismo político, optaram por não reconhecer a totalidade da necessidade de capital para constituir o Novo Banco”. “Em vez dos 4,9 mil milhões de euros de capitalização inicial, o Novo Banco precisava de perto de dez mil milhões de euros. Muitos dos ativos não foram reconhecidos à época. As perdas desses ativos têm sido reconhecidas agora”, lamentou ainda o dirigente da bancada socialista.
João Paulo Correia reforçou depois a tese de que as decisões que foram tomadas no período final do BES “têm responsáveis”. “Do nosso ponto de vista, os responsáveis são [a administração] à época do Banco de Portugal e o Governo PSD/CDS. O que prometeram ao país não foi aquilo que aconteceu, falharam e têm de ser responsabilizados“, disse.
CDS exige explicações a Centeno e João Leão
O CDS requereu esta terça-feira, com caráter de urgência, a audição do governador do Banco de Portugal, Mário Centeno, e do ministro das Finanças, João Leão, para darem explicações sobre as “perdas muito avultadas” do Novo Banco.
Num requerimento assinado pela ex-líder parlamentar Cecília Meireles, refere-se que a Assembleia da República recebeu esta terça-feira a auditoria à gestão do Novo Banco.
“De acordo com o mecanismo de capital contingente desenhado aquando da venda do Novo Banco, o Fundo de Resolução (com recurso a empréstimos do Estado e, consequentemente, dos contribuintes portugueses) responde pelas perdas relacionadas com alguns ativos em determinadas circunstâncias até ao montante de 3.900 milhões de euros”, aponta a deputada democrata-cristã.
Por sua vez, o presidente do PSD disse estranhar que se fale mais do BES do que do Novo Banco na auditoria externa esta terça-feira conhecida, considerando necessário saber se “está correto” o dinheiro injetado após a resolução daquela instituição.
“Mais informação sobre o BES não é mau, mas não é aquilo que é absolutamente premente. O que é premente é nós percebermos o que aconteceu com o Novo Banco, não em [20]14 ou em [20]15, que era BES, mas a partir do momento que o Novo Banco foi vendido à Lonestar, em 2017”, afirmou, em declarações aos jornalistas à margem da visita ao Centro Hospitalar de São João, no Porto.
O líder social-democrata insistiu na necessidade de uma investigação do Ministério Público à instituição, considerando que as auditorias “são como as sondagens, valem o que valem”. “A auditoria não conheço, estranho que se fale mais do BES do que do Novo Banco, o que está em cima da mesa para nós pagarmos é Novo Banco, o BES está pago e entregue à justiça”, sublinhou o líder do PSD.
Rio insistiu que, mais do que auditorias, o Novo Banco deve ser alvo de uma investigação.
PCP fala de escândalo
O deputado comunista Duarte Alves considerou que “o escândalo do BES continua com o Novo Banco”, reiterando a necessidade de controlo público daquela instituição financeira.
“Estas perdas hoje [esta terça-feira] divulgadas revelam, mais uma vez, que o PCP tinha e tem razão quando afirma que, uma vez que o Estado continua a pagar a conta da limpeza do Novo Banco, este deve ser revertido para a esfera pública e colocado ao serviço da economia e do país. Quanto mais cedo se avançar com o controlo público mais cedo se acaba com a gestão danosa que acaba sempre por ser paga por todos os portugueses”, disse, em declarações aos jornalistas no parlamento. .
O parlamentar do PCP sublinhou que “devem ser apuradas todas as responsabilidades judiciais relativamente aos atos de gestão danosa do Novo Banco”.
“Mais uma vez se confirma que o escândalo BES continua com o Novo Banco, desde logo com a fraudulenta resolução pelo Governo PSD/CDS, em que se mentiu aos portugueses, dizendo que era possível resolver o banco com o que restava dos fundos da ‘troika’ e separando um suposto banco bom de um banco mau. Depois, com a ruinosa privatização pelo Governo PS em que se entregou, praticamente a custo zero, o Novo Banco a um fundo abutre que continua a gerir os ativos conforme os seus interesses”, continuou.
Por sua vez, o PAN vai propor a renegociação dos contratos de venda do Novo Banco ao fundo norte-americano Lone Star e apoia uma comissão de inquérito parlamentar, face às conclusões da auditoria externa a esta instituição bancária.
Estas posições foram anunciadas pelo deputado e porta-voz do PAN, André Silva, num vídeo em que considera também que está demonstrado que “a transferência de 850 milhões de euros feita em maio foi uma decisão política desastrosa e lesiva do interesse público e, portanto, também aqui deverá haver um esforço do Governo para que seja feito um ‘mea culpa’ e que relativamente a esta decisão se apurem todas as responsabilidades que houver para apurar”.
“O PAN proporá, em sede do próximo Orçamento do Estado, a renegociação dos acordos de venda do Novo Banco e encargos futuros para o erário público e [quer] assegurar que durante a crise sanitária ou por causa dela não será injetado mais nenhum dinheiro público no Novo Banco”, declara André Silva.
O porta-voz do PAN defende que “a gravidade dos factos que constam dos resultados desta auditoria justifica uma comissão de inquérito parlamentar que procure aprofundar os respetivos contornos e apurar todas as responsabilidades por tais factos que tanto lesaram o erário público, nomeadamente as responsabilidades de natureza política”.
“Por isso, o PAN afirma-se desde já disponível para fazer parte do consenso necessário para viabilizar uma eventual comissão de inquérito”, acrescenta.
O que diz a auditoria
Esta terça-feira, em comunicado, o Ministério das Finanças anunciou que recebeu o relatório da auditoria externa e que esse documento “será remetido à Procuradoria-Geral da República considerando as competências constitucionais e legais do Ministério Público”.
Segundo o Governo, o relatório revela perdas líquidas de 4.042 milhões de euros no Novo Banco (entre 04 de agosto de 2014, um dia após a resolução do BES, e 31 de dezembro de 2018) e “descreve um conjunto de insuficiências e deficiências graves” no BES, até 2014, na concessão de crédito e investimento em ativos financeiros e imobiliários.
Na sequência da resolução do BES, em 3 de agosto de 2014, 75% do Novo Banco foi vendido em outubro de 2017 ao fundo de investimento norte-americano Lone Star, mantendo o Fundo de Resolução bancário 25%, numa solução acordada entre Banco de Portugal e Governo.
Por ocasião da venda, foi acordado um mecanismo de capital contingente, que prevê que até 2026 o Fundo de Resolução compensa o Novo Banco por perdas de capital num conjunto de ativos que ?herdou’ do BES até 3.890 milhões de euros.
Desde então e até hoje, o Fundo de Resolução já injetou 2.976 milhões de euros e ainda poderá colocar mais de 900 milhões de euros, valores que em cada ano têm impacto nas contas públicas uma vez que o Fundo de Resolução é uma entidade da esfera do Estado.
ZAP // Lusa
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