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“O fim da vergonha”. Como é que a direita radical cresce em Portugal e na Europa

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Mário Cruz / Lusa

O presidente do Chega, André Ventura

As ideias de extrema direita já viviam em “modo silencioso” na sociedade portuguesa e foram activadas por André Ventura, líder do Chega, um “político hábil”, nas palavras do cientista político Vicente Valentim da Universidade de Oxford.

“O fim da vergonha” é o título do livro do cientista político Vicente Valentim que é apresentado esta terça-feira, em Lisboa.

Na obra, o autor defende que o rápido crescimento da direita radical na Europa assenta num processo de mudança das normas sociais vigentes.

O cientista político da Universidade de Oxford (Reino Unido) sustenta que muitas pessoas já se reviam naquela ideologia, mas que não estavam dispostas a expressá-lo por receio da censura social.

Agora, estão a sentir-se cada vez mais à vontade em agir com base nessas ideias, quer eleitoralmente, quer na rua.

A “teoria da normalização” que o autor propõe baseia-se na ideia de que o crescimento eleitoral da direita radical (aqui se inclui a extrema-direita) resulta em grande parte da redução do estigma político sobre uma ideologia, e não numa mudança de preferências políticas.

Sem se debruçar sobre a origem da apetência pelas ideias de direita radical, o autor avança com uma explicação para o estigma social e político contra aquelas ideias.

Citando estudos, o autor mostra que nas democracias ocidentais do pós-guerra, essas ideias ficaram associadas aos “efeitos catastróficos” dos regimes autoritários de direita.

A aparente invisibilidade de um eleitorado de direita radical – que existia, mas não se mostrava – levou ainda a que, durante muitos anos, a classe política subestimasse o potencial de atracção destes partidos.

O sucesso do Chega de André Ventura

Assim, existindo na sociedade, apesar de “em modo silencioso”, estas ideias de direita radical “podem ser activadas por um político competente“.

E foi o que aconteceu em Portugal, que durante algum tempo parecia imune ao aparecimento desses fenómenos, defende o cientista político.

O sucesso do Chega deveu-se em grande medida “ao seu líder André Ventura, que percebeu que uma retórica xenófoba dirigida inicialmente contra a minoria cigana ecoava junto dos votantes e lhe permitia mobilizar secções do eleitorado que anteriormente se tinham abstido ou votado em partidos tradicionais”.

Depois de criar o partido, Ventura deu “sinais claros ao eleitorado de que reconhecia haver pressão social” contra a manifestação de ideias como as do Chega. E mostrou que não concordava com a existência dessas normas sociais, argumentando que o país estaria melhor sem elas.

A título de exemplo, Vicente Valentim repara que Ventura atacou, na campanha eleitoral de 2019, a ideia do “politicamente correcto” que, segundo ele, impedia as pessoas de dizerem o que pensavam honestamente.

Quebrar as normas sociais do “politicamente correcto”

O carácter “intencionalmente provocador” de algumas posições públicas do líder do Chega mostra também o “seu desejo de quebrar essas normas“, numa estratégia que visava activar ideias de direita radical que se encontravam latentes na sociedade.

“E, de facto, esta retórica viria a revelar-se novamente bem sucedida” em eleições legislativas, refere o cientista político.

De 1,3% nas eleições de 2019, o que lhe permitiu a entrada no Parlamento, o Chega cresceu para 7,2% nas eleições antecipadas de Janeiro de 2022 e para 18% nas eleições de 10 de Março deste ano, sublinha o autor.

“Habilidade dos líderes” faz toda a diferença

Para Vicente Valentim, o caso português “ilustra muitas das características do empreendedor político que se junta à direita radical, levando um país para a fase de activação” [dessas ideias] e colocando em marcha o processo de normalização.

André Ventura é descrito como um “político hábil (e mais hábil do que anteriores políticos de direita radical no país) que intuiu que as ideias de direita radical estavam, provavelmente, mais difundidas na sociedade portuguesa do que se pensava“.

Ao analisar o fenómeno na Alemanha, no Reino Unido e em Espanha, Vicente Valentim salienta que o caso português não é excepcional, considerando que existem elementos idênticos na estratégia usada, mas também na “habilidade” dos líderes.

Em Espanha, Santiago Abascal, líder do Vox, Frauke Petry, na AfD, e Nigel Farage no Reino Unido, que levaria o UKIP a tornar-se o primeiro partido desta ideologia no Parlamento britânico.

É preciso mudança real das ideias das pessoas

Vicente Valentim sugere ser “improvável que seja possível reverter o processo de normalização” da direita radical e propõe formas de melhorar a resiliência das democracias.

Nesse sentido, é preciso idealizar políticas para reduzir comportamentos intolerantes e, idealmente, promovendo uma mudança real das ideias políticas das pessoas, considera o autor, notando que esse é um processo “lento e difícil”.

Estudos anteriores no domínio das Ciências Sociais mostram que o desenvolvimento de ideias de direita radical resulta de sentimentos de ansiedade em relação a minorias étnicas, linguísticas ou nacionais, refere ainda o cientista político.

Assim, uma forma promissora de combater o avanço desta ideologia seria a utilização de programas que enfatizam as semelhanças entre a situação de uma determinada pessoa e a dessas minorias.

Esse tipo de estratégia é bastante eficaz como forma de combater o desenvolvimento de atitudes negativas em relação a esses grupos, propõe Vicente Valentim.

Editado em Portugal pela Gradiva, “O fim da vergonha – Como a direita radical se normalizou”, é uma adaptação da versão inglesa, mais técnica, intitulada “The normalization of the Radical Right: A norms theory os Polítical Supply and Demand”, editado pela Oxford University Press.

ZAP // Lusa

5 Comments

  1. Bla, bla, bla, sera que ninguem tem a coragem de reconhecer que a Extrema-Direita apareceu em forca apos a Esquerda, na falta de apoio Popular, e para se manterem a todo o custo no Poder, comecarem com os seus acordos a dar voz Governativa a Extrema-Esquerda!!!!!!, era o que mais falta, eu ficar impavido quando uma Idiologia nao Eleita me vem impor a Eutanasia, o casamento entre homossexuais, a adocao de criancas por casais homossexuais, o ataque constante a Igreja Catolica, a Politica de Imigracao, que so tem o proposito de destabilizar a UE, o seu discurso sobre a escravatura, que por parte dos Europeus ja esta enterrada a muito tempo, ao contrario do que se passa em varios outros Continentes, (estima-se que presentemente existem 40 Milhoes de escravos neste Planeta), mas claro esta, quanto a isso a Esquerda Europeia nada diz, preferindo desenterrar o que ja esta enterrado,…, resumindo, esta Idiologia tem de ser combatida, com, ou sem a Extrema-Direita.

  2. Oh Carvalho, diga lá onde é que a extrema esquerda teve voz governativa na Europa nos últimos… 20 anos, por exemplo.
    É que se se está a referir à geringonça (e ao BE e ao PCP, em particular), 1º eles não estiveram no governo (não sei se sabe distinguir governo – aquele que decide, de acordos parlamentares pontuais),, 2º essa tal extrema esquerda não impôs nada a ninguém, quanto muito propôs ao PS e 3º o único que decidia era o PS.
    E a geringonça durou 4 anos.
    Eu percebo a tentativa de branqueamento que você quer fazer ao patético do Ventura… mas alto e para o baile.
    E já agora, a subida da extrema direita na Europa, teve a ver com a “voz governativa da extrema esquerda” em que outros países?
    Eu respondo-lhe: em lado nenhum. Zero vezes. Nunca jamais a extrema esquerda fez parte de um governo europeu neste século, como você bem sabe.
    Mas se quer fazer figuras como o seu querido aprendiz de Salazar, faça à vontade.
    O passado não volta. E jamais voltaremos a ser um pais governado por fachos, como você gostava.
    E não se esqueça que a ideologia que você diz que tem de ser combatida (resumindo-me agora ao PS) foi aquela que os portugueses preferiram / elegeram mais vezes e mais tempo nos 50 anos de Democracia.
    Se não gosta, tem bom remédio… Siga o conselho daquele amigalhaço do aVentureiro, que roubou os portugueses muito além do que a Troika exigia: emigre!

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  3. Teixeira, o Sr. tem um discurso muito bonito…, so se esquece que o BE quando fez acordos com o Costa, afirmou, “estamos a assinar acordos com o PS, nao so para este Governo, como tambem para apos esta Legislatura…”, resumindo, os acordos sao para cumprir pelo PS mesmo apos o fim da Legislatura. A Eutanasia, o fim dos vistos Gold, os subsidios para tudo o que e ONG controladas pela extrema-Esquerda, incluindo o Movimento LGBT, o isolamento da Igreja Catolica nos organismos Governamentais de combate a pobreza, etc., sabe que mais, por alguma razao esses acordos, apesar da oposicao o solicitar, nunca foram tornados Publicos…, o Costa manteve esses acordos secretos. Quanto a Europa, e para nao perder mais tempo, basta olhar para a Espanha…

  4. Portanto fiquei a saber que voz governativa nao quer dizer governação (uma bela cambalhota semântica) e que a Europa acaba nos Pirineus, porque mais exemplos… nao há! E mesmo esses, afinal, sao acordos. Nao sao governacao. Resumindo, a tal extrema esquerda nao governou mesmo em lado nenhum e o seu discurso nao passa de uma falácia. Parabéns!
    So faltou dizer que aprendeu a delirar com a seita da creche.

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