Irresponsabilidade ou “vichyssoise pura”? Centeno debaixo de fogo

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André Kosters/LUSA

O governador do Banco de Portugal, Mário Centeno

A isenção de Mário Centeno como Governador do Banco de Portugal está em causa depois de o antigo ministro das Finanças ter dado o dito por não dito, após um desmentido do Presidente da República.

A Comissão de Ética do Banco de Portugal (BdP) analisou o comportamento de Mário Centeno em plena crise do Governo, avaliando um possível “conflito de interesses” depois de o Governador ter dito que recebeu um convite para substituir António Costa como primeiro-ministro após demissão deste do cargo.

Centeno começou por dizer que recebeu o convite “do Presidente e do primeiro-ministro para reflectir e considerar a possibilidade de liderar o Governo”.

Mas depois de ter sido desmentido por Marcelo Rebelo de Sousa, o Governador do BdP veio esclarecer que não foi sondado pelo Chefe de Estado, mas apenas por António Costa.

A situação caricata está a pôr em causa a independência e a imparcialidade de Centeno à frente do BdP e o caso já chegou às altas instâncias europeias.

Eurodeputados do Partido Popular Europeu (PPE), a que pertencem o PSD e o CDS-PP, “estão a avaliar pedidos de esclarecimentos a diversas instâncias, a começar pelo Banco Central Europeu (BCE)”, apurou o Jornal de Negócios.

A mesma publicação realça que o BCE também já está a aguardar informações da Comissão de Ética do BdP. Mas, para já, não são conhecidas as conclusões da reunião desta segunda-feira.

Uma novela com vichyssoise?

Entretanto, questiona-se também como toda a “novela” do dito por não dito aconteceu. Para a escritora Inês Pedrosa, trata-se de uma “vichyssoise pura”.

Esta é uma referência a uma velha e famosa história de uma sopa vichyssoise que Marcelo terá comido num jantar com o então Presidente da República e os
seus conselheiros no Palácio de Belém. Só que esse jantar nunca aconteceu.

Foi uma “invenção” de Marcelo para passar alegadas informações falsas a Paulo Portas quando este era director do já extinto jornal Independente.

A história da vichyssoise foi contada pelo próprio Paulo Portas num programa de Herman José na RTP1 em 1992, como se pode ver no vídeo que se segue (a partir dos 55 segundos.

Quanto à “novela” com Centeno, Inês Pedrosa acredita que pode ter acontecido algo semelhante à história da vichyssoise, com as devidas diferenças.

“Costa perguntou a Marcelo se tinha o seu acordo para sondar Centeno” e o Presidente da República “disse-lhe que sim”. Então, “Costa sondou Centeno”, “Marcelo tirou-lhe o tapete e decidiu dissolver a Assembleia da República”, analisa a escritora numa publicação no X, o antigo Twitter.

“Marcelo a ser Marcelo” e “sem nenhum sentido de Estado”, acrescenta Inês Pedrosa, concluindo que “a perversidade pode sempre mais”.

A jornalista Constança Cunha e Sá também questiona “o papel do Presidente da República no convite a Mário Centeno“, mas também “a ida de Lucília Gago [Procuradora-Geral da República] a Belém, antes de Costa se demitir” e a reunião entre Marcelo e o primeiro-ministro “sobre o futuro de João Galamba no Governo”. “Curiosamente, todas envolvem o Presidente da República”, constata.

IL defende demissão de Centeno

O presidente da Iniciativa Liberal (IL), Rui Rocha, considera que Mário Centeno deve demitir-se do BdP. Depois das suas “declarações irresponsáveis”, “não tem condições para continuar” em funções, defende.

Aquilo que Mário Centeno fez é gravíssimo em dois aspectos”, entende Rui Rocha, notando que tentou “arrastar o senhor Presidente da República para uma versão dos factos que depois veio a público desmentir”, e que “o simples facto de admitir a possibilidade de integrar um Governo nesta situação põe em causa a sua independência nas funções de Governador do BdP”.

Do lado do PSD, Luís Montenegro é mais cauteloso no discurso, alegando que não quer “agravar mais esta situação”. “Eu sei bem o que faria no lugar dele e acho que não é difícil de prever aquilo que estou a dizer”, nota.

O presidente do PSD invoca “a ética republicana” e a importância de “respeitar a separação dos poderes“, bem como “a independência e isenção das entidades que têm a seu cargo a regulação, como é o caso do BdP”.

“É preciso em Portugal que se evitem situações de abusos de poder, mesmo até de abusos de comunicação”, acrescenta Montenegro, salientando que Centeno deve “fazer uma avaliação relativamente às garantias de imparcialidade e isenção que estão subjacentes” ao cargo que ocupa.

ZAP // Lusa

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2 Comments

  1. A usada, abusada e cansada expressão “ética republicana” é ter um chefe de estado que diz ser presidente de todos os portugueses, mas é simpatizante de um dos (dois) partidos políticos. Foi sempre ora do PS, ora do PSD. Atualmente, sendo PSD, faz o que pode para deitar o PS abaixo. Quando o presidente é PS, faz o mesmo com o PSD. O caso mais flagrante o do Jorge Sampaio com o governo do Santana Lopes.

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