Miichoacán é um estado do centro-oeste do México onde tropas do governo foram inicialmente estacionadas, em 2007, para combater os cartéis de drogas. Agora, o estado corre o risco de perder o controle, no meio do confronto entre os cartéis de drogas e milícias populares.
No domingo passado, milícias de autodefesa, com armamento de origem duvidosa, tomaram o controle da povoação de Nueva Italia, até então dominado pelos Cavaleiros Templários, um dos cartéis de drogas mais violentos do México.
O fenómeno expandiu-se nos últimos tempos. Originalmente, as milícias de autodefesa só agiam em dois municípios. Agora, estão noutros oito, todos dentro de uma região conhecida como Tierra Caliente, no sul de Michoacán.
A força estimada das “autodefesas” é de cerca de 1,5 mil homens – muitos com armas de alto calibre, como espingardas AK-47 e metralhadoras.
Suspeita-se que essas armas tenham sido fornecidas pelo Exército e pela polícia, algo que o governo nega.
O Exército, enviado ao local para restaurar a ordem e desarmar as milícias na cidade de Antunez, abriu fogo e matou duas pessoas.
Ao mesmo tempo, a cidade de Apatzingan registou uma série de incêndios, supostamente provocados pelos cartéis, pouco intimidados pela grande quantidade de soldados e policiais federais que patrulhavam o local.
Estado ‘falido’
“Este estado faliu”, diz à BBC o homem que se identifica como Comandante Cinco, líder de uma “autodefesa” na aldeia de Paracuaro.
Cinco explica que as milícias comunitárias surgiram porque as pessoas estavam cansadas de serem forçadas a pagar “taxas” aos cartéis, sem receber nenhuma protecção da polícia.
Diz também que muitos agentes da polícia estavam na folha de pagamento dos cartéis.
Actualmente, as ruas de Paracuaro estão nas mãos dos milicianos – jovens que, até recentemente, viviam da colheita de limões e abacates e agora têm de se acostumar a carregar armas automáticas.
Na praça central, a população reuniu-se para ouvir a “autodefesa” explicar os seus planos para o futuro, uma vez que o cartel tinha sido expulso da área.
Parte da população teme que se esteja apenas a substituir um controle armado por outro, mas também há quem agradeça às milícias por terem derrotado os narcotraficantes.
“As forças de autodefesa não são paramilitares”, grita o Comandante Cinco à multidão. “Vocês também são membros da autodefesa!”
Abandonar as armas
Por um lado, as milícias têm conquistado a maioria do apoio popular na região de Tierra Caliente; por outro, questiona-se se elas estarão preparadas para abandonar as armas em algum momento.
O Comandante Cinco diz esperar que isso ocorra em breve. “Ao ritmo actual, acho que em dois meses teremos expulso todos os Templários e poderemos ir para casa”, afirmou.
“Estamos aqui há apenas dez dias, e as pessoas já se sentem livres, os negócios estão a voltar ao normal. Em dois meses, o estado de Michoacán estará limpo.”
Mas muitos acham essa estimativa exageradamente optimista.
Em Apatzingán, a maioria das lojas mantém as portas fechadas até que a tensão diminua. A economia local, bem como a de todo o estado, está a sentir o impacto dos confrontos e do ambiente de tensão.
Segurança pública
A Igreja também entrou no debate. O bispo de Apatzingán, Miguel Patino, que já tinha descrito Michoacán como estado falido, agora publicou uma carta aberta criticando a resposta do governo à crise.
“O problema é que as autoridades não nos dão nenhuma garantia de segurança”, disse o bispo à BBC. “A quem vamos recorrer?”
Na última quarta-feira, o governo federal nomeou um novo chefe de segurança para o estado, Alfredo Castillo, cuja difícil missão é restaurar a estabilidade.
O governo do presidente Enrique Peña Nieto negou diversas vezes ter perdido o controle sobre Michoacán e nega a falência do controle estadual.
Em entrevista à BBC pouco após o auge da crise, o chefe da Polícia Federal, Francisco Galindo Ceballos, rejeitou a acusação do bispo quanto à situação do estado.
“O governo de Michoacán está em vigor, estável, em funcionamento. Os municípios também. Não partilho da opinião de que o estado está perdido”, diz.
Para a maioria dos cidadãos afectados pela crise, a questão da falência ou não do estado é meramente académica. Mas eles certamente vêem os fracassos na segurança pública.
Na sua carta aberta, o bispo Patino questiona: “Será que o governo federal não vê que estamos em estado de desespero?”
ZAP / BBC