Não é seguro consumir atum enlatado? Detectado mercúrio tóxico em 5 países europeus

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Associação ambiental francesa analisou 148 latas de atum de 15 supermercados europeus e descobriu que uma em cada dez tem valores de mercúrio, um perigoso neurotóxico, superiores aos limites autorizados no atum fresco.

Estamos diante de “um autêntico escândalo sanitário“, como refere a presidente da organização não-governamental BLOOM, Claire Nouvian, em declarações ao jornal francês Le Monde.

Esta associação de defesa dos oceanos analisou 148 latas de atum de supermercados de cinco países europeus – Alemanha, Espanha, França, Inglaterra e Itália – e fez uma descoberta alarmante. “100% das latas estão contaminadas com mercúrio”, constata num relatório.

“Mais de uma em cada duas latas testadas (57%) excede o limite máximo de mercúrio mais rigoroso definido para o peixe (0,3 mg/kg)”, aponta ainda a associação sem fins lucrativos.

“Das 148 caixas, uma caixa da marca Petit Navire [à venda em França] adquirida num Carrefour parisiense apresenta um teor recorde de 3,9 mg/kg, ou seja, 13 vezes superior ao das espécies sujeitas ao mais elevado padrão mais restritivo”, nota a BLOOM.

“Devido aos perigos representados pela ingestão regular de mercúrio, mesmo em doses baixas, todas as latas que excedam o padrão de 0,3 mg/kg devem ser proibidas de ser vendidas”, mas isso não está a acontecer, conclui a associação.

Atum tem 10 vezes mais mercúrio do que peixes pequenos

O mercúrio é uma das substâncias químicas mais preocupantes para a saúde pública, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS) que o coloca a par do amianto e do arsénico.

Trata-se de um perigoso neurotóxico que apresenta graves riscos para o organismo humano, e que pode ser encontrado em elevadas quantidades no oceano, até porque as suas emissões mundiais aumentaram significativamente nas últimas décadas.

O mercúrio acumula-se nos peixes na sua forma “mais tóxica”, o metilmercúrio, acabando no prato de milhares de famílias.

Como o atum é um peixe predador, acaba por acumular também o mercúrio das suas presas. “Por isso, apresenta um aumento de dez vezes na contaminação por mercúrio, em comparação com as espécies mais pequenas”, sublinha a BLOOM.

O atum é também o peixe mais vendido na Europa, nomeadamente em latas de conserva.

A ingestão regular de metilmercúrio, mesmo que em pequenas quantidades, representa “um grave perigo para a saúde”, nomeadamente para “o desenvolvimento do cérebro dos fetos e das crianças pequenas”, realça a mesma associação.

Lobby do atum e a “cumplicidade” das autoridades

A BLOOM realizou uma investigação de 18 meses que a levou a concluir que, desde os anos de 1970, “as autoridades públicas e o poderoso lobby do atum escolheram, conscientemente, favorecer os interesses económicos da pesca industrial do atum em detrimento da saúde de centenas de milhões de consumidores da Europa”.

Falando de um lobby “cínico”, a associação nota que o limiar de mercúrio que foi fixado como “aceitável” é “três vezes mais elevado para o atum do que para outras espécies de peixe, como o bacalhau”, sem que haja “a mínima justificação sanitária para um limiar diferenciado”.

Acresce que esta contaminação autorizada “não foi fixada arbitrariamente”, mas de forma deliberada para corresponder “aos níveis de contaminação mais altos que encontramos no atum”, sublinha ainda a ONG.

Portanto, “o limiar perigoso não foi estabelecido com o objectivo de proteger a saúde humana, mas apenas os interesses financeiros da indústria do atum“, conclui a BLOOM que acusa as autoridades públicas de “cumplicidade com o lobby do atum”, e de contribuírem para a “contaminação generalizada das populações com consequências potencialmente graves para a saúde”.

“Deixar acreditar que consumir atum é seguro é mentira imperdoável”

A BLOOM também analisou documentos oficiais da Comissão Europeia e constata que “não é utilizado nenhum método que tenha em conta as consequências para a saúde dos adultos e das crianças” na definição dos níveis máximos de mercúrio permitidos no atum.

“Pelo contrário, as autoridades públicas europeias escolhem uma abordagem que se opõe completamente ao dever de protecção da saúde pública: partem da contaminação real do atum com mercúrio para estabelecer um limiar que garanta a comercialização de 95% deles”, acusa ainda.

Deste modo, indústria e distribuidores podem vender produtos contaminados de forma totalmente legal.

“Deixar as pessoas acreditar que consumir atum é seguro do ponto de vista da saúde, é uma mentira imperdoável com consequências dramáticas“, acrescenta a associação, notando que o lobby do atum também está instalado em outras organizações internacionais, como a própria OMS.

Apelo a medidas urgentes da Comissão Europeia

A BLOOM denuncia ainda o quase inexistente controle na cadeia de produção e de comercialização do atum enlatado, sublinhando que há uma espécie de “confiança cega” na indústria e na distribuição em massa.

Considerando a gravidade da situação, a associação apela à tomada de medidas urgentes por parte da Comissão Europeia, nomeadamente quanto ao nível máximo de mercúrio permitido.

Sugere ainda a proibição da comercialização de produtos de atum que excedam 0,3 mg/kg de mercúrio e de “todos os produtos que contenham atum nas cantinas escolares, creches, lares de idosos, maternidades e hospitais“.

Por fim, apela aos dez maiores distribuidores do mercado europeu, incluindo Carrefour, Intermarché, Leclerc, Mercadona, Lidl e Aldi, para que assumam também “as suas responsabilidades” para “proteger imediatamente a saúde dos consumidores”.

Susana Valente, ZAP //

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4 Comments

  1. Eu já estava morto à muitas décadas, e devia ser tolinho! Os meus pais até uns anos depois de eu nascer tinham canalizações de chumbo, devo engolir alguns gramas de chumbo por ano, desde a adolescência tenho dentes “chumbados” (amálgama de mercúrio e chumbo naquele tempo) brincava com o mercúrio dos termómetros partidos, na escola usávamos muito mercúrio em experiências (ainda recordo a impressão de meter a mão dentro de uma tina com mercúrio à mais de meio século). Mas já agora sabem que a maioria da água à venda nos supermercados não pode ser colocada na rede de abastecimento por não cumprir limites de vários compostos?
    Temos limites tão baixos que um trabalhador agrícola não pode cavar um terreno sem ter máscara de proteção porque o pó excede dezenas de vezes o limite colocado pela OMS!

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