O matemático Óscar Felgueiras defende que a situação “não é preocupante no imediato”. No entanto, existe um conjunto de concelhos na região do Algarve e Alentejo com uma elevada taxa de incidência que não deviam ter avançado para uma segunda fase de desconfinamento.
Ao Público, o especialista sublinhou que, além da incidência, deve-se ter em conta outras variáveis, como a deteção de algum surto em zonas circunscritas que pode fazer disparar os valores, mas que pode ser controlado. “Nunca se deve fazer uma análise de risco apenas com um indicador”, disse Óscar Felgueiras.
Desta forma, mais do que preocupado por ver o R(t) a subir, o especialista da Faculdade de Ciência da Universidade do Porto defende que “é importante olhar-se ao nível local e perceber quais as zonas que, de facto, exigem intervenção”.
Na passada quinta-feira, o primeiro-ministro anunciou o início da segunda fase de desconfinamento e, nessa altura, já havia um conjunto de concelhos com valores que não cumpriam os critérios definidos. “Não deviam ter avançado para um segundo passo de desconfinamento”, admitiu o especialista. É o caso de alguns concelhos do Algarve e Alentejo.
O especialista chama a atenção para as zonas de Portimão, Odemira e Moura. “Estas são as regiões onde, além da intervenção, na nossa opinião deveríamos ver mais do que um travão. Devíamos não aliviar quaisquer medidas.”
No resto país, o matemático considera que é seguro desconfinar “porque a incidência está baixa”.
“Há algumas coisas que temos de controlar e isso começa ao nível local. Há alguns locais no país que merecem mais atenção do que outros. Temos, por exemplo, dezenas de concelhos sem casos há uma ou duas semanas onde a situação estará controlada e onde não há razão para não avançar para o alívio das restrições. Mas também existem outros onde não é bem assim e nesses focos de contágio que se tem de atuar prioritariamente”, completou.
Autarcas e hoteleiros do Algarve preocupados
José Carlos Rolo, presidente da Câmara de Albufeira, disse ao Público que os cafés e restaurantes não estão tão desejosos de recomeçar a atividade como seria de esperar, tudo porque os valores da transmissibilidade (Rt) e de taxa de incidência na região aconselham cautelas.
Os novos surtos que surgiram na semana passada concentram-se na zona do Barlavento (Portimão, Lagoa, Albufeira e Vila do Bispo) e estão localizados na área da construção civil.
A nível nacional, a incidência de novos casos de covid-19 por cada 100 mil habitantes é de 65,9, enquanto que no Algarve chega aos 112 novos casos. Em termos de Rt, o país está com 0,98 e o Algarve com 1,19.
Jorge Botelho, secretário de Estado da Descentralização e da Administração Local, desdramatizou a situação, afirmando que os casos estão identificados e que a Autoridade das Condições de Trabalho (ACT) intensificou as ações de fiscalização nas obras para que seja garantido o uso de máscara.
Elidérico Viegas, presidente da Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve (AHETA), considera prematuro traçar cenários para a próxima época de férias. “Os fluxos regulares de turistas só recomeçam, quando estiver resolvido o problema sanitário.”
Segundo dados da AHETA, a taxa global média/quarto, no passado mês de março foi 4,0% (86% abaixo do valor registado em 2020).
Variante do Reino Unido
A variante do SARS-CoV-2 associada ao Reino Unido prossegue numa “trajetória de frequência ascendente” em Portugal e é responsável pela “grande maioria dos casos“, tendo sido detetada em 82,9% das amostras recolhidas em março, anunciou o Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge (INSA).
O “Relatório de situação sobre diversidade genética do novo coronavírus SARS-CoV-2 em Portugal” aponta também “um aumento considerável” da variante ligada à África do Sul, apesar de a sua circulação ainda ser “pouco frequente na comunidade”.
Relativamente à variante originalmente identificada no Reino Unido, o INSA refere que foi “detetada por sequenciação com uma frequência relativa de 82,9% na amostragem nacional de março, continuando numa trajetória de frequência ascendente, sendo a variante responsável pela grande maioria dos casos de covid-19 atualmente”.
A variante do novo coronavírus associada à África do Sul foi detetada em 49 casos de covid-19 até à data, 27 dos quais foram detetados na amostragem nacional de março, “o que representa uma frequência relativa de 2,5% e evidencia um aumento considerável em relação à amostragem de fevereiro (0,1%)”.
“A análise filogeográfica indica que esta variante foi introduzida várias vezes de forma independente em Portugal. Não obstante, entre as 49 sequências, identificam-se alguns clusters bem definidos (por exemplo, cadeias de transmissão limitadas a agregados familiares ou instituições), sugerindo que a circulação é ainda pouco frequente na comunidade”, refere o INSA.
Também foram observados, até ao momento, 22 casos da variante P.1 (associada ao Brasil, Manaus), sendo que apenas quatro casos desta variante foram detetados na amostragem de março, mantendo a mesma frequência relativa (0,4%) observada em fevereiro, o que se sugere que a circulação desta variante “é muito limitada em Portugal”.
“A variante P.2, também detetada inicialmente no Brasil, revelou um decréscimo na sua frequência relativa na amostragem de março, tendo sido detetado apenas um caso entre as 1.094 sequências analisadas”, refere o relatório.
Segundo o INSA, “a amostragem nacional de março de 2021 por sequenciação cobriu 10,4% das amostras positivas reportadas durante o período em análise em Portugal, pelo que os dados apresentados refletem de forma robusta o peso das variantes em circulação no atual curso da epidemia no país”.
Liliana Malainho, ZAP // Lusa
Coronavírus / Covid-19
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