As contradições entre o ex-adjunto e chefe de gabinete — e as dúvidas que sobram para Galamba

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José Sena Goulão / Lusa

Frederico Pinheiro, ex-adjunto de João Galamba.

Cabe a João Galamba dissipar as dúvidas levantadas pelos depoimentos contraditórios de Frederico Pinheiro e Eugénia Correia no Parlamento. O Ministro das Infraestruturas será ouvido hoje pelos deputados.

As audições de Frederico Pinheiro e Eugénia Correia na comissão parlamentar de inquérito (CPI) à TAP trouxe as contradições já esperadas entre João Galamba, a sua chefe de gabinete e o seu ex-adjunto.

Desde as agressões à ocultação das notas, passando pelo uso do WhatsApp para trocas de mensagens entre funcionários do Estado, os relatos de Frederico Pinheiro e Eugénia Correia contrariam-se em quase tudo.

As dúvidas sobram agora para João Galamba, que será ouvido esta tarde a partir das 17 horas pela comissão parlamentar de inquérito.

Quem agrediu quem? Galamba ameaçou Pinheiro?

Um dos principais choques refere-se às supostas agressões que terão acontecido no Ministério quando Frederico Pinheiro levou o computador. Galamba, que não estava presente durante o conflito, acusa o ex-adjunto de ter sido violento e afirmou que as suas assessoras foram “barbaramente agredidas”.

Eugénia Correia, a chefe de gabinete de Galamba, corrobora este relato. “Agarrei a mochila de Frederico Pinheiro, nem toquei nele. Frederico Pinheiro agrediu-me a mim e a outra colega, tentou agarrar a mochila, nunca houve intenção de agarrá-lo. Dá-me um murro e a assessora recebeu vários murros“, afirmou.

Um comunicado assinado por cinco funcionários do gabinete que testemunharam o sucedido também acusa Pinheiro de ser violento e refere uma ida às urgências que prova a agressão.

Correia diz ainda que os membros do gabinete se trancaram na casa de banho para se protegerem do ex-adjunto A chefe de gabinete relata ter ouvido “um estardalhaço” e diz que o segurança e o motorista viram Pinheiro a atirar a sua bicicleta contra uma porta de vidro do Ministério.

Essa não foi a versão ouvida do próprio, com o ex-adjunto a contar que se dirigiu a Ministério calmamente de bicicleta para recolher os seus pertences após ter recebido um telefonema de Galamba onde o Ministro o terá insultado.

Pinheiro conta que Galamba lhe disse: “Não te despeço pessoalmente se não dava-te dois socos“. “Não havia possibilidade de interação racional com o ministro naquele momento”, garante.

“Não houve qualquer agressão da minha parte. Fui agarrado por quatro pessoas, não agredi ninguém, libertei-me em legítima defesa. Fui eu que chamei a polícia. Faço-o porque sou o agredido e não o agressor“, afirmou Pinheiro, que garante ainda que foi ao hospital no dia seguinte e que tem uma nota médica que prova que ficou ferido.

Pinheiro revela que não partiu nenhum vidro e lembra que a porta estava intacta quando Galamba deu a conferência de imprensa, três dias depois dos confrontos. “Não fujo do Ministério após ter roubado o computador, saio lentamente, acabando dessa forma o meu surreal sequestro dentro do edifício”, refere.

Eugénia Correia desmente as ameaças de Galamba por telefone. “Ouvi o senhor Ministro falar tranquilamente com o senhor Frederico Pinheiro. Não acompanhei a totalidade da conversa porque ia também ao telefone. Trabalho com o senhor Ministro há cinco anos e nunca testemunhei atos de violência contra ninguém”, afirma.

Ainda decorria a audição a Pinheiro quando o gabinete de Galamba emitiu uma nota a contrariar o seu testemunho sobre as agressões. O comunicado a forma “colérica” como Pinheiro saiu do Ministério e indica que as imagens de videovigilância comprovam-no.

O Chega já pediu as imagens. Eugénia Correia já disse que as câmaras do piso 4 do Ministério, onde terão acontecido as agressões, não estavam a funcionar. No entanto, haverá imagens do piso 0 a mostrar a saída de Pinheiro.

Galamba autorizou o recurso ao SIS?

O recurso aos Serviços de Informações de Segurança (SIS) para a recuperação do computador também continua a fazer correr muita tinta. O ex-adjunto descreve a situação como desnecessária porque as informações contidas no portátil não estavam em risco e acusa o Ministério de estar mais preocupado com as notas sobre a reunião com a ex-CEO da TAP do que propriamente com os documentos confidenciais.

A chefe de gabinete de Galamba já admitiu que chamou o SIS, dizendo ter sido orientada nesse sentido e que tem competências para o fazer, especialmente quando está em causa “um crime”.

Eugénia Correia referiu ainda que Galamba não autorizou a chamada do SIS e só soube o que se passou mais tarde — mas esta declaração contradiz o próprio Ministro das Infraestruturas, que disse na conferência de imprensa que tomou a decisão em conjunto com a sua chefe de gabinete e com o gabinete de António Costa.

Frederico Pinheiro afirma que o agente do SIS apareceu “a meio da noite” em sua casa e que o terá ameaçado para recuperar o computador, dizendo que “estava a ser pressionado de cima”.

Houve roubo ou não?

Afinal, o que se passou no Ministério pode ser descrito como um roubo? Depois de Costa e Galamba já terem dito a palavra, o seu uso tem sido evitado pelos intervenientes e até Lacerda Sales, que preside à CPI, aconselhou os deputados a evitar usar esses termos enquanto a investigação ainda está a decorrer.

Se ficar comprovado que houve um roubo, a intervenção do SIS também estará em causa, dado que os seus serviços não podem intervir em casos criminais, que cabem à Polícia Judiciária.

Frederico Pinheiro rejeitou sempre a ideia de que cometeu um roubo e afirma que tinha o direito de levar o computador porque ainda não tinha sido despedido oficialmente. O portátil teria também “documentos pessoais, fotos de família e de amigos. documentos do doutoramento e notas da reuniões em que tinha participado” e o ex-adjunto diz que se mostrou disponível para o devolver.

Já Eugénia Correia afirma que Pinheiro cometeu “um roubo violento” e diz que o seu testemunho é incoerente, já que lutou para levar o computador quando disse que sempre esteve disposto a devolvê-lo.

Quem pediu a reunião com a ex-CEO?

O ex-adjunto afirma que a reunião preparatória com Christine Ourmière-Widener foi pedida pelo próprio João Galamba.

Eugénia Correia refuta esta ideia e leu uma mensagem que Pinheiro lhe enviou a 13 Janeiro onde lhe diz que foi a então CEO da TAP a pedir a marcação da reunião e a acertar a data e a hora.

“A mensagem é clara. É a senhora CEO que quer ir falar. Se quer ir falar não vejo que constitua problema ou que o facto de querer ir lá falar implique que tivesse de receber indicações sobre perguntas. Isso não implica combinações e instruções”, afirma.

Frederico Pinheiro garante que as suas notas mostram que os deputados combinaram as perguntas e respostas com a ex-administradora. “As notas que eu tenho de 17 de Janeiro com o Grupo Parlamentar do PS mostram que o deputado Carlos Pereira disse as perguntas que iria fazer na audição e que a senhora CEO disse as respostas que daria”, garante.

Notas foram ocultadas? E a razão do despedimento?

O ex-adjunto acusou também o Ministério das Infraestruturas de omitir as notas da reunião que Galamba e vários deputados do PS tiveram com a ex-CEO da TAP antes da sua audição sobre a indemnização de Alexandra Reis.

Pinheiro afirma que Eugénia Correia o instruiu “na presença do Ministro” a omitir as notas ao Parlamento, dado que estas eram informais e não eram um documento oficial, durante uma reunião a 5 de Abril. O antigo adjunto considera que esta omissão teria como objectivo enganar a CPI e refere que foi a sua vontade de as divulgar que levou a que fosse despedido por Galamba.

Eugénia Correia, por sua vez, conta que só soube da existência das notas a 24 de Abril. A chefe de gabinete garante ainda que, na reunião a 5 de Abril, ouviu, juntamente com “quatro testemunhas”, Pinheiro a dizer que não existiam quaisquer notas e diz que Galamba não estava na reunião.

Correia descreve Pinheiro como alguém que “como sempre, não se lembrava de nada, não tinha nada” e frisa que nunca teve “a intenção de esconder notas, que até 24 de Abril nem eu própria nem o senhor Ministro sabia existirem”. A descoberta tardia da sua existência terá sido o que motivou pedido de adiamento do prazo para o envio de documentos à CPI, segundo Eugénia Correia.

A chefe de gabinete diz ainda que Pinheiro foi exonerado por ter “prestado informações falsas” e por haver uma “clara falta de confiança” e não por querer mostrar as notas à CPI.

Quem apagou as mensagens no WhatsApp?

O WhatsApp tem sido um dos grandes protagonistas da novela da TAP. Frederico Pinheiro acusa Eugénia Correia de lhe ter pedido o seu telemóvel de serviço para apagar “todo o registo de conversas” anteriores àquele dia.

O argumento dado teria sido a recuperação de conversas entre Pinheiro e Ourmières-Widener, já que as mensagens da ex-CEO eram apagadas após cinco dias, algo que Eugénia Correia confirma.

As versões contradizem-se sobre quem terá apagado as mensagens. “Não foi ninguém a não ser o Dr. Frederico a mexer no telefone de acordo com indicações do técnico, acabando por apagar tudo. O intuito não era perder mensagens. Era recuperar uma mensagem em que a CEO tivesse transmitido a vontade de estar numa reunião com o grupo parlamentar do PS”, sublinha.

Adriana Peixoto, ZAP //

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2 Comments

  1. O País tem assistido na Comissão de Inquérito da AR a cenas tristes entre o que diz o ex-adjunto, a chefe de gabinete e o Ministro Galamba.
    Já ninguém acredita em nada e em ninguém.
    O Ministro Galamba refugia-se no que disse a sua chefe de gabinete, remetendo para o que esta disse. Evita falar, muitas vezes, na primeira pessoa, para não dizer o seu contrário..
    Ninguém acredita no que diz o Ministro Galamba, pois mente ou omite parte do que sabe e do que se passou.
    Se o Governo se revê neste Ministro, Portugal está muito mal com os ministros que nos representam.

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