Hong Kong vive dias de tensão. Numa disputa sobre a forma como será escolhido o próximo líder da ilha chinesa, o movimento Occupy Central exige um protagonismo que incomoda as autoridades centrais em Pequim.
As eleições estão marcadas para 2017, mas a 31 de agosto o governo chinês emitiu uma resolução para pré-selecionar os candidatos a chefe do Executivo. Ativistas pró-democracia saíram então às ruas do território nas últimas semanas para se manifestar e planeiam ocupar o Central District, o centro financeiro da cidade, como protesto.
As manifestações desencadeadas pelos estudantes e entretanto apoiadas pelo movimento Occupy Central – que, na madrugada de domingo, anteciparam a sua campanha de desobediência civil – ganharam já uma dimensão para além de todas as expetativas.
A zona de Admiralty – onde se situa o complexo de Tamar, que além das secretarias do Governo também alberga o Conselho Legislativo (LegCo, parlamento) – continua a ser o palco principal das iniciativas para contrariar a decisão de Pequim.
Esta terça-feira, contudo, Hong Kong teve uma manhã atipicamente calma para a metrópole, com um ambiente radicalmente diferente do cenário violento de domingo, quando forças antimotim lançaram gás lacrimogéneo para dispersar os manifestantes que entraram na sede do governo.
O que quer o movimento Occupy Central?
O movimento, cujo nome completo pode ser traduzido por Ocupar Central com Paz e Amor, apela à desobediência civil, em defesa da democracia em Hong Kong.
Os ativistas pedem uma reforma política e eleições democráticas que cumpram normas internacionais. Eles planeiam para esta semana uma ocupação não-violenta no centro financeiro da cidade em resposta à decisão do governo chinês contra a realização de eleições abertas em 2017.
O grupo usa o mesmo nome do movimento “Occupy Wall Street”, lançado nos EUA em 2011 para protestar contra a desigualdade social.
Hong Kong está sob domínio chinês. Os protestos podem fazer alguma diferença?
Até os organizadores do movimento admitem que é pouco provável que consigam influenciar o governo central da China.
No entanto, os protestos podem ter um papel importante em Hong Kong: ali, onde a população tem liberdade de expressão, os cidadãos não podem eleger diretamente seus governantes.
Muitos veem o direito de protestar nas ruas como uma forma de forçar mudanças, e alguns protestos foram bem sucedidos, forçando a revogação de uma polémica lei de segurança nacional e de aulas de “educação patriótica” nas escolas.
No entanto, as exigências do Occupy Central, que se centram na representação democrática, são ma questão delicada, já que estão relacionadas com a forma como a ilha é governada e podem ser vistas como um desafio direto à autoridade exercida por Pequim.
Pode haver mais violência?
Os organizadores insistem que o protesto será não-violento, e Hong Kong tem tradição de manifestações pacíficas e bem-organizadas.
No entanto, a polarização da política na ilha refletiu-se em protestos mais combativos nos últimos anos, com confrontos entre manifestantes pró-democracia e os que apoiam o governo central chinês. Alguns críticos alegam que os organizadores do Occupy Central podem não ser capazes de controlar a multidão.
Na sexta-feira, um protesto de estudantes invadiu a sede do governo da cidade, mas o grupo foi expulso pela polícia no dia seguinte.
Como se dividem as opiniões em Hong Kong?
As manifestações atuais pró e contra a influência de Pequim têm reunido milhares de pessoas, mas as que são favoráveis ao governo são menos comuns – e, segundo a imprensa local, repletas de pessoas que foram pagas para estar lá.
No entanto, Hong Kong é uma cidade com visão empresarial, e muitos temem que confrontos com Pequim prejudiquem os negócios na ilha.
Em contrapartida, um número significativo de pessoas anseia por mais democracia e expressou o seu desgosto pela decisão chinesa de limitar os candidatos políticos.
Quem são as principais figuras dos protestos?
Os principais apoiadores do movimento são Benny Tai, professor de direito, Chan Kin-man, professor de sociologia, e Chu Yiu-ming, representante eclesiástico.
Estes três ativistas são considerados figuras moderadas do movimento pró-democracia.
O Occupy Central também é apoiado por partidos políticos e por associações de estudantes.
A decisão de Pequim de restringir as candidaturas políticas fez com que aumentasse o apoio popular ao Occupy, já que muitos viram as restrições como antidemocráticas e inaceitáveis.
No outro extremo do espectro, autoridades de Pequim e grupos empresariais tendem a ser contrários ao Occupy.
O que pensa a China?
Pequim preocupa-se com as crescentes tensões políticas e com o sentimento anti-China em Hong Kong, e o Partido Comunista chinês não quer que um movimento popular seja visto como uma ameaça à sua autoridade.
A imprensa estatal chinesa acusa “forças externas” de se intrometerem nos assuntos de Hong Kong e de fomentar “sentimentos separatistas” na ilha.
O presidente Xi Jinping, no poder desde 2013, parece ter adotado uma abordagem mais dura contra a dissidência, e especula-se se Pequim fará alguma ofensiva contra o Occupy Central caso considere insuficientes as ações das autoridades locais.
No entanto, acredita-se que o envolvimento direto do governo central seria um último recurso, tendo em conta as possíveis repercussões internacionais e impactos nos negócios.
Entretanto, esta terça-feira, o chefe do Executivo de Hong Kong, Leung Chun-ying, apelou ao movimento pró-democracia Occupy Central para acabar “imediatamente” com as manifestações que agitam há três dias o centro financeiro do território.
“Os fundadores do Occupy Central afirmaram repetidamente que se o movimento ficasse fora de controlo iriam apelar para que parasse. Eu estou agora a pedir-lhes para que cumpram a promessa que fizeram à sociedade e parem esta campanha imediatamente“, afirmou o líder do Governo, no seu primeiro comentário público desde que a polícia da antiga colónia britânica lançou, este fim de semana, gás lacrimogéneo contra os manifestantes.
ZAP / BBC