As alergias alimentares podem ser fatais e estão a disparar em todo o mundo, sobretudo nos países mais ricos. A mudança de hábitos alimentares e a falta de exposição a alergénios nos primeiros anos de vida podem explicar esse aumento.
Ingerir pequenas quantidades de um alimento a que se é alérgico pode desencadear urticária, edemas e dores de estômago, mas uma dose maior pode causar anafilaxia – uma reação grave, acompanhada de falta de ar e diminuição da pressão sanguínea.
De acordo com Cristopher Warren, autor de vários estudos sobre alergias alimentares, nos últimos anos “as admissões em urgências devido a anafilaxia induzida por alimentos aumentaram substancialmente nos EUA e na Europa”, noticia o Expresso.
Os grades responsáveis pela maioria desses internamentos são frutos secos (amendoim e nozes), peixe, leite, ovo, marisco, soja, trigo e sementes.
Mas, em Portugal, as alergias mais frequentes nos jovens são não só ao marisco e frutos secos, mas também aos frutos da família das rosáceas (pêssegos, maçãs, ameixas e cerejas), de acordo com a imunoalergologista Célia Costa.
Ultimamente, não só tem aumentado a prevalência das alergias, como se alargou o espectro de alimentos que as causam.
“Têm surgido novas alergias porque os hábitos alimentares têm mudado e, quanto maior for a exposição maior é a probabilidade de uma reação alérgica”, explica Alexandra Santos, professora de Alergia Pediátrica na King’s College London.
“Há um sério e preocupante aumento dos distúrbios alérgicos nos últimos anos”, alerta Graham Rook, professor de Ciências Biomédicas na University College London, em declarações ao Expresso.
Mas qual é a razão? E o que se pode fazer para evitar?
“Há um problema de falha de controlo do sistema imunológico. O processo de aprender a tolerar ocorre sobretudo nos primeiros anos de vida, quando as crianças desenvolvem populações de linfócitos T reguladores, uma espécie de polícia que desliga a resposta imunológica. Para os gerar a criança deve ser exposta a esse alergénio por via oral nos primeiros tempos de vida”, sublinha o investigador.
Depois de décadas a adiar a introdução de alimentos na infância, estudos revelam agora que dar amendoim a crianças até aos 11 meses reduz em 80% o risco de desenvolverem alergia ao fruto seco.
Introduzir amendoim, ovo e leite de vaca entre os quatro e os seis meses de idade é recomendado e “não se deve evitar nenhum alimento em particular durante a gravidez ou amamentação para prevenir a alergia”, adianta Alexandra Santos.
A vitamina D, assegurada pela exposição ao sol, é igualmente importante. Um estudo comprovou que bebés com baixo teor de vitamina D eram mais propensos a ter alergia ao ovo ou ao amendoim.
Além disso, ter cães também “parece diminuir o risco de uma criança desenvolver alergia”, o que está incluído numa lógica mais ampla de que é importante expor o sistema imunológico a uma variedade de micróbios no início da vida, para que possa desenvolver-se adequadamente.
O parto normal, que expõe o bebé aos microrganismos da flora vaginal, é fundamental para a prevenção primária. “A nossa espécie (e sistema imunológico) evoluiu em conjunto com uma ampla gama de micróbios que viviam em redor e dentro de nós, mas nas últimas décadas começámos a tratá-los como patógenos que precisam de ser eliminados”, explica Christopher Warren.
As alergias alimentares continuam, no entanto, a ser difíceis de diagnosticar, nomeadamente porque “há uma variedade de outras condições não alérgicas que podem resultar em sintomas semelhantes, como a intolerância alimentar, a intoxicação alimentar ou a doença celíaca”, adianta o investigador.
“A alergia alimentar é uma reação mediada pelo sistema imunológico, que reconhece uma substância que até pode ser banal como uma coisa estranha e desencadeia uma reação imunitária de rejeição”, explica Célia Costa.
“Na intolerância não há mecanismo imunológico, mas uma reação adversa que muitas vezes depende da quantidade. Ou seja, há um limiar de tolerância para cada pessoa”, diz, referindo que os sintomas são exclusivamente gastrointestinais, não havendo o risco de anafilaxia.
Mas, por enquanto, “a única forma de diagnosticar [as alergias] com segurança é conduzir um desafio alimentar oral, que envolve alimentar cuidadosamente o paciente com o alergénio suspeito”, explica Cristopher Warren.
“Obviamente, isso pode ser perigoso, demorado e caro, por isso tanto pacientes como médicos são relutantes em realizá-los. Em vez disso, são usados testes de sangue ou de picada na pele, ambos com taxas muito altas de falsos positivos“, diz o professor.