Zelenskyy demite o maior rival interno. Putin não vai invadir Polónia

Presidência da Ucrânia / EPA

Volodymyr Zelenskyy cumprimenta Valerii Zaluzhnyi

Governo ucraniano afastou o (popular) chefe das Forças Armadas. Putin deixou garantias sobre uma guerra em que é “impossível perder”.

Volodymyr Zelenskyy já tinha avisado que ia haver mudanças importantes. Agora foi confirmada uma alteração essencial, de topo, no setor militar

O ministro da Defesa ucraniano anunciou a substituição de Valerii Zaluzhnyi, o popular chefe das Forças Armadas ucranianas, após semanas de rumores sobre a alteração, e a Presidência designou como sucessor Oleksandr Syrsky, comandante do Exército.

“Hoje foi adotada a decisão de alterar o comando das Forças Armadas ucranianas”, indicou Rustem Umerov no Facebook, ao manifestar “reconhecimento” a Valerii Zaluzhnyi.

O Presidente ucraniano, Volodymyr Zelenskyy, anunciou entretanto a nomeação de Oleksandr Syrsky como novo chefe das Forças Armadas ucranianas.

“O tempo para (…) uma renovação é agora”, disse Zelensky no X.

Syrskyi, de 58 anos de idade, tem estado envolvido desde 2013 no esforço do exército ucraniano para adotar os padrões da NATO.

Após o anúncio, Zelenskyy pediu ao seu novo líder militar um plano de batalha “realista” contra a Rússia para 2024, após o fracasso da grande contraofensiva de Kiev em 2023.

“Espero tais mudanças nas forças armadas ucranianas no futuro mais próximo: um plano de ação realista e detalhado (…) para 2024″, afirmou.

Este plano, precisou, deve, levar em conta “a situação real no campo de batalha e as perspectivas futuras”, disse Zelenskyy no seu discurso diário.

A degradação da situação no terreno, com dificuldades no acesso a munições sobretudo dos Estados Unidos, e a complexa questão da mobilização militar também acentuou as divergências entre o chefe de Estado e o líder militar agora afastado.

Na quarta-feira, o parlamento de Kiev aprovou finalmente em primeira leitura o controverso projeto-lei sobre mobilização militar, mas o processo deve prolongar-se por várias semanas até à promulgação por Zelenskyy.

Poucos momentos antes do Ministério da Defesa anunciar a demissão, Zelenskyy também saudou o trabalho do general e propôs que permanecessem na sua “equipa”.

“Falámos das alterações que são necessárias nas Forças Armadas. Discutimos o que poderá ocorrer com um comando renovado das Forças Armadas da Ucrânia. Este é o momento da renovação. Propus ao general Zaluzhny permanecer na equipa”, disse.

Zaluzhnyi, em mensagem no Telegram, e sem anunciar que tinha renunciado, disse ter aceitado que “todos devem mudar e adaptar-se a novas realidades”, concordando que há uma “necessidade de mudar abordagens e estratégia” na guerra.

Zaluzhnyi é altamente respeitado entre as forças ucranianas e por oficiais militares estrangeiros. Alguns analistas citados pela AP alertaram que a sua saída poderia trazer perturbações, potencialmente levantando uma barreira entre o exército ucraniano e os políticos, e alimentando a incerteza entre os aliados ocidentais de Kiev.

Mykhailo Podolyak, um dos principais conselheiros de Zelenskyy, disse que a Ucrânia precisa de repensar as suas táticas, “que não garantiram resultados adequados no ano passado.”

A Ucrânia precisa de “prevenir a estagnação na linha de frente, o que afeta negativamente o sentimento público, para encontrar novas soluções funcionais e de alta tecnologia que permitam (à Ucrânia) manter e desenvolver a iniciativa”, adiantou Podolyak no X.

Zelenskyy designou Zaluzhnyi para a liderança das Forças Armadas ucranianas em julho de 2021, quando o país estava envolvido desde há sete anos em combates no leste contra as milícias separatistas russófonas locais, e quando prosseguia a concentração de tropas da Rússia junto à fronteira comum.

O general que conteve o plano inicial do Kremlin de garantir em poucos dias a capitulação de Kiev – na sequência da invasão em larga escala desencadeada em 24 de fevereiro de 2022 –, ainda é considerado um “ícone” para grande parte da população e em particular entre os soldados, que têm manifestado apreensão pela sua eventual substituição.

Aliás, Valerii Zaluzhnyi é visto como o maior rival interno de Volodymyr Zelenskyy, porque pode ser o próximo presidente da Ucrânia. Uma sondagem recente mostrou que 88% dos ucranianos confia no agora ex-chefe das Forças Armadas e apenas 62% confiam no presidente.

Zelenskyy já começou a ser criticado por este afastamento, pelos principais partidos da oposição. Oleksi Goncharenko, do partido Solidariedade Europeia, acha que esta decisão foi um “enorme erro” e que pode criar riscos para a Ucrânia: “Todos pagaremos por este erro”.

Garantias de Putin

O presidente russo, Vladimir Putin, também falou nesta quinta-feira e afastou a possibilidade de invadir a Polónia ou a Letónia, durante uma entrevista ao apresentador norte-americano Tucker Carlson, uma vez que a Federação Russa “não tem interesses” nesses Estados.

Não temos interesses na Polónia, na Letónia ou algures. Porque é que faríamos isso? Simplesmente não temos qualquer interesse [nisso]. (…) Está fora de questão”, respondeu Putin à questão “Imagina um cenário em que o senhor envia tropas russas para a Polónia?”.

Sobre a Ucrânia, Putin afastou totalmente a possibilidade de derrota russa no Estado vizinho que invadiu, considerando-a “impossível, por definição”.

Como disse: “Há vociferações para infligir uma derrota estratégica à Rússia no campo de batalha. Na minha opinião, é impossível, por definição. Isso nunca acontecerá”.

A propósito de esta guerra, assegurou que existe um número indeterminado de “mercenários dos EUA”, que disse constituírem o segundo grupo mais numeroso destes combatentes, depois dos polacos e à frente dos georgianos.

Putin disse também que o envio de soldados regulares dos EUA para combaterem na Ucrânia “colocaria a Humanidade à beira de um conflito global muito sério”, em resposta ao apelo do líder dos democratas no Senado norte-americano, Chuck Schumer, para reforçar a ajuda ao país invadido.

“Vocês têm problemas nas fronteiras com a imigração, problemas com a dívida de mais de 33 mil milhões de dólares… Não têm nada melhor para fazer? (…) Não seria melhor negociar com a Rússia para chegar a um acordo?”, prosseguiu.

Ainda sobre a Ucrânia, Putin disse que está pronto para negociar, mas que o presidente ucraniano, Volodymyr Zelenskyy, “assinou um decreto que proíbe a negociação com a Rússia [porque] obedece a instruções dos países ocidentais”.

Por outro lado, sobre os EUA, Putin afastou a ideia de que a relação bilateral dependa de uma mudança na Presidência norte-americana, contrapondo que tem mais a ver com “a ideia de dominação” que os EUA têm do mundo.

Como disse: “Não se trata de quem é o líder ou da personalidade de uma pessoa em concreto, mas das elites. É a ideia de dominação a todo o custo baseada nas forças dominantes da sociedade norte-americana”.

Reconheceu que teve uma boa relação com George Bush Jr, “e também [teve] essa relação pessoal com [Donald] Trump”.

Ao refletir a seguir sobre os EUA, apontou: “É um país complexo. Conservador, por um lado, mas em rápida mudança, por outro… Não é fácil compreendê-lo”.

Em particular, sobre o sistema eleitoral, questionou: “Quem toma as decisões nas eleições? Pode entender-se que cada Estado tenha as suas leis? Que se regule por sua conta?”

Putin pronunciou-se ainda sobre Elon Musk, que considerou uma pessoa e um empresário “imparável” e advogou um “acordo internacional” para regular a inteligência artificial (IA).

Sobre este assunto, Putin opinou que a investigação genética é uma ameaça para a Humanidade, até ao ponto em que “agora é possível criar um super-humano”, e depois comentou que Musk “já implantou um ‘chip’ no cérebro humano nos EUA”.

A propósito, comentou: “Creio que Elon Musk é imparável. Fará o que considere necessário. Não obstante, têm de encontrar uma base comum com ele. Encontrar formas de o persuadir. Creio que é uma pessoa inteligente. A sério. Mas precisam de chegar a um acordo com ele, porque esse processo precisa de ser formalizado e sujeito a certas regras”.

Putin disse ainda que se pode fazer “uma previsão aproximada do que se vai passar” com o desenvolvimento da genética e da IA, recordando o caso das armas nucleares, que progrediram até que os Estados entenderam que o seu uso negligente poderia levar à extinção e acordaram travá-las.

“É impossível parar a investigação na genética, tal como era impossível parar o uso da pólvora no passado, mas quanto antes nos dermos conta de que a ameaça vem do desenvolvimento incontrolado da IA, da genética ou de qualquer outro campo, será a altura de alcançar um acordo internacional sobre a regulação dessas coisas”, acrescentou.

ZAP // Lusa

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